Adaptação de cetáceos a meio marinho assentou na perda de genes

A perda de genes nos cetáceos permitiu que a sua pele se tornasse mais lisa e se regenerasse muito rapidamente, o que é uma vantagem no meio aquático.

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Robert Baldwin/Sociedade Ambiental de Omã

A estratégia de adaptação dos cetáceos ao ambiente marinho baseou-se sobretudo na perda de genes, concluiu um trabalho de sistematização de vários estudos por cientistas do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (Ciimar) da Universidade do Porto. 

Em declarações à agência Lusa, Gonçalo Themudo, investigador do Ciimar, explicou que o estudo, publicado na revista internacional Frontiers in Marine Science, mostra que a estratégia de adaptação destes mamíferos ao ambiente marinho assentou na perda de genes”.

“Dado que os ambientes marinhos são mais pobres em nutrientes, há menos energia disponível para os mamíferos, o que obrigou os cetáceos a adaptarem-se e, para isso, tiveram de começar a perder alguns genes, isto é, tiveram de optimizar os seus genes para conseguir fazer mais com menos”, referiu o investigador.

A disponibilização de vários genomas de cetáceos tem permitido a vários grupos de investigação detectar estes “genes perdidos”, que estavam presentes nos antepassados terrestres destes mamíferos e que, ao longo da sua evolução, se foram perdendo.

“Estas transformações ocorreram ao longo de milhões de anos. Os cetáceos surgiram há cerca de 50 milhões de anos e foram-se diversificando. À medida que se diversificaram, algumas linhagens ficaram mais bem adaptadas, tendo maior sucesso, enquanto outras não têm variáveis tão fortes e acabaram por se extinguir”, esclareceu.

Esta perda de genes reflecte assim um “efeito de adaptação” que tem surgido ao longo de várias gerações e que surge como uma resposta destes mamíferos “a uma pressão” perante um novo meio. “Quando um animal passa para um ambiente novo, todas as adaptações que tinha deixam de fazer sentido. Há uma pressão para que se adapte novamente, sendo expectável que os cetáceos ganhem novos genes ou percam genes para optimizar recursos e funcionar melhor nestes ambientes”.

Tendo como foco de estudo a pele dos cetáceos, os investigadores do Ciimar concluíram que a perda de genes permitiu que esta se tornasse “mais lisa e que se regenerasse muito rapidamente”, algo considerado como uma “vantagem” no meio aquático.

As modificações da pele durante a evolução dos cetáceos devem-se, sobretudo, à perda de genes responsáveis pela deposição de queratina, produção de sebo e pêlos, do processo imunitário e outras funções da qual resulta uma pele completamente lisa.

À semelhança da pele, é expectável que este padrão de perda de genes se repita noutros órgãos destes animais marinhos.

Apesar dos diversos estudos desenvolvidos sobre o tema, não havia ainda uma sistematização de todos os resultados onde fosse possível comparar os padrões de genes, contabilizar genes perdidos ou as consequências dessa perda, tendo sido esse o objectivo do estudo do Ciimar.

O estudo, intitulado Losing Genes: The Evolutionary Remodeling of Cetacea Skin, facilitará a investigação e abrirá portas para que outros investigadores possam explorar novos caminhos.

À Lusa, Gonçalo Themudo afirmou que são várias as questões que permanecem em aberto e sobre as quais os investigadores gostariam de se debruçar no futuro. “Gostaríamos de tentar perceber melhor se estes genes que são perdidos são relativamente novos ou se são mais antigos”, referiu, acrescentando que outra das hipóteses levantadas é perceber se a perda de genes tem consequências na conservação das espécies marinhas.

“Sabemos agora que os mamíferos marinhos são muito sensíveis à poluição do mar e isso pode estar ligado à falta de diversidade de genes que eles têm. Estão adaptados a um ambiente marinho e a poluição altera esse ambiente, provocando uma nova pressão que pode ser perigosa para a conservação de espécies.”

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