Covid-19: macacos podem ajudar a tratar doença respiratória nos humanos

Estudo publicado na revista Nature observou a manifestação da doença respiratória em macacos rhesus infectados com SARS-CoV-2 e confirmou que os animais apresentam os principais sintomas da covid-19 observados nos humanos.

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Macaco rhesus (Macaca mulatta) Charles J Sharp/wikipedia

Uma equipa de investigadores nos EUA analisou os processos patogénicos envolvidos na doença respiratória associada à covid-19 recorrendo a um modelo animal para acompanhar as diferentes fases da infecção, esperando ver se coincidia com o que acontece com os humanos. Para esta investigação, oito macacos rhesus adultos foram infectados com o vírus SARS-CoV-2. Em todos os animais envolvidos no estudo foram observadas infiltrações pulmonares, uma das principais características da manifestação da doença nos humanos. O padrão dos danos causados no sistema respiratório dos macacos é idêntico ao que acontece nas pessoas, permitindo assim que este modelo animal seja usado para estudar a eficácia de medidas de combate à doença nos humanos.

Um dos principais desafios da pandemia de covid-19 é o factor do desconhecido. O facto de se tratar de um novo coronavírus (por mais que se tenha falado nele nos últimos meses é ainda um patogénico novo) traz a exigência de uma série de testes, análises e confirmações do seu modo de actuar para depois se conseguir arranjar alguma forma de o travar. Por todo o mundo são realizadas análises em culturas de células e usados vários tipos de modelos animais para avaliar a manifestação desta doença com o objectivo de saber mais sobre ela.

Uma das maiores e melhores fontes de informação encontra-se nos dados clínicos, exames e relatos das pessoas infectadas. Mas é naturalmente impossível fazer experiências nas pessoas, infectando-as para acompanhar a par e passo a progressão da infecção. Para isso servem os modelos animais. No entanto, para ter a certeza de que estes animais são úteis para investigar a doença é preciso primeiro confirmar se a infecção acontece da mesma forma e se o vírus se comporta de uma forma semelhante no animal, de acordo com o que sabemos que acontece nas pessoas.

No estudo agora realizado com seis macacos rhesus, os investigadores do Laboratório de Virologia do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos EUA fizeram precisamente esse teste de similaridade com os humanos, avaliando sobretudo a doença respiratória. Os resultados mostram que “o modelo de macaco rhesus recapitula a covid-19, no que diz respeito à multiplicação e apresentação do vírus, presença de infiltrações pulmonares, lesões histológicas [nos tecidos dos animais] e seroconversão [intervalo de tempo durante o qual um anticorpo específico se desenvolve como resposta a um antigénio e se torna detectável]. O extenso conjunto de dados analisados permitiu que os investigadores concluíssem que é possível “estabelecer uma ponte entre o modelo de macacos rhesus e a doença observada em humanos e utilizar esse modelo animal para avaliar a eficácia de opções médicas”.

O artigo revela em detalhe o que foi observado na análise da carga viral detectada em amostras respiratórias, sintomas de pneumonia, comportamento e replicação do vírus no sistema respiratório e avaliação dos dados serológicos. Entre outros sintomas observados, o artigo relata que passado apenas um dia de os animais terem sido infectados com o vírus, todos os macacos manifestaram alterações no padrão respiratório. Outros dos sintomas manifestados foram a falta de apetite, a adopção de uma postura do corpo curvada e desidratação. “Ocasionalmente ouvia-se tosse na sala onde os animais estavam alojados, mas não foi possível identificá-los individualmente. Os sinais de doença persistiram por mais de uma semana, com todos os animais completamente recuperados após nove a 17 dias de terem sido infectados”, lê-se no artigo.

No que se refere especificamente aos padrões respiratórios alterados, os autores do trabalho notam que as radiografias mostraram infiltrações pulmonares em todos os animais um dia depois da infecção. A partir do terceiro dia, a infiltração inicial e leve progrediu para manifestações mais graves e extensas nos pulmões. Num dos animais, as infiltrações instalaram-se um dia após a infecção e permaneceram até ao 12.º dia.

A presença do vírus foi detectada em valores mais altos nas amostras recolhidas do nariz. Foi possível isolar o vírus com zaragatoas um dia e três dias após terem sido infectados, adiantam ainda os investigadores, mas não depois disso. As cargas virais eram altas nas amostras da garganta imediatamente após a inoculação, mas eram menos consistentes do que nas amostras do nariz posteriormente. Num dos animais, as zaragatoas foram positivas quando passaram um e dez dias após a infecção, mas não no período entre essas duas análises.

Embora os dados sobre doenças em humanos estejam a acumular-se num ritmo constante, há certos aspectos da patogénese do SARS-CoV-2 que só podem ser estudados em detalhe em modelos animais, onde é possível uma amostragem repetida e recolha de tecidos para análise. O artigo publicado na Nature mostra que o SARS-CoV-2 causa doença respiratória em macacos rhesus infectados e que a doença tem uma duração entre os oito e os 16 dias.

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