António Avelar de Pinho escreve histórias que são canções

Formiga Duma Figa reúne 51 textos que são letras de canções. Nuno Markl “embaraça” o autor no início, Rita Redshoes canta-o no final. João Vaz de Carvalho ilustra-o do princípio ao fim.

Capa do livro Formiga de Uma Figa
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Capa do livro “Formiga de Uma Figa” João Vaz de Carvalho
Ilustração para o texto “Quando eu for grande”
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Ilustração para o texto “Quando eu for grande” João Vaz de Carvalho
Ilustração para o texto “Joana Maria Cabeça de Vento”
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Ilustração para o texto “Joana Maria Cabeça de Vento” João Vaz de Carvalho
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Ilustração para o texto “O dente do pente” João Vaz de Carvalho
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Ilustração da contracapa João Vaz de Carvalho

Será difícil encontrar alguém em Portugal que nunca tenha escutado, visto, lido ou cantado trabalhos e produções do autor de Formiga Duma Figa: António Avelar de Pinho. Na música, grupo Banda do Casaco, as Doce, Rui Veloso, os Heróis do Mar, o Avô Cantigas; no humor, textos para Herman José; na televisão, série Claxon. Só para citar alguns exemplos que Nuno Markl invoca no prefácio ao livro, a que deu o título “Algumas palavras para embaraçar o autor” e em que o considera “um tesouro nacional”. Nos livros para a infância, António Avelar de Pinho escreveu a colecção Os Super 4 (Editorial Presença), inicialmente em parceria com Pedro de Freitas Branco.

Numa apresentação de Formiga Duma Figa divulgada pela Porto Editora, o autor diz de si próprio: “Dedico-me à escrita em verso, digamos assim, letras para canções. Gosto de ver as crianças ‘a consumir’ essas canções, a divertirem-se, a aprenderem, a brincarem com os amigos e familiares. Isso é imparável. Não consegui pôr um ponto final nessa actividade.” Decidiu então criar um livro com algumas dessas “histórias”, que são canções (um total de 51). “Não pus todas, são centenas.”

Todos iguais para mim

Começa com a Marca da nossa infância: “Os filhos de fulano/ De sicrano ou de beltrano/ Não importa o nome que levam no fim./ São todos iguais para mim/ Altos ou baixinhos/ Gorduchos ou magrinhos/ Mais ou menos bonitos/ São como são, é mesmo assim/ Todos iguais para mim (…)”

Passa por Era uma vez: “Era uma vez alguém/ Só tinha uma casa/ quis mais uma casa/ mais duas ou três/ quis uma mão-cheia/ comprou mais e mais/ e por tuta-e-meia/ comprou uma aldeia/ nunca era de mais/ já queria uma vila/ e ao ter essa vila/ em boa verdade/ ficou com vontade/ de ter outra vila/ e até uma cidade/ comprou a cidade/ sentiu-se infeliz/ pois na realidade/ já queria um país/ comprou um país/ depois um segundo/ e muitos mais quis/ comprou todo o mundo/ é dono do mundo/ tem tudo, porém,/ não se sente bem/ pois bem lá no fundo/ foi uma vez alguém/ que teve tudo/ e não teve ninguém.” A ilustração de João Vaz de Carvalho, para este texto, que aqui se reproduz faz lembrar esse alguém…

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Ilustração para o texto "Era uma vez" João Vaz De Carvalho

Termina com Joana Maria Cabeça de Vento: “(…) Vejam lá o nome que ela tem/ Joana Maria Cabeça de Vento/ O Vento é da parte do Pai, Cabeça da parte da Mãe/ A quem será que ela sai quando voa a mais de cem?/ Talvez saia à Mãe, ou talvez ao Pai/ Pensando bem, vendo onde já vai/ Eu aposto que a Joana sai aos dois/ Aonde irá chegar? Isso já é saber de mais/ Deixá-la crescer e havemos de ver depois.” Para transformar esta “história” (aqui incompleta) numa canção original, o autor convidou Rita Redshoes. O resultado pode ser ouvido através de um QR Code na última página.

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Ilustração para o texto “Não há direito “” João Vaz de Carvalho

Títulos como Come a sopa, vá lá, Não há direito, Malfamagrifada, Quando eu for grande, Assembleia dos peixes, Saricoteco, A minha galinha e a da minha vizinha ou o Dente do pente, entre outros, denotam uma ímpar capacidade de brincar com o som e o significado das palavras. Um exercício de liberdade com vários níveis de leitura e que conquista leitores de diferentes gerações.

Diz Nuno Markl: “São letras de canções, poemas, histórias, um pé na inocência infantil e outro na matreirice irresistível que o caracteriza.” Tem razão.

A reforçar o humor e a crítica, surgem as ilustrações de João Vaz de Carvalho, que atraem os miúdos por uns motivos e os adultos por outros. Também na leitura das imagens há diferentes níveis - mas ninguém deixará de sorrir.

António Avelar de Pinho escreve, com graça, uma nota prévia acerca da sua relutância em usar o novo acordo ortográfico: “Idealizei este livro para quatro gerações. Escrevo e sempre escrevi segundo as normas do antigo Acordo Ortográfico. Com algumas reticências (bastantes, até) e muitos pontos de interrogação, acedi a que convertessem estas letras para o novo Acordo, porque compreendi que, se não o fizesse, os mais novos poderiam tropeçar nalgumas palavras e até cair. Não ficaria de bem comigo se alguém caísse por minha causa.”

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