Um ano para festejar 30 anos de marionetas

Teatro de Marionetas do Porto vai passar o ano de 2018 a revisitar a sua história, a partir da sede agora alargada da Rua do Belomonte, onde tudo começou – e onde agora convergem museu e espaço de experimentação.

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Isabel Barros, directora do Teatro de Marionetas do Porto Paulo Pimenta
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Isabel Barros, directora do Teatro de Marionetas do Porto Paulo Pimenta
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Vitrina de MIséria, uma das criações históricas de João Paulo Seara Cardoso Paulo Pimenta
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Museu das Marionetas do Porto Paulo Pimenta
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Museu das Marionetas do Porto Paulo Pimenta
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Museu das Marionetas do Porto Paulo Pimenta

Já não vai na Rua das Flores, nem mesmo “no Batalha”!... Numa espécie de regresso às origens, a Rua de Belomonte, em plena zona histórica da cidade, é agora a sede alargada do Teatro de Marionetas do Porto (TMP), que continua a ser o palco principal (e original) das criações da companhia que em 2018 assinala 30 anos de história e é também, desde há pouco mais de um ano, o novo lugar do Museu das Marionetas do Porto.

Foi aqui que tudo começou em Setembro de 1988, com uma das primeiras criações de João Paulo Seara Cardoso (1956-2010), Teatro Dom Roberto. Em três décadas, o TMP estreou perto de meia centena de produções, que têm marcado o panorama desta arte no país através da estética inconfundível daquele encenador que casava a tradição com a inovação formal e a contemporaneidade – e que deixou escola através da gestão e da direcção artística de Isabel Barros, também responsável por várias encenações na última meia dúzia de anos de actividade da companhia.

Assinalando o 30.º aniversário, o TMP vai passar o ano revisitar a sua história, com a reposição de 13 criações, num calendário que contará 77 apresentações e que começa já a 25 de Janeiro com uma revisão de Fausto (2015), a partir de Christopher Marlowe, com texto e encenação de Roberto Merino.

Mês a mês, será depois possível (re)ver, entre o Teatro de Belomonte e outros palcos do Porto e de Matosinhos, Kitsune (23 de Fevereiro), Óscar (7 de Março), Bichos do Bosque (21 de Março), Arcano (6 de Abril), Como um Carrossel (11 de Maio), Barba Azul (6 de Junho), Pelos Cabelos (1 de Julho), Os 3 Porquinhos (17 de Agosto), Wonderland (21 de Setembro), Frágil (10 de Outubro), Quem Sou Eu? (20 de Outubro), Nunca (17 de Novembro) e Cinderela (13 de Dezembro).

“Achámos que, à imagem do que o João Paulo fez aquando da comemoração dos 20 anos, seria interessante repor vários espectáculos”, explica ao PÚBLICO Isabel Barros. É uma forma de proporcionar aos públicos mais jovens a fruição de produções que em muitos casos foram vistas pelos pais. “Quem, por exemplo, viu o Óscar em 1993 agora poderá trazer os filhos: é uma situação muito curiosa, que verificamos aqui muitas vezes, esta transmissão de gerações”, acrescenta a directora e encenadora do TMP.

Alguns dos espectáculos serão repostos mantendo a encenação original de Seara Cardoso – como o citado Óscar, Os 3 Porquinhos, Wonderland e também Frágil, que se encontrava ainda em preparação na altura da morte precoce do encenador, em Outubro de 2010.

Estreia em Outubro

A única estreia no calendário do TMP para 2018 será Quem Sou Eu?, que integra o programa do Festival Internacional de Marionetas do Porto (FIMP’18) no mês de Outubro. Trata-se de uma criação com encenação e figurinos de Isabel Barros, que “vai contar com uma composição de intérpretes de formação mista, associando profissionais do TMP e pessoas sem formação nesse domínio, com mais de 65 anos”, adianta a encenadora. O grupo irá ser seleccionado junto da população sénior que frequenta os serviços sociais da autarquia na Quinta de Bonjóia, em Campanhã, onde o TMP detém também um pólo, com um espaço de exposições e animação, e onde promove visitas guiadas, leituras encenadas, etc.

“Vamos encontrar as pessoas, fazer com elas um trabalho de fundo de escrita de textos, de manipulação de marionetas, de confecção e pintura dos figurinos”, acrescenta Isabel Barros, realçando que Quem Sou Eu? será preparado como qualquer outra criação artística. “Já tivemos experiências ligadas a projectos de coesão e inclusão social com outras comunidades do Porto, nomeadamente com o Centro Social de São Nicolau, mas desta vez o objectivo é mesmo criar um espectáculo para levar ao palco”, diz a directora da companhia.

Um museu atribulado

Outra aposta do TMP para 2018 é, finalmente, a edição de um livro com a história da companhia que criou o mítico espectáculo Vai no Batalha (1993). O lançamento está já agendado para 3 de Fevereiro, dia da inauguração, em 2013, do Museu de Marionetas do Porto (e que era também a data de nascimento de Seara Cardoso).

Nessa publicação caberá já certamente a história atribulada da criação do Museu das Marionetas do Porto, um projecto de João Paulo Seara Cardoso que só seria concretizado depois da sua morte. Em Fevereiro de 2013, o equipamento era finalmente inaugurado num edifício alugado na Rua das Flores. “O João Paulo foi muito visionário ao apostar naquela rua, muito antes de se sonhar que ela viria a ser pedonal e uma das artérias mais procuradas na cidade”, nota Isabel Barros. Nesse espaço alugado em 2002, o TMP instalou o seu museu, que desde o início se quis "assumidamente de autor”, realça a directora.

“Abrir o museu foi um grande esforço pessoal e da companhia, de modo a completarmos o sonho do João Paulo”, recorda Isabel Barros. Passado o período, também difícil, das obras na rua, e com a progressiva afluência de turistas à cidade, depressa o museu se tornou um lugar de passagem (e entrada) natural para os visitantes, de tal modo que, das quase 17.500 visitas que registou em 2016, mais de metade eram de turistas estrangeiros.

Mas foi também o aumento exponencial do turismo na Baixa que levou à sua “expulsão” da Rua das Flores, quando o proprietário decidiu vender o edifício. “Tínhamos [direito de] preferência na compra, mas não pudemos fazê-lo, porque os encargos estrangulariam a companhia”, nota Isabel Barros. Daí a opção por regressar às origens, à Rua de Belomonte, onde o antigo armazém ao lado do pequeno teatro de bolso do TMP foi esvaziado e transformado – novamente com desenho do arquitecto José Gigante, o mesmo autor do pequeno teatro e do espaço na Rua das Flores – no novo museu.

É aqui que o TMP agora “conta” a sua história, em dois pisos onde, simultaneamente, recorda algumas produções clássicas da companhia e de João Paulo Seara Cardoso – Teatro Dom Roberto e Miséria (1991) – em paralelo com vitrinas onde vão sendo actualizadas outras evocações da intensa vida do colectivo: actualmente, podem aí ser admirados as marionetas de produções como Máquina-Hamlet (1997), Exit (1998), Nada ou o Silêncio de Beckett (1999), Macbeth (2001), O Polegarzinho (2002)... Ou os simpáticos pinguins e pelicanos de História da Praia Grande (2003), que agora decoram a montra para a rua, com que o TMP se aprontou para a quadra do Natal também como uma forma de se associar à vivência de bairro que sempre foi (também) fonte inspiradora das criações de João Paulo Seara Cardoso.

“Nunca perdemos o sentido das nossas origens, mesmo quando apostamos num trabalho de investigação e experimentação muito grande, que nos permite sempre introduzir coisas novas e actualizar as peças quando fazemos reposições”, diz Isabel Barros, que em 2016 criou Como um Carrossel a partir de um original escrito e encenado dez anos antes por Seara Cardoso e o dedicou às filhas de ambos.

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