Líderes europeus concordam adiar a data do “Brexit” até 31 de Outubro

Os 27 dão mais seis meses ao Reino Unido para ratificar o acordo de saída. Donald Tusk pede aos britânicos para não desperdiçar esse tempo.

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EPA/STEPHANIE LECOCQ (arquivo)

A meio caminho entre uma extensão curta e uma extensão longa, os 27 chefes de Estado e governo da União Europeia acertaram um prolongamento do prazo para as negociações do “Brexit” até ao próximo dia 31 de Outubro.

A proposta de compromisso, alcançada depois mais de quatro horas de discussão, inclui também uma “revisão intercalar”, ou seja, um ponto de situação no mês de Junho para aferir do avanço do processo político para a ratificação do acordo de saída no Parlamento de Londres.

“A extensão é tão flexível como eu previa mas um pouco mais curta do que eu esperava”, admitiu o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, no fim dos trabalhos, já de madrugada. Ainda assim, Donald Tusk considerou que um adiamento de seis meses é tempo suficiente para o Reino Unido “encontrar a melhor solução possível” para ultrapassar o impasse e aprovar a ratificação do acordo de saída da União Europeia. “Por favor, não desperdicem este tempo”, apelou.

A proposta dos 27, que demorou longas horas a ser negociada, foi aceite pela primeira-ministra britânica, Theresa May, que originalmente tinha pedido um prolongamento mais curto do prazo, até 30 de Junho. Apesar das dificuldades internas, a líder conservadora tinha um enorme incentivo para acolher a oferta dos parceiros europeus: sem acordo, a única alternativa que restava era a saída do Reino Unido, no quadro mais gravoso do “no-deal”, já nesta sexta-feira.

“Não tenho nenhuma ilusão de que as próximas semanas vão ser mais fáceis ou que ultrapassar o impasse no Parlamento vai ser simples. Mas o nosso dever como políticos é encontrar uma forma de cumprir a decisão democrática tomada no referendo, concretizar o ‘Brexit’ e seguir em frente. Não há nada tão vital”, afirmou Theresa May à saída.

O amargo de boca de Macron

A tarefa da líder conservadora, que já esta quinta-feira retoma as negociações com a oposição trabalhista, não se adivinha nada fácil. Mas, pelo menos em Bruxelas, May conseguiu ultrapassar um obstáculo que podia deitar tudo a perder: a desconfiança e renitência dos seus aliados europeus, que precisaram de horas de debate para aproximar as suas posições e encontrar um consenso — que ainda assim, suspeita-se, terá deixado um amargo de boca ao Presidente da França, Emmanuel Macron, firme defensor de uma maior pressão sobre os britânicos.

Enquanto os líderes ainda estavam a partir pedra, a delegação francesa fazia saber que nenhuma proposta para uma extensão mais longa do prazo do “Brexit” que não previsse condições rigorosas ou incluísse “garantias sérias” por parte do Reino Unido “teria o acordo da França”. Uma vez que a decisão teria de ser tomada por unanimidade, a postura francesa poderia inviabilizar uma solução, mas no final acabou por haver fumo branco.

A solução da UE parece responder às questões que foram levantadas por Macron e pelos líderes de vários países sobre os “inconvenientes” de uma extensão longa, nomeadamente o prolongamento da incerteza e indefinição política, e o possível impacto no normal funcionamento das instituições europeias.

À partida, os 27 tinham advertido que qualquer adiamento que se sobrepusesse à data das eleições para o Parlamento Europeu obrigaria o Reino Unido a participar na votação. Theresa May tinha inicialmente rejeitado essa possibilidade, mas na carta ao Conselho Europeu em que pediu a extensão do prazo informou que já tinha posto em marcha todos os procedimentos internos para a organização da eleição.

Segundo António Costa, Theresa May avançou “garantias muito claras” em relação aos receios de alguns parceiros. “Foi claramente expresso na sua intervenção, e também no ponto 7 das conclusões, que permanecendo o Reino Unido na UE, agirá como um parceiro leal, com uma cooperação sincera, tendo em vista a prossecução dos objectivos da União”, notou.

“Quanto ao mais, foi reafirmado que não há reabertura para a renegociação do acordo de saída e que não há negociação da relação futura antes da aprovação do acordo”, prosseguiu Costa. “Há, naturalmente, abertura dos 27 para se rever a declaração política sobre as bases da relação futura em função do que for o resultado das negociações em curso entre o Governo May e o Partido Trabalhista”, acrescentou.

Aliás, a “flexibilidade” prevista na proposta europeia serve precisamente para incentivar o sucesso dessas conversas, uma vez que estabelece um outro calendário para a saída se o acordo for aprovado na Câmara dos Comuns. “Se antes do limite do dia 31 de Outubro o Reino Unido ratificar o acordo de saída, ele entrará em vigor no primeiro dia do mês imediatamente seguinte à sua aprovação”, lembrou António Costa.

Juncker: “evitar a todo o custo uma saída desordenada"

Apesar das garantias, continua a existir um risco de que os britânicos não consigam passar essa meta antes do novo dia D. Muitos líderes admitiram essa possibilidade, mas recusaram especular sobre o que fazer nessa altura. A resposta que não quiseram pronunciar é óbvia: reunirão numa nova cimeira de emergência, para mais uma vez evitar o salto do Reino Unido no abismo. “Devemos desdramatizar algumas questões”, aconselhou o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, no final.

“O que é absolutamente essencial é evitar a todo o custo uma saída desordenada. O facto de termos reafirmado, UE e Reino Unido, que esse é um cenário que todos rejeitamos é um factor importante de confiança para os cidadãos e para o desenvolvimento da actividade económica”, considerou o primeiro-ministro.

Se o Reino Unido sair da UE até à nova data prevista de 31 de Outubro, já não terá uma palavra decisiva na escolha do chefe do próximo executivo comunitário. O mandato da próxima Comissão Europeia inicia-se — teoricamente — a 1 de Novembro. Mas a breve passagem pelo Parlamento Europeu dos eurodeputados britânicos que forem eleitos em Maio pode vir a influenciar os cálculos ao alterar o equilíbrio de forças entre os principais grupos políticos.

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