Sete votos do PSD podem chegar para uma (curta) maioria aprovar a eutanásia

Na bancada do PSD a maioria votará contra, mas há pelo menos sete desalinhados e muitos indecisos. No PS, apenas Ascenso Simões assume ser contra eutanásia. Votação será renhida e dependerá também das ausências

A despenalização da eutanásia passa ou não? A resposta final só será dada com toda a certeza na próxima terça-feira, no momento da votação na generalidade já que depende do número de votos a favor na bancada do PSD e de votos contra na bancada do PS. Entre os sociais-democratas só sete deputados já se assumiram a favor, a maioria será contra, mas ainda há indecisos. Em caso de aprovação final, o centro-direita que se opõe à lei tem poucas formas de a contornar: no PSD o referendo e um pedido de fiscalização de constitucionalidade estão praticamente afastadas, no CDS a porta não está fechada para nenhum dos cenários embora sejam remotos.

Na bancada do PSD, só estão assumidos sete votos favoráveis, embora se admita que podem ser quase o dobro. Fonte parlamentar admitiu que há muitos indecisos e que a direcção ainda não tem as contas finais. Até porque ao que o PÚBLICO apurou, estão a surgir recomendações de concelhias – como a de Coimbra – para os deputados votarem contra os projectos de lei. Do lado do sim estão: Paula Teixeira da Cruz, Duarte Marques, Adão Silva, Teresa Leal Coelho, Cristóvão Norte, Pedro Pinto e Margarida Balseiro Lopes. Na bancada do PS só Ascenso Simões vota contra, mas há liberdade de voto. O PCP e o CDS estão contra, o BE é favorável. Falta ainda saber quantos deputados vão faltar por doença ou estarão ausentes por viagem parlamentar, o que também pode baralhar as contas. Os deputados do PSD já foram avisados de que não podem ser dispensados da votação de terça-feira por nenhum motivo. 

A votação será nominal, ou seja, um a um. E foi essa contagem que parece já ter começado cinco dias antes. 

A favor do referendo 

Na direcção do PSD não houve uma orientação de voto até porque Rui Rio é a favor e Fernando Negrão, líder da bancada, é contra. Mas a declaração em que Rio defende ser um “imperativo do Estado” assumir que a despenalização da eutanásia “deve ser um direito consagrado”, apelando à “consciência” dos deputados, caiu mal no grupo parlamentar.

Na reunião da bancada desta quinta-feira, houve quem tivesse considerado essas declarações “infelizes”. A crítica foi de Miguel Morgado mas outros deputados concordaram com ele, segundo relatos feitos ao PÚBLICO sobre a reunião que decorreu à porta fechada. O ex-vice-presidente do PSD Marco António Costa concordou com a crítica mas ao contrário de Morgado defendeu a realização de um referendo sobre a matéria. Uma posição que foi secundada por Luís Campos Ferreira e que até chegou a ser defendida há alguns meses pelo líder parlamentar. Mas como o próprio reconheceu perante os seus pares ficou a falar sozinho no partido.

A necessidade de mais debate foi um dos argumentos usados pelos sociais-democratas a favor do referendo. Caso fosse apresentada uma proposta de referendo sobre a eutanásia  - depois da votação de terça-feira - isso implicaria a interrupção do processo legislativo. Mas isso é um cenário pouco provável já que no PSD Rui Rio é a favor da consagração deste direito. No CDS, a hipótese não está excluída mas não foi amadurecida nesta fase. A prioridade dos centristas é que os projectos de lei chumbem já na terça-feira e o assunto fique arrumado. Foi por isso uma boa notícia quando o líder da bancada comunista João Oliveira anunciou, esta quinta-feira, o voto contra dos 15 deputados. "A legalização da eutanásia não pode ser apresentada como matéria de opção ou reserva individual", defendem os comunistas que acrescentam que "inscrever na lei o direito a matar ou a matar-se não é um sinal de progresso mas um passo no sentido do retrocesso civilizacional". Além disso, a morte antecipada tem "profundas implicações sociais, comportamentais e éticas que questionam elementos centrais de uma sociedade que se guie por valores humanistas e solidários". Para o PCP, o referendo também fica de fora.

A possibilidade de as iniciativas do PS, BE, PEV e PAN baixarem à comissão sem votação também parece pouco provável já que iria adiar o calendário de aprovação. Caso viesse a passar no Parlamento e chegasse a Belém já no próximo ano poderia dar argumentos ao Presidente da República para travar o diploma já que 2019 é ano de eleições.

A eutanásia é um tema ao qual o Presidente da República se mantém atento. Marcelo Rebelo de Sousa já disse, em entrevista ao PÚBLICO, que não vetará uma futura lei em função das suas convicções pessoais. "Se tiver dúvidas de constitucionalidade suscitarei fiscalização preventiva, se não tiver, nem de constitucionalidade nem de natureza política, promulgarei", disse o Presidente, em entrevista ao PÚBLICO e à Renascença.

O Presidente também disse que ouvirá todos aqueles que lhe pedirem para ir a Belém. Só ontem, foram 16 líderes religiosos de oito religiões e dois membros da maçonaria. A reunião com católicos, evangélicos, judeus, muçulmanos, hindus, ortodoxos, budistas e adventistas durou mais de uma hora.

Os representantes das oito comunidades religiosas apresentaram-se em Belém com “perspectivas distintas” sobre várias matérias, mas transmitiram ao chefe de Estado que estão “absolutamente convergentes” em relação à eutanásia, que consideram ser “um retrocesso civilizacional”.  “As nossas perspectivas podem ser distintas, como de facto são, mas aqui neste ponto são absolutamente convergentes”, afirmou o cardeal-patriarca, Manuel Clemente, à saída do encontro, citado pela Agência Lusa.

Os 16 representantes das oito religiões mostraram-se unidos: “Estamos juntos para ter a mesma voz”, acrescentou o xeque David Munir, líder da Mesquita Islâmica Central de Lisboa. “Espero que cuidemos mais das pessoas que precisam dos nossos cuidados do que os abandonemos”, acrescentou o xeque Munir, sublinhando também a necessidade de “valorizar a vida e dar mais ênfase aos cuidados paliativos”.

As reuniões com o Presidente confirmam que, para Marcelo tomar uma decisão, é decisivo medir o pulso à sociedade. com Maria Lopes

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