Governo segue recomendação da ERSE e corta 100 milhões nas rendas anuais da EDP

O Executivo seguiu à letra a recomendação do regulador, ainda que os cálculos da REN e da EDP para o valor da parcela variável pedissem 100 milhões acima desse valor.

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António Mexia lidera a EDP e é um dos arguidos no caso dos contratos CMEC Rui Gaudêncio

O Governo decidiu nesta semana o valor que a EDP irá receber até 2027 pela parcela variável dos contratos CMEC (custos para a manutenção do equilíbrio contratual), que garantem rendas fixas a várias centrais da EDP: são 154,1 milhões de euros, o que corresponde a cerca de 15 milhões por ano, avançam o Diário de Notícias (DN) e a Lusa nesta segunda-feira — o executivo segue assim, à letra, a recomendação feita pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE). A estes 154 milhões, soma-se ainda uma parcela fixa total de 675 milhões de euros.

Como nota o próprio despacho governamental a que o DN e a agência Lusa tiveram acesso, homologado pelo secretário de Estado da Energia, Seguro Sanches, trata-se de um corte de 102,4 milhões face ao valor apurado pelo grupo de trabalho da REN e da EDP.

Logo na altura em que os cálculos foram tornados públicos, em Setembro do ano passado, era visível que o valor apresentado pelo regulador não batia certo com os valores definidos pela EDP e pela REN no seu próprio cálculo de revisibilidade final, que apontava para um valor de 256 milhões, 100 milhões acima do valor calculado pela ERSE.

Ainda que a EDP tenha contestado as conclusões da reguladora e a metodologia utilizada, “a interpretação defendida e utilizada pela ERSE no apuramento do montante do ajustamento final tem pleno acolhimento na lei”, lê-se no despacho.

“O cálculo do ajustamento final é da competência da ERSE”, diz o despacho, acrescentando que “parece que a EDP Produção pretende inverter os papéis, transformando a ERSE em mera colaboradora do grupo de trabalho que foi constituído, precisamente, para com ela colaborar”.

Como referido pelo PÚBLICO em Setembro, a ERSE não explica o que é que levou a uma redução tão significativa do valor da componente variável dos CMEC (de 180 milhões para 15,4 milhões ano), mas uma parte da explicação tem que ver com o facto de o contrato da central a carvão de Sines (que representa o encargo mais elevado) terminar já no final deste ano. Depois disto, restarão os CMEC de 16 barragens, dos quais a maioria terminará em 2024 e o último em 2027.

CMEC alvo de investigação

Além do apuramento dos custos, a ERSE defendeu então que a alteração do quadro legal aplicável aos CMEC ou a sua clarificação poderá reduzir ainda mais o valor agora apurado e comunicado ao Governo, podendo anular os 154 milhões de euros a pagar à EDP ou mesmo tornar este valor favorável aos consumidores. No seguimento do Orçamento do Estado 2017, o apuramento dos CMEC passou a ser responsabilidade de uma unidade especializada da ERSE, em vez do grupo de trabalho REN e EDP.

O Governo aguarda ainda os resultados da auditoria a respeito do risco de sobrecompensação e à identificação e apuramento do efeito financeiro das situações consideradas inovatórias ponderadas nos CMEC, que não existiam nos CAE [contratos de aquisição de energia], que está a ser feito pela Direcção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), em articulação com a ERSE.

Os CMEC estão a ser objecto de uma investigação do Ministério Público, que tem como arguido o antigo ministro da Economia Manuel Pinho e o presidente executivo da EDP, António Mexia, entre outros, que apura "o processo legislativo, bem como os procedimentos administrativos relativos à introdução no sector eléctrico nacional dos CMEC".

Os CMEC são uma compensação relativa à cessação antecipada dos CAE, o que aconteceu na sequência da transposição de legislação europeia no final de 2004, tendo depois sido revistos em 2007. Ainda assim, mantiveram-se dois CAE — Turbogás e Tejo Energia —, que são geridos pela REN Trading.

São actualmente abrangidos pelo regime dos CMEC 16 centrais hídricas da EDP, cujos contratos terminarão faseadamente até 2027 (Alto Lindoso, Touvedo, Venda Nova, Vilarinho das Furnas, Pocinho, Valeira, Vilar-Tabuaço, Régua, Carrapatelo, Torrão, Crestuma-Lever, Caldeirão, Aguieira, Raiva, Pracana, Fratel).

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