Ser democrata no Brasil é um atrevimento

Há uma guerra que o Presidente do Brasil está a travar contra a democracia.

A batalha que Jair Bolsonaro iniciou contra a imprensa brasileira assim que tomou posse faz parte da guerra que o Presidente do Brasil está a travar contra a democracia. A perseguição pública dos jornalistas mais incómodos para o Presidente brasileiro, utilizando o poder de disseminação das redes sociais para injuriar todas as vozes por domesticar, recorrendo a uma espécie de “milícias digitais”, é um ataque à liberdade de expressão e a todo o pensamento crítico que não se subordina à eficácia de um algoritmo.

A qualidade de uma democracia depende da qualidade do seu jornalismo. É por isso que os estratagemas de Bolsonaro para condicionar os jornalistas que não se submetem à sua cruzada evangélica e iliberal são, ao mesmo tempo, uma investida rude contra uma sociedade aberta, plural e democrática, tudo aquilo que o Brasil merecia ser.

A participação de apoiantes arregimentados em todo o país nas suas conferências de imprensa improvisadas, convocados para vaiarem as perguntas mais desagradáveis, como por cá acontece nas transmissões televisivas das noites eleitorais ou em alguns eventos desportivos, é um convite forçado à autocensura.

A manipulação bolsonarista é evidente a olho nu, mas é invisível para quem acredita no messias que não admite ser contraditado, que espalha a sua boa nova por canais sem filtro, mediador ou contraditório, num contexto que exige maior acuidade para discernir o verdadeiro do falso. A polarização política brasileira ajuda a perceber a fé dos bolsonaristas primários porque eles são, antes de mais, antipêtistas primários.

Na ausência de uma oposição forte e credível, com uma esquerda a precisar de se reconfigurar e de renascer após a erosão do PT, têm sido os jornalistas e os artistas, particularmente através do cinema, quem mais desmascara as múltiplas mentiras.

Mas há agora uma outra batalha contra a democracia que se avizinha no Brasil: o Congresso e os tribunais são a última barreira que o Presidente brasileiro quer transpor. Depois das universidades, estúdios de gravação ou redacções, a vigilância ideológica manifesta-se a 15 de Março contra o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, incentivada por parlamentares pró-Bolsonaro, militares de antanho e a extrema-direita mais boçal.

O que muitos acham ser o “salvador da pátria” é o melhor candidato a “coveiro da democracia brasileira”. Ser democrata nos tempos que correm é um atrevimento.

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