Jerónimo avisa que "é preciso mudar mesmo" de política — e não "fechar" para balanço e eleições

Líder do PCP voltou a insistir na ideia de haver uma requisição civil dos serviços privados de saúde. Jerónimo continua a endurecer o discurso dos últimos meses contra os socialistas e o eurodeputado João Ferreira salienta que "os partidos não são todos iguais".

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LUSA/HUGO DELGADO

Se há partidos que se entretêm a preparar as eleições europeias de Maio com algum afã, e até já estão com a cabeça nas legislativas de Outubro, o PCP ainda não quer fechar para balanço. Há muito para “lutar” e para decidir até ao último dia da legislatura, avisaram o secretário-geral, Jerónimo de Sousa, e o líder parlamentar, João Oliveira, na abertura das jornadas parlamentares que os comunistas fazem nesta segunda e terça-feiras no distrito de Braga. 

“Não é ainda tempo de balanço, mas sim de olhar para a realidade portuguesa”, vincou Jerónimo. “E se há quem pense em fechar para balanço, dando o trabalho por concluído e tratando apenas de preparar eleições, que se desengane”, aconselhou João Oliveira, que garantiu que o PCP “não desperdiçará nenhuma oportunidade (…) até ao último dia da legislatura” para continuar a insistir nas suas propostas.

Num discurso de quase meia hora, Jerónimo de Sousa falou de raspão sobre medidas de valorização de direitos e rendimentos que tiveram a mão do PCP, mas preferiu dedicar a maior parte do tempo a passar a pente fino problemas de sectores como a saúde, a agricultura, a pesca, os transportes públicos, os serviços e o emprego público, mas também da legislação laboral e das políticas europeias.

Admitiu a "insuficiência" das medidas tomadas nestes últimos três anos — embora algumas tenham sido "importantes e com impacto" nas respectivas actividades — e insistiu na ideia de que é preciso uma "política alternativa", patriótica e de esquerda. "Avançar é dar resposta e não empatar", haveria de clamar Jerónimo de Sousa sobre a agricultura e a necessidade de valorização a produção e o sector produtivo nacional, mas foi aplicando a mesma mensagem, por outras palavras a problemas que ia identificando. 

"Se não se foi mais longe, se ficaram medidas por tomar, não foi por falta de proposta ou iniciativa do PCP. Isso deve-se às opções do PS e do seu Governo minoritário e ao papel que PSD e CDS assumiram de suporte ao Governo PS quando este precisou deles para rejeitar propostas do PCP", argumentou.

Um dos problemas fundamentais, vincou o líder comunista, é a falta de investimento. E a situação na saúde "é particularmente preocupante". Sobretudo com a crise da desvinculação dos hospitais privados da ADSE. Por isso, Jerónimo de Sousa insiste na ideia, que começou a lançar no fim-de-semana, de o Governo recorrer "aos mecanismos legais da requisição de serviços" aos prestadores privados que querem deixar de trabalhar com a ADSE em Abril para evitar que o SNS fique à beira do colapso quando a rescisão de contratos for concretizada.

O que esta "chantagem" dos hospitais mostra é a "imperiosa necessidade" de reforçar o SNS, defendeu o secretário-geral do PCP, instando o Governo a não ceder. E aproveitou para salientar algumas medidas emblemáticas dos comunistas, como o fim das PPP (como a de Braga), o financiamento das unidades de saúde, ou a eliminação das taxas moderadoras.

"É preciso mudar mesmo para avançar. Mudar a política e não insistir na ilusória e falsa possibilidade de compatibilização do desenvolvimento do país com a submissão ao capital monopolista, aos juros da dívida, ao euro e às imposições da União Europeia", resumiu Jerónimo de Sousa, que antes vincara que "não se supera a perniciosa política da ditadura do défice com momentâneos artifícios orçamentais". 

Obedecer a Bruxelas só deu lucros a Mário Centeno, não ao país

O eurodeputado João Ferreira, que volta a encabeçar a lista às europeias, distribuiu críticas ao Governo, à direita e ao Bloco de Esquerda. Pegou nos números do crescimento económico e no seu abrandamento para defender que a situação do país prova que o Governo do PS está errado quando considera que é possível responder aos problemas estruturais do país cumprindo as imposições europeias de limite do défice e da dívida. O resultado é o “baixo crescimento e a perspectiva de regresso à estagnação”.

Ser o bom aluno perante Bruxelas, só teve como ganho político a “promoção do seu ministro das Finanças a presidente do Eurogrupo”. Porque no país, é o investimento que sofre, como prova, diz João Ferreira, o plano nacional de investimentos 2030, o “retrato de um indigente nível de resposta às necessidades do país” e os problemas estruturais, em vez de se resolverem, “agravam-se”. E, avisa o eurodeputado, “mesmo a política de melhoria de direitos e de rendimentos se esgota progressivamente”.

João Ferreira tentou cavar ainda mais as diferenças entre o PCP e o PS nas questões europeias. Recordou que no ano passado PS e PSD fizeram um acordo sobre os fundos estruturais do próximo quadro financeiro – “uma convergência de ontem, de hoje e de sempre” – que mostra que os socialistas se têm aliado à direita em políticas europeias como a liberalização dos sectores estratégicos, o aprofundamento do mercado único, as posições sobre os memorandos da troika, o impulso à militarização da UE, os acordos de desregulação do comércio.

A que somou a convergência no apoio aos orçamentos comunitários que “cortaram fundos a Portugal”, mas também em todos os instrumentos de governação económica – que permitiram, por exemplo, o processo de sanções a Portugal em 2016.

Ao Bloco, João Ferreira apontou o dedo por, com o PS e a direita, ter rejeitado a possibilidade proposta pelo PCP de Portugal recuperar os mandatos que ficam livres com a saída do Reino Unido da UE.

"No Parlamento Europeu, como em Portugal, os partidos não são todos iguais. No Parlamento Europeu, como em Portugal, PS, PSD e CDS convergem na base de opções políticas de fundo que conduziram Portugal aos atrasos e bloqueios que hoje evidencia", realçou.

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