Macron decide retirar todos os soldados franceses do Mali

A tensão entre Paris e Bamako continua a aumentar, bem como o apoio russo à Junta militar maliana. A ONU pede 605 milhões de euros para ajuda humanitária aos mais vulneráveis.

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Soldados franceses revistando pessoas próximo de Gao, no Mali Reuters/STRINGER

Emmanuel Macron vai anunciar esta semana que a França vai retirar a sua força militar do Mali e soldados franceses serão redistribuídos pela região do Sahel, depois da tensão com o regime militar maliano ter levado ao distanciamento da relação entre Paris e a sua antiga colónia. Segundo a AFP, o Governo francês considera que “não existem condições suficientes” para continuar com a missão no Mali. O ministro das Negócios Estrangeiros francês, Jean-Yves Le Drian, pediu às autoridades militares do Mali que “assumam o controlo da situação”.

Le Drian criticou o apoio e protecção à Junta militar maliana por parte do Governo russo, que tem permitido aos militares manter-se no poder e dificultado a procura de “uma reorganização militar, e não de uma saída total” das tropas franceses, nomeadamente na zona de Sahel. As relações entre Paris e o novo poder em Bamako degradaram-se, com a Junta a pedir apoio à Rússia e a consegui-lo através dos mercenários russos do grupo Wagner, próximas do Presidente Vladimir Putin, em mais um pé em África da Rússia.

O ministro sublinhou ainda que “não conhece nenhum país africano que esteja disposto a apoiar” os militares malianos e que os cinco coronéis que tomaram o poder há dois anos através de um golpe de Estado estão a fazer com que o país se isole internacionalmente.

Choguel Maiga, actual primeiro-ministro do Mali, respondeu dizendo que o que o país quer é “rever o desequilíbrio dos acordos” que fazem com que as autoridades malianas não possam “sequer sobrevoar o seu território sem a autorização francesa.”

Numa entrevista ao canal de televisão maliano ORTM, Maiga acrescentou que vai aproveitar o desejo de Moscovo de alargar a sua influência em África e anunciou que, face ao “recuo” francês, quer “explorar novas vias e meios para garantir a sua segurança de maneira autónoma, com outros parceiros”, diminuindo a dependência de França.

Ainda assim, mesmo que as forças europeias abandonem o Mali, “haverá sempre algum tipo de cooperação” entre a União Europeia e os Estados do Sahel, explica Ornella Moderan, do Instituto de Estudos de Segurança, citada pela Europa Press: “Os europeus não podem prescindir desta zona.” Só no passado fim-de-semana, as tropas francesas mataram 40 jihadistas no Burkina Faso, incluindo indivíduos que se acredita estarem por trás de três ataques à bomba no Norte do Benim, que mataram nove pessoas, incluindo um francês.

Os governos europeus temem que mudanças nas relações com os governantes da região possam abrir um espaço propício a movimentos ligados à Al-Qaeda e ao Daesh, que podem aproveitar a instabilidade política e de segurança na zona do Sahel. Mali, Burkina Faso, Níger, Chade, Sudão tiveram golpes, tentativas de golpe ou transições pouco transparentes num passado recente.

Resposta perante a deterioração humanitária no Mali

As Nações Unidas e os seus parceiros humanitários lançaram, na segunda-feira, o Plano de Resposta Humanitária para o Mali, que pretende angariar 686 milhões de dólares (cerca de 605 milhões de euros) para ajudar 5,3 milhões de pessoas em situação de vulnerabilidade, de um total de 7,5 milhões que precisam de ajuda humanitária.

Numa declaração conjunta, as autoridades malianas e a ONU indicaram que, perante a actual situação, a ajuda humanitária “é fundamental” e acrescentaram que “conflito e insegurança limitam o acesso de trabalhadores humanitários na ajuda às comunidades.” O número de deslocados internos “continua alto, com necessidades urgentes em educação, saneamento, água e higiene. Mais de 1,8 milhões de pessoas serão afectadas pela próxima época de escassez, entre Junho e Agosto, o valor mais alto desde 2014, em comparação com 1,3 milhões em 2021”, detalharam.

O porta-voz do secretário-geral da ONU, Stéphane Dujarric, destacou também que “o nível de necessidades é o mais elevado desde 2012” e recordou que “o ano passado foi caracterizado por uma deterioração da situação humanitária devido à crescente insegurança na região centro do país”. Também apontou que “as baixas civis aumentaram drasticamente no norte e centro do Mali no ano passado”, com cada vez mais civis a serem “alvo do aumento da violência intercomunitária e dos riscos que os grupos armados representam”, nomeadamente através de dispositivos explosivos improvisados.

“Juntos devemos apoiar a restauração dos meios de subsistência das populações deslocadas e refugiadas, apoiando um regresso seguro aos seus locais de origem para reduzir gradualmente a sua dependência de assistência humanitária”, argumentou o coordenador humanitário da ONU para o Mali, Alain Noudehou.

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