Relatório de Tancos aprovado à esquerda

Responsabilidades de Azeredo Lopes, ex-ministro da Defesa, e do primeiro-ministro, António Costa, dividiram os deputados. Plenário vota relatório a 3 de Julho.

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Azeredo Lopes e António Costa, após a demissão do ministro da Defesa Nuno Ferreira Santos

A esquerda aprovou na manhã desta quarta-feira o relatório final da comissão parlamentar de inquérito ao furto de material de Tancos, cuja votação em plenário da Assembleia da República está já agendada para o dia 3 de Julho. Nas declarações políticas, os deputados Diogo Leão, do PS, e os eleitos do Bloco de Esquerda e do PCP, respectivamente João Vasconcelos e Jorge Machado, sustentaram que o trabalho do relator, o deputado socialista Ricardo Bexiga, foi sólido, independente e rigoroso, respeitando a factualidade das audições e da documentação analisada.

“Não é o relatório do CDS-PP que, como se viu na exposição de motivos para a constituição desta comissão parlamentar de inquérito, mantém a mesma retórica política. Seis meses depois esta comissão de inquérito não serviu para nada”, explicou Diogo Leão. “Não é a verdade dos factos que sustenta essa retórica política, entrou no campo da ficção, todos os ouvidos negaram responsabilidades ou interferências políticas”, insistiu o deputado do PS. “Ao contrário do PSD não subscrevemos que apurar responsabilidades é assumir culpas”, concluiu.

“PSD e CDS queriam que este relatório desse cobertura à cabala política”, sustentou, por seu lado, João Vasconcelos do Bloco de Esquerda. O deputado deu relevo a uma das conclusões que não iliba Azeredo Lopes, ministro da Defesa Nacional quando do furto, em Junho de 2017, e achamento do material furtado, ocorrido em Outubro daquele ano. “O ex-ministro da Defesa nada fez para evitar a situação, apesar de a ex-procuradora-geral da República o ter alertado”, considerou, referindo-se aos entraves que a Polícia Judiciária Militar (PJM) colocara à actuação da PJ na investigação e na montagem de uma operação paralela à margem das indicações do Ministério Público.

“No capítulo mais controverso, o das responsabilidades políticas, o relatório não iliba o Governo das suas responsabilidades. O relator faz uma análise do problema e como o Governo geriu o processo”, avançou Jorge Machado, do PCP. O deputado elencou vários pontos das conclusões em que é reconhecida a pertinência do documento entregue ao chefe de gabinete do então ministro da Defesa, em 20 de Outubro de 2017, dois dias após o achamento, pelo coronel Luís Vieira, director-geral da PJM, e major Vasco Brazão, no qual se referia a negociação e condições de entrega do material com os autores do roubo de Tancos.

Este facto levou a comissão a concluir que “não obstante o ministro da Defesa Nacional ter conhecimento dos factos descritos não tomou qualquer medida para um cabal esclarecimento da situação” e que só após a Operação Húbris que, entre outros, levou às detenções de Vieira e Brazão, determinou uma auditoria à PJM. Ou seja, em Outubro de 2018, um ano depois de ter tido conhecimento da confissão descrita no denominado memorando. “As consequências políticas ocorreram com a demissão do ex-ministro da Defesa, o que esvaziou o conteúdo da comissão parlamentar de inquérito”, sustentou Jorge Machado.

“Governo foi cúmplice”

“Não se pode afirmar com total certeza que o primeiro-ministro apenas teve conhecimento da actuação da PJM no dia 12 de Outubro de 2018. Se é certo que isso não ficou provado, também não se pode afirmar com certeza que isso não aconteceu”, considerou Berta Cabral, do PSD, referindo-se à data em que o memorando chegou às mãos de António Costa, após diligência do seu assessor militar junto do então chefe de gabinete de Azeredo Lopes. Esta foi um dos 11 pontos que levou as bancada laranja a votar contra.

A deputada e ex-secretária de Estado da Defesa de José Pedro Aguiar-Branco acusou que “tudo foi feito, ao longo deste processo, culminando na aprovação deste relatório, para proteger a imagem do Governo, do ex-ministro da Defesa e do primeiro-ministro”. O relatado “traduz uma visão incompleta e parcial daquilo que se passou durante as audições da comissão de inquérito, assacando responsabilidades ao Exército pelas falhas de segurança e à PJM pelo modo como conduziu as investigações posteriores ao furto, procurando ilibar completamente os responsáveis políticos”.

Idêntica postura foi a do CDS-PP. “Foi branqueada a responsabilidade política, o Bloco de Esquerda chegou a insinuar o seu argumentário clássico de que a culpa era do Governo anterior”, atacou Telmo Correia, comentando as referências sobre a degradação das instalações de Tancos e o programa 2020 com a assinatura de Aguiar-Branco. “O busílis está na encenação do achamento. O memorando revela um processo ilegal, um acordo com os ladrões, e é neste momento que o Governo toma conhecimento”, relatou. “Quando lhe entregaram o memorando o Governo não secundarizou, escondeu, foi cúmplice da acção ilegal da PJM. O Governo soube da encenação e não agiu”, acusou o deputado do CDS.

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