Covid-19: Tratamento de Trump suscita dúvidas e críticas de médicos

A sugestão de que o Presidente dos EUA pode sair do hospital com covid-19 suscita muitas dúvidas, bem como a forma como está a ser tratado pelo seu médico, com medicamentos experimentais e para casos graves.

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Apoiantes de Trump junto ao hospital onde está internado, nos arredores de Washington D.C. Reuters/EDUARDO MUNOZ

O Presidente dos EUA, Donald Trump, revelou que irá sair esta segunda-feira do Hospital Militar Walter Reed, onde deu entrada na três dias antes. Diz sentir-se bem, “melhor do que nos últimos vinte anos”, mas a sua saída deixa muitas dúvidas.

“Sinto-me mesmo bem! Não tenham medo da covid. Não deixem que domine a vossa vida. Desenvolvemos, no âmbito da Administração Trump, óptimos medicamentos e conhecimento. Sinto-me melhor do que há vinte anos!”, escreveu Trump no Twitter, poucos minutos antes da conferência de imprensa da sua equipa médica. Trump diz que irá sair do hospital às 18h30 (23h30 em Portugal continental).

Trump começou o quarto dia de internamento no Hospital Militar Walter Reed a fazer furiosamente apelos ao voto no Twitter, e com letras grandes: “Space Force: vote!”, “Pro-life! Vote” e outras mensagens do género. Mas o grande suspense do dia era se, apesar de estar com covid-19, teria permissão para sair da unidade de saúde onde são tratados os veteranos das Forças Armadas norte-americanas para se continuar a tratar na Casa Branca, ou outra sua propriedade.

O chefe de gabinete de Trump, Mark Meadows, já tinha revelado que o Presidente dos EUA podia deixar o hospital esta segunda-feira – como sugeriu o médico da Casa Branca, Sean Conley. Ainda que essa ideia tenha sido recebida com espanto, ou incredulidade, porque ao mesmo tempo reconheceu que o estado de Donald Trump era pior do que antes tinha admitido.

Conley disse que o Presidente tinha tido febre alta na sexta-feira de manhã, e que teve de receber oxigénio, depois de os níveis medidos no sangue terem caído. Terão caído outra vez no sábado, mas o médico não esclareceu se foi preciso usar oxigénio de novo. Por outro lado, não forneceu pormenores sobre os exames de TAC aos pulmões de Trump – para perceber se tem ou não a forma de pneumonia característica da covid-19. Quando interrogado directamente, desconversou.

Dúvidas sobre tratamentos

 Ao mesmo tempo, o Presidente, de 74 anos, obeso e com alguns problemas cardiovasculares – tudo factores de risco para a covid-19 – está a ser tratado com dexametasona, um corticoesteróide cujo uso só é recomendado nos casos mais graves da doença, para conter a resposta inflamatória que acaba por ser perniciosa para o organismo. Em casos menos graves, podem impedir a luta do sistema imunitário contra o vírus.

Além disso, Donald Trump está a tomar o antiviral remdesivir por via intravenosa (um medicamento experimental que teve uma autorização de emergência porque abrevia o episódio de doença nos casos mais graves) e um cocktail de anticorpos monoclonais ainda em desenvolvimento.

Ou Trump esta mais doente do que está a ser revelado, ou está a ser tratado de uma forma demasiado agressiva, que vai muito para além do que é recomendável. Qualquer uma das hipóteses é preocupante. Há médicos que discutem abertamente a possibilidade de Sean Conley estar a ser pressionado pelo seu paciente para tomar decisões terapêuticas que não são as correctas.

Apesar disso, Donald Trump fez uma passeata de carro na noite de sábado, para saudar a multidão de apoiantes que se reúne junto ao hospital, a dançar, a cantar, a fazer soar as buzinas e músicas bem alto para desejar saúde e “mais oito anos” na presidência ao seu ídolo, como descreve o Washington Post. O exemplo que deu é de que não faz mal sair de casa quando se está doente com covid-19, disse no Twitter o médico do Hospital Walter Reed. “É a mensagem errada.”

Mas, apesar da óbvia ansiedade em mostrar que o Presidente dos EUA está a melhorar rapidamente, será preciso esperar pelo menos dez dias para que os sintomas comecem a passar se não houver complicações, sublinhou ao site Vox Jen Manne-Goehler, especialista em doenças infecciosas do Hospital Brigham e Feminino, e do Hospital Geral de Massachusetts. “Se o calendário da Casa Branca está correcto, e a infecção começou a ter sintomas sexta-feira, podemos apontar para 11 de Outubro. Até já, vai ser uma montanha-russa”, disse Manne-Goehler.

Entretanto, há mais próximos de Donald Trump que vão dando positivo para o novo coronavírus: esta segunda-feira, foi a adida de imprensa da Casa Branca, Kayleigh McEnany. O anúncio foi feito pela própria no Twitter. “Tenho dado negativo, de forma consistente, todos os dias, desde quinta-feira. Esta segunda-feira, tive um teste positivo, embora não tenha sintomas de infecção.”

A porta-voz da Casa Branca acrescentou ainda que nenhum dos jornalistas que cobrem regularmente a actividade do Presidente dos Estados Unidos pode ser considerado um contacto próximo de acordo com a avaliação da unidade de medicina da Casa Branca.

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