O tabu da imigração – o grande ausente

Ao fim de tantos anos a estudar estas dinâmicas e movimentos apetece deixar um aviso: estão-se a criar as condições objectivas para um partido de direita radical crescer e para começar a ter sucesso.

De tudo se falou na campanha eleitoral. Menos do tema que mais tem causado danos aos partidos tradicionais: a imigração e a sua rejeição. O primeiro-ministro afirmou que esta “moda” não chegou a Portugal e promete – convicto de que a “moda” não vai chegar – mais imigração, e até livre-circulação com os países da CPLP. São palavras de quem se sente seguro e avança. Com toda a confiança.

Mas será esse optimismo prematuro?

Os partidos tradicionais, do sistema – ou do “arco da governação”, como se diz por cá –, passam sempre por três fases no que respeita ao tema imigratório. Primeiro, celebram-se as suas virtudes e negam-se os seus malefícios. Depois, já numa segunda fase, quando os partidos anti-imigração irrompem, os partidos tradicionais lançam uma ofensiva contra a ameaça “extremista” (fazendo coligações para os impedir de governar, imposição de “cordões sanitários”, novas e duras leis contra o discurso de ódio, etc.). Finalmente, quando esses novos partidos já são demasiado poderosos para poderem ser marginalizados, então são aceites (formam-se coligações com eles, copia-se o seu programa, endurece-se o discurso e as politicas contra a imigração).

Portugal, também aqui atrasado em relação à Europa, está na primeira fase, na fase do assobiar para o lado. Ou, se quisermos, do “brincar com o fogo”. Na realidade, todos os dados, quer da OCDE, como do SEF, mostram que a imigração para Portugal, e num curtíssimo espaço de tempo, explodiu e está já muito acima da média dos países desenvolvidos. E esta vaga imigratória, para além do Brasil, agora vem sobretudo do sul asiático (do Bangladesh, do Paquistão, e do Nepal), muito impulsionada por mudanças recentes na legislação que facilitam a imigração para Portugal (agora é preciso apenas a “promessa” de um contrato de trabalho, por exemplo), ao mesmo tempo que facilitam também a legalização e a naturalização. Mas esta vaga tem crescido de tal forma que estamos num período de descontrolo, já visível em algumas zonas do país. No Alentejo, por exemplo, com a chegada num curto espaço de tempo de milhares de asiáticos para a agricultura intensiva, e com os avisos do presidente da Câmara de Ourique (um socialista) sobre a pressão exercida sobre as infra-estruturas, habitação, centros de saúde, escolas e que prejudica a população residente. Ou no Minho, com o risco de colapso de centros de saúde com a chegada maciça de imigrantes brasileiros.

Deveria haver um debate sobre este tema, até para encontrar soluções. Mas o que há é o silêncio, e nenhum partido com assento parlamentar “toca” neste assunto. E, no entanto, o tema da imigração começa a ser saliente, a ser tema de conversa (mesmo que ainda não apareça como tal, como uma corrente forte, nos estudos de opinião). Inclusivamente, em alguns locais, já se começa a espalhar a sensação de que “qualquer dia somos estrangeiros no nosso próprio país”. E essa autoconsciência tem sido sempre a pedra de toque para a radicalização à direita do sistema partidário. E quando isso acontecer quem vai sofrer as consequências são, em primeiro lugar, os partidos de centro-direita.

Estudos sérios mostram que quando a paisagem humana muda – ainda mais se tal for repentino – a direita radical cresce. E a ascensão do populismo de direita pode muito bem ser vista como uma reacção a essa transformação étnica. E é essa reacção, por parte das maiorias brancas, que está a fazer implodir os sistemas partidários um pouco por toda a Europa. Porque, à medida que esta mudança étnica se aprofunda, a eventualidade dessas maiorias brancas se tornarem minoritárias na suas cidades e nas suas regiões torna-se uma possibilidade real para muitas dessas pessoas (cria sentimentos de ansiedade, de perda, de abandono, de medo), e elas reagem votando naqueles que prometem abrandar ou parar essa transformação cultural e demográfica.

Ao fim de tantos anos a estudar estas dinâmicas e movimentos apetece deixar um aviso: estão-se a criar as condições objectivas para um partido de direita radical crescer e para começar a ter sucesso. Se estas dinâmicas prosseguirem, se o número de imigrantes, de todas as proveniências, continuar a aumentar exponencialmente nos próximos anos, a procura por essa oferta política vai aumentar. Portugal devia aprender com os erros de outros países Europeus. Veja-se o caso do reagrupamento familiar que tem subido vertiginosamente. Também a França o fez, a partir de meados da década de 70. No Outono do ano passado, nas suas memórias, Valéry Giscard d’Estaing, então Presidente da República, chamou-lhe “o maior erro político da minha vida”. Nesta questão – como na concessão de autorizações de residência recomenda-se cautela, equilíbrio e bom senso.

Nos últimos anos, muito se tem falado na vinda do “diabo” a Portugal. Talvez o “diabo” (para os partidos habituais) não seja mais do que o fim dessa suposta e ilusória “imunidade” portuguesa ao radicalismo, ao racismo e por aí fora. Estamos a caminhar nesse sentido.

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