As quatro potenciais vacinas contra a covid-19 em fase final de testes
A OMS identificou, num documento de 9 de Setembro, 180 potenciais vacinas contra a covid-19. Há actualmente nove vacinas na última fase de testes clínicos (fase 3) e, destas, quatro “exclusivamente dedicadas” a esta fase. AstraZeneca, CanSino Biologics, Pfizer e Sinopharm são as farmacêuticas responsáveis pelos quatro projectos
A corrida global para uma vacina contra a pandemia do novo coronavírus conta actualmente com 180 potenciais vacinas contra a covid-19: 145 em avaliação pré-clínica (sem testes em humanos) e 35 em avaliação clínica (com testes em humanos, em diferentes etapas - fases 1, 2 e/ou 3), de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) publicados a 9 de Setembro.
Destas 180, existem nove vacinas na fase 3 de ensaios clínicos e quatro exclusivamente dedicadas a esta fase, tendo finalizado totalmente as fases 1 e 2, segundo o rastreio de vacinas do Guardian baseado no mesmo documento da OMS.
A fase 3 consiste na testagem alargada da potencial vacina e é crucial para aferir os seus efeitos secundários e necessária, para a OMS e generalidade dos especialistas, para que uma vacina seja considerada eficaz e apta para comercialização massificada e uso generalizado. O PÚBLICO apresenta-lhe alguns dados sobre os projectos de desenvolvimento de vacinas que, de momento, se encontram unicamente dedicados à fase 3 e que, por isso, estão mais adiantados:
Farmacêutica AstraZeneca e Universidade de Oxford
O projecto da vacina da farmacêutica anglo-sueca AstraZeneca, sediada em Cambridge, em parceria com a Universidade de Oxford, faz parte do acordo assumido pela Comissão Europeia. Portugal terá garantido 6,9 milhões de doses das 300 milhões de doses asseguradas pela Comissão Europeia.
Os ensaios clínicos começaram no dia 23 de Abril e, menos de um mês depois, a vacina demonstrou-se eficaz num pequeno grupo de macacos. A 20 de Julho, a revista científica The Lancet publicou os resultados preliminares das fases 1 e 2 de ensaios clínicos que apontam para uma vacina “segura”, com poucos efeitos secundários e capaz de induzir resposta imunitária.
Esta vacina é feita com vectores virais, ou seja, serve-se de um vírus modificado, neste caso, de um adenovírus de chimpanzés, que deposita nas células humanas parte do seu material genético que as leva a produzir uma proteína que imita a do SARS-CoV-2, para que seja gerada uma resposta imunitária.
A testagem em humanos foi suspensa na passada quarta-feira devido a uma reacção adversa grave num dos participantes no Reino Unido, que se encontra a recuperar. Esta foi uma situação considerada normal em ensaios clínicos de testagem massiva e, entretanto, os ensaios já retomaram.
CanSino Biologics, biofarmacêutica chinesa
A potencial vacina da empresa biofarmacêutica CanSino Biologics e do Instituto Científico Militar foi a primeira a ter uma patente aprovada pelo Gabinete de Propriedade Intelectual do Estado Chinês como vacina capaz de “ser produzida em massa num curto período de tempo” e “rápida e fácil de preparar”. Estas são conclusões provenientes da fase 2 de ensaios clínicos.
A vacina utiliza um vírus da constipação comum como vector (o adenovírus tipo 5) que transporta um pedaço do SARS-CoV-2 para desencadear uma resposta imunitária contra este novo coronavírus.
A vacina começou por ser testada internamente em milhares de militares do Exército de Libertação Popular, tendo sido, numa fase inicial, exclusivamente aprovada para uso interno nas forças armadas do país, no final de Junho. Após a aprovação da patente, em meados de Agosto, a fase 3 de testagem, ainda a decorrer, iniciou-se inclusive fora do país.
BioNTech e Pfizer
A vacina desenvolvida em conjunto pela empresa biotecnológica alemã BioNTech e a gigante norte-americana Pfizer obteve autorização por parte do regulador alemão das vacinas para testar em humanos no dia 22 de Abril.
Os resultados de um ensaio clínico preliminar com apenas 45 participantes vacinados foram publicados no medRXiv e demonstraram “níveis elevados de anticorpos” mas ainda há alguma incerteza sobre “se serão suficientes para induzir protecção”, segundo Ugur Sahin, presidente da BioNTech.
Na terça-feira, a Reuters avançou que num dos mais recentes estudos com mais de 12.000 participantes, após a administração da segunda dosagem, os efeitos secundários continuam a ser “leves a moderados”, tal como se havia concluído no estudo dos 45 participantes.
A fase II/III incluiu, no início de Agosto, um ensaio clínico de 30 mil participantes que, se tudo correr bem, resultará num “pedido de avaliação às autoridades regulamentares” do medicamento em Outubro, refere a Pfizer em comunicado. Se a comercialização for autorizada, esperam fornecer até 100 milhões de doses da vacina até ao final de 2020 e cerca de 1,3 mil milhões de doses até ao fim de 2021.
A vacina funciona com material genético sintetizado que desencadeia o organismo a produzir uma proteína igual à do SARS-CoV-2, a proteína da espícula, para que este saiba reconhecê-la quando for infectado com o coronavírus e, assim, desencadeie a resposta imunitária.
Instituto de Produtos Biológicos de Wuhan e Sinopharm
A vacina desenvolvida pelo Instituto de Produtos Biológicos de Wuhan e pela empresa estatal chinesa Sinopharm começou os testes da fase 3 no dia 16 de Julho com uma amostra de 15 mil voluntários, dos quais 10 mil serão vacinados com a potencial vacina e os restantes com um placebo. Na mesma publicação, a entidade indica que o estudo se irá prolongar até 17 de Julho de 2021.
A vacina da Sinopharm, também desenvolvida pelo Instituto de Produtos Biológicos de Pequim, que se encontra igualmente na fase 3 mas ainda a concretizar as fases 1 e 2, tem vindo a ser administrada a profissionais de saúde, trabalhadores envolvidos na prevenção da propagação do novo coronavírus e funcionários dos postos fronteiriços e aduaneiros desde o final de Julho.
A potencial vacina foi também testada nos Emirados Árabes Unidos em 31.000 voluntários e a o país recebeu, dia 14 de Setembro, autorização da Autoridade Nacional de Gestão de Emergências e Desastres para administrar a vacina em profissionais de saúde, de acordo com o jornal diário chinês Global Times. A decisão foi tomada após os resultados dos testes terem demonstrado efeitos secundários “leves e expectáveis”, segundo a autoridade.
Este projecto baseia-se no recurso a uma versão inactiva do agente que causa a doença (uma forma da tecnologia “vírus inteiros”) que é praticamente igual ao vírus que causa a doença e, por isso, cria uma imunidade, por norma, duradoura.
No entanto, o bioquímico David Marçal explica que um dos problemas comuns às vacinas contra o coronavírus da SARS, e em vacinas feitas através de "vírus inteiros” no geral, é a ocorrência de “imunopotenciação”, uma resposta desproporcional e potencialmente perigosa do sistema imunitário.