Piloto belga pode ter assassinado o secretário-geral da ONU em 1961

Dag Hammarskjöld morreu na queda de um avião quando tentava negociar a paz no Congo, e o desastre continua até hoje sob investigação. Um novo documentário questiona o álibi de um mercenário belga acusado de ter abatido o aparelho.

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O secretário-geral da ONU, Dag Hammarskjöld DR

É um mistério com mais de cinco décadas cujo desfecho pode estar agora mais próximo – ainda que sem provas cabais. Em 1961, o diplomata sueco Dag Hammarskjöld, então secretário-geral das Nações Unidas, morria na queda de um avião na antiga Rodésia do Norte (a actual Zâmbia), no Sul do continente africano, em plena missão de paz. Desde então, as causas do desastre continuam a ser motivo de intenso debate. Oficialmente, ter-se-á tratado de um acidente causado por um erro de pilotagem. Mas tanto as Nações Unidas como a Suécia continuam até hoje a investigar a possibilidade de um atentado. 

Agora, um novo documentário com testemunhos inéditos sobre o principal suspeito do abate do avião vem reforçar a tese de que o então secretário-geral da ONU foi vítima de um ataque. 

Cold Case Hammarskjöld estreia-se no final deste mês no festival de cinema de Sundance, nos EUA. Segundo o jornal britânico The Guardian, o seu realizador, o dinamarquês Mads Brügger, e o detective sueco Göran Björkdahl, entrevistaram amigos e outras pessoas próximas de Jan van Risseghem, um piloto mercenário belga ao serviço dos separatistas da região congolesa de Katanga que já tinha sido apontado como suspeito. Um destes amigos, Pierre Coppen, revela pela primeira vez que Risseghem ter-lhe-á confessado que abateu o aparelho de Hammarskjöld.

“Eu cumpri a missão. E depois tive de sair dali para salvar a minha vida”, terá dito Risseghem a Coppen, que afirma que o belga não saberia que Hammarskjöld estava a bordo do avião alvo do ataque.

Não é a primeira vez que o nome de Risseghem é referido no caso. Era apontado como o principal suspeito da autoria de um possível ataque, logo no dia do acidente, num telegrama diplomático norte-americano que foi mantido sob segredo durante décadas.

Contudo, Risseghem, que morreu em 2007, sempre negou qualquer envolvimento na queda do avião, tendo mesmo apresentado como álibi os seus diários de voo da época, que indicariam que estaria de folga na data em que o avião do secretário-geral se despenhou nos arredores da cidade de Ndola. No entanto, outro antigo piloto mercenário em Katanga entrevistado no documentário, Roger Bracco, afirma que os registos terão sido forjados.

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O secretário-geral da ONU, Dag Hammarskjöld Organização das Nações Unidas

As ligações a Inglaterra (e a fuga por Portugal)

O documentário explora também outro aspecto pouco abordado até agora: as extensas relações entre este piloto belga e o Reino Unido. Risseghem, que durante a juventude escapou ao avanço das tropas nazis fugindo para Portugal e dali para Inglaterra, juntou-se à RAF (Royal Air Force, força aérea britânica) e participou no esforço de guerra aliado, tendo sido condecorado. Era filho de mãe inglesa e casou-se com uma mulher britânica.

Após a II Guerra Mundial, Risseghem colocou a sua experiência de pilotagem ao serviço dos separatistas de Katanga, a principal região mineira da então recém-independente República do Congo. Os rebeldes contavam com apoio da Bélgica (a antiga potência colonizadora) e de grandes empresas ocidentais interessadas na exploração dos recursos naturais da região.

Hammarskjöld, por seu turno, estava apostado na negociação da paz entre o Katanga de Moise Tshombe e a República do Congo, preocupado com a viabilidade e integridade da antiga colónia belga e com o risco de um precedente para outros conflitos num continente que estava a libertar-se do colonialismo.

Sem apoio dos EUA ou do Reino Unido, o secretário-geral da ONU deslocava-se a África em segredo. A 18 de Setembro de 1961, o avião em que seguia caiu a meio da noite numa área montanhosa da actual Zâmbia. A bordo estavam outras 15 pessoas. Quinze morreram de imediato, outra morreria duas semanas depois, não sem antes dizer aos investigadores que vira “faíscas no céu” momentos antes do desastre. As Nações Unidas reabriram o caso em 2015. Mas, até ao momento, o mistério continua.

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