Inovação e estratégia para o Portugal 2030 – qual o caminho a seguir?

Num mundo em transformação acelerada, o novo Portugal 2030 poderá representar um contributo importante para a melhoria da nossa qualidade de vida, considerando a inovação como um pilar fundamental para a competitividade de todos os agentes envolvidos à escala global.

Nos últimos anos, Portugal tem seguido uma estratégia bastante consistente de promoção da inovação como fator de sucesso de afirmação das empresas, à escala global, com produtos e serviços diferenciados e de maior valor acrescentado. A interação entre os agentes envolvidos neste processo, incluindo empresas e associações empresariais, centros tecnológicos e de investigação, e universidades, parece estar hoje perfeitamente consolidada, originando continuamente resultados com visibilidade internacional relevante, que em muito têm contribuído para que a perceção externa acerca do nosso país, neste domínio, se tenha alterado substancialmente na última década.

Contrariamente ao que as notícias por vezes parecem evidenciar, esta dinâmica não se verifica apenas nos setores ditos “tecnológicos”, normalmente associados aos sistemas de informação e comunicação, mas de forma transversal, abrangendo, em muitos casos, setores mais tradicionais como o calçado, o têxtil ou a metalomecânica. O programa Portugal 2020, e anteriormente o QREN, nas suas vertentes de reforço da investigação, do desenvolvimento tecnológico e da inovação, em muito tem contribuído para que esta mudança, absolutamente necessária, esteja em fase acelerada de concretização, e que o sloganInnovate or die”, tantas vezes utilizado para a ilustrar, possa ser convertido em “Innovate and live”.

No entanto, apesar dos variados casos de sucesso, nem tudo são boas notícias neste domínio. Efetivamente, as estatísticas associadas ao impacto da inovação na nossa economia revelam, sobretudo, que temos ainda um longo caminho pela frente que importa atalhar, de forma sustentada e pragmática, para que rapidamente nos possamos colocar lado a lado com o pelotão da frente. Analisando os dados do Eurostat relativos ao investimento em investigação e desenvolvimento, em percentagem do PIB, em 2018, verifica-se que, apesar da trajetória positiva, ocupamos ainda um lugar modesto, com cerca de 1,35%, bastante abaixo da média dos países da UE28, com cerca de 2,11%. De igual forma, segundo a Pordata, as despesas em ID das empresas portuguesas, situadas em 0,67% do PIB, em 2017, estão bastante abaixo da média da UE28, com cerca de 1,38%.

Estes dados suportam a perceção que tenho construído, ao longo das últimas duas décadas, com a coordenação de vários projetos de inovação envolvendo empresas e centros do conhecimento. Assim, apesar dos resultados de muitos projetos, sob o ponto de vista tecnológico, serem excelentes, existe, posteriormente, uma grande dificuldade na sua colocação no mercado e na sua transformação em valor económico. Por outro lado, verifica-se igualmente que a não existência de programas de apoio financeiro à inovação levaria a que muitas empresas repensassem a sua estratégia neste domínio e, consequentemente, a sua forma de colaboração com as entidades do sistema científico e tecnológico.

Neste contexto, o próximo programa Portugal 2030, no que concerne à inovação, assume uma importância determinante, devendo responder, por um lado, às deficiências identificadas nos programas anteriores e às necessidades específicas da economia nacional, mas, sobretudo, dotar todos os agentes envolvidos neste processo das ferramentas necessárias para responder aos grandes desafios societais emergentes da próxima década (alterações climáticas, demografia, transportes verdes, eficiência energética, segurança, inclusão, etc.) e projetar Portugal, no contexto europeu, para patamares mais elevados de qualidade de vida e bem-estar.

Ao nível interno importa que os projetos de inovação possam transformar-se em produtos e serviços com afirmação real no mercado, preferencialmente global, representando verdadeiras fontes de retorno económico para os agentes envolvidos, de forma particular, e para o país, de forma geral. Neste sentido, será fundamental implementar metodologias que incorporem todas as vertentes do processo de inovação partindo da identificação de oportunidades, passando pela ciência e a tecnologia como forma de geração e aplicação do conhecimento, até ao negócio. Isso mesmo... o negócio! Será fundamental acrescentar esta nova vertente a todo este processo de desenvolvimento, assumindo-se, ele próprio, por um lado, como motor do projeto e como garantia do seu sucesso, e, por outro, como gerador de inovação pelo modelo a seguir (digital).

Por outro lado, não será possível inovar de forma sustentada sem conhecimento técnico-científico, devendo-se, neste âmbito, apostar fortemente na qualificação avançada das pessoas, procurando responder às expectativas dos mais jovens, considerando a forma inovadora como analisam a mudança acelerada a que constantemente estamos sujeitos. Neste particular, para além das componentes técnicas, a aposta forte nas soft-skills e num modelo assente na criatividade e no empreendedorismo, coletivo e individual, parecem ser aspectos fundamentais a considerar. A integração de todas estas vertentes, de uma forma verdadeiramente interdisciplinar, será fundamental para garantir rácios mais elevados de sucesso.

No plano externo, o Portugal 2030 deverá, obviamente, estar alinhado com o novo Horizonte Europa (2021-2027), que procura melhorar o impacto dos resultados obtidos e simplificar os processos de interação entre os agentes envolvidos, procurando afirmar a competitividade da Europa e preservar o seu modelo social único. Este programa apresenta um envelope financeiro de 100 mil milhões de euros, para investigação e inovação, procurando apostar em: (1) fortalecer a ciência e a tecnologia através de pessoas altamente qualificadas e em investigação de excelência, (2) melhorar a competitividade das empresas e da sua inovação, (3) implementar as prioridades da UE em termos das respostas aos desafios globais, como as alterações climáticas. O programa será implementado através de três pilares fundamentais: Ciência Aberta, Desafios Globais e Competitividade Industrial, e Inovação Aberta. Neste contexto, é essencial que os agentes de inovação portugueses possam assumir um papel relevante na implementação deste programa, integrando consórcios internacionais de elevado nível e procurando implementar as boas práticas já desenvolvidas, por países com resultados mais interessantes ao nível do impacto da inovação.

Num mundo em transformação acelerada, com desafios societais de grande exigência, principalmente impostos pelas alterações climáticas e pela digitalização, o novo Portugal 2030 poderá representar um contributo importante para melhoria da nossa qualidade de vida, considerando a inovação como um pilar fundamental para a competitividade de todos os agentes envolvidos à escala global.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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