Polémica entre São Bento e Belém deixa substituição do CEMA sem data marcada

PSD pede demissão de “quem colocou na praça pública” o tema da substituição de Mendes Calado por Gouveia e Melo. Governo garantiu a Marcelo que não foi fonte do Ministério da Defesa e não ficou marcada data para a substituição.

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O Governo garantiu ao Presidente que a notícia não teve origem numa fonte oficial do Ministério da Defesa LUSA/JOSÉ SENA GOULÃO

Depois do Presidente da República ter posto uma pedra sobre a polémica da substituição do chefe de Estado Maior da Armada, o Governo tentou esta quinta-feira fazer o mesmo. Primeiro, através do secretário de Estado da Defesa, e depois do secretário de Estado da Presidência, ambos no mesmo tom. “O Presidente da República já produziu um comunicado e portanto o assunto está, desse ponto de vista, encerrado”, afirmou André Moz Caldas no briefing do Conselho de Ministros.

Na quarta-feira à noite, depois de receber o primeiro-ministro, a pedido deste, e o ministro da Defesa Nacional, a Presidência publicou uma nota dizendo apenas que “ficaram esclarecidos os equívocos suscitados a propósito da Chefia do Estado-Maior da Armada”. Fontes militares acrescentaram ao PÚBLICO que na reunião não foi colocada em causa a substituição de Mendes Calado por Gouveia e Melo, mas não ficou acordada a data em que tal deverá acontecer.

Mas se Belém e São Bento dão a polémica por encerrada, a oposição considera que há explicações a dar. Esta quinta-feira, o presidente do PSD pediu a demissão de “quem colocou na praça pública” o tema da demissão do actual chefe do Estado Maior da Armada (CEMA) e sua substituição pelo vice-almirante Gouveia e Melo.

O PÚBLICO sabe que a questão da fuga de informação para a Lusa foi abordada na reunião em Belém, onde o Governo garantiu ao Presidente que a notícia não teve origem numa fonte oficial do Ministério da Defesa. A Lusa referia apenas uma fonte da Defesa Nacional, mas em nenhum momento dizia referir-se a fonte oficial.

No final da reunião da bancada do PSD, Rui Rio considerou “inadmissível” que essa matéria tenha vindo a público e “injusto” para o ex-coordenador da task force da vacinação. “Quem colocou isto na praça pública, uma vez percebido quem foi, esse tem de se demitir”, defendeu, dizendo não ter essa informação. “Admito que o senhor Presidente da República neste momento já saiba quem colocou a notícia na praça pública, uma matéria que não pode ser discutida assim. Eu não sei quem colocou, quem colocou com intenções tácticas tem de se responsabilizar por isso”, reiterou.

Para Rui Rio, o assunto é grave e desprestigia os militares: “As Forças Armadas não mereciam que este assunto tivesse sido colocado na praça pública como foi, quem se antecipou e veio dar a notícia prestou um mau e um injusto serviço”, afirmou, dizendo que a demissão do CEMA também carece de uma explicação, depois de o PSD já ter pedido a audição parlamentar urgente do ministro da Defesa, um pedido apoiado pelo CDS, PCP e PAN.

No mesmo sentido, também o CDS criticou a “desarticulação” entre Belém e São Bento e pediu uma reflexão sobre recentes mudanças introduzidas em leis estruturantes da Defesa. “O CDS-PP tomou boa nota do comunicado emitido pela Presidência da República esclarecendo que o assunto ficou clarificado, mas esta desarticulação a que se assistiu nos últimos dias não é boa para as Forças Armadas e não é boa para Portugal”, advertiu Pedro Morais Soares.

O deputado centrista referiu que se entra agora na fase de discussão do Orçamento do Estado para 2022, “o que para a Defesa Nacional é importante”. “Para o CDS-PP é muito importante a operacionalização dos meios da Marinha. É uma situação que temos vindo a alertar sistematicamente sobre a falta de meios existentes”, disse.

Pedro Morais Soares adiantou ainda que o CDS-PP pretende saber se, em consequência das alterações introduzidas à Lei de Defesa Nacional e à Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas (LOBOFA), “todos estão em sintonia e se todos pretendem dar de facto seguimento a essas mesmas alterações”.

Também o PCP considerou importante que a Assembleia da República tenha um “cabal esclarecimento” sobre os “equívocos” decorrentes da intenção do Governo de propor a exoneração do actual CEMA. “Se houve equívocos neste processo, como foi publicitado pelo comunicado da Presidência da República, é importante que a Assembleia da República tenha um cabal esclarecimento sobre o que é que se passou e sobre o que se está a passar”, advogou o deputado António Filipe no Parlamento.

Para o deputado comunista, que integra a Comissão de Defesa Nacional, “foi criada uma situação preocupante de instabilidade ao nível das chefias militares que fragiliza a posição do actual chefe do Estado-Maior da Armada e é uma situação indesejável”. E por isso importa que “a Assembleia da República tenha acesso pelo menos à compreensão de que equívocos foram esses e como é que eles foram esclarecidos, se é que foram esclarecidos”.

Já o PAN considerou “infeliz” o envolvimento pelo Governo do vice-almirante Gouveia e Melo na sucessão da chefia do Estado-Maior da Armada e criticou a forma “pouco digna” como o actual detentor do cargo foi tratado. “Até porque esta demissão pode ter subjacente uma discordância política em torno da reestruturação das Forças Armadas”, sustentou a porta-voz do partido, Inês de Sousa Real.

A líder do PAN classificou como “infeliz que a atribulada sucessão do chefe do Estado-Maior da Armada ocorra por via do vice-almirante Gouveia e Melo, alguém que teve um papel inexcedível no plano de vacinação”. “Achamos que não era a dignidade que merecia alguém que teve um papel inexcedível no combate à pandemia. Mas também no caso do chefe de Estado Maior da Armada, pensamos que não é uma forma digna de tratar alguém que esteve ao serviço do país nestas funções”, frisou.

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