Ronit Elkabetz, desaparece o rosto do novo cinema israelita

Gett: O Processo de Viviane Amsalem e Cinzas e Sangue passaram no circuito comercial português. Mas a actriz era principalmente um nome do cinema francês e do seu país.

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Ronit Elkabetz no Festival de Cinema de Deauville, em 2009 FRANCOIS GUILLOT/ AFP PHOTO

Pudemos vê-la, nos ecrãs portugueses, no ano passado em Gett: O Processo de Viviane Amsalem (2104), que co-realizou com o seu irmão Shlomi, e meia dúzia de anos antes, em Cinzas e Sangue (2009), dirigida por Fanny Ardant, mas foi principalmente em França e no seu país natal, Israel, que esta terça-feira se chorou a morte de Ronit Elkabetz. Com apenas 51 anos, a actriz, realizadora e argumentista não sobreviveu a um cancro que lhe tinha sido diagnosticado há dois anos. Desaparece, assim, aquela que muitos viam, nos dois países, como o rosto do novo cinema israelita.

O país perdeu “uma actriz excelente”, uma “mulher de cultura de primeiro plano”, que se tornou uma “embaixadora cultural excepcional” de Israel, comentou para uma rádio do país o antigo Presidente Shimon Peres, acrescentando – segundo a AFP – que ela “misturava o talento, a escrita e a interpretação com uma assinatura muito própria”.

Em França, a ministra da Cultura e da Comunicação, Audrey Azoulay, lamentou também o desaparecimento de “uma grande amiga” deste país, de “uma mulher generosa, inspirada, exigente”, que sempre defendeu “uma certa ideia de cinema, independente e comprometido”.

O comprometimento com o cinema e, a partir dele, com a mudança de mentalidades no seu país foi uma marca da carreira de Ronit Elkabetz, realçada pela imprensa, tanto francesa como israelita. “Era uma mulher muito forte mas simultaneamente muito discreta, que dividia a sua vida entre Telavive e Paris”, referiu o crítico Oren Weiss, citado pelo Libération. “Em consequência dos papéis duros que lhe davam a interpretar ao longo da sua carreira – uma prostituta que tentar libertar-se do seu destino, ou uma mulher a quem o marido recusa o divórcio, entre outros –, pensávamos que era indestrutível. Não era o caso, mas ela escondia-o bem”, acrescenta Weiss.

É em Gett: O Processo de Viviane Amsalem que Ronit Elkabetz interpreta essa personagem de uma mulher que tenta alterar o costume arcaico que atribui a um tribunal rabínico ou ao próprio marido o direito de autorizar o divórcio. O filme, em que é intérprete e co-realizadora, encerra uma trilogia sobre a situação da mulher na sociedade israelita confrontando os seus costumes mais retrógrados – os títulos anteriores sendo Les Sept Jours (2007) e Prendre Femme (2004).

Numa carreira feita sempre em trânsito entre o seu país e a França, onde se radicou, em Paris, em 1997, Ronit Elkabetz interpretou três dezenas de filmes, desde 1990. Passou também pelo teatro, tendo-se iniciado, à chegada à capital francesa, no Théâtre du Soleil de Ariane Mnouchkine. Era presença frequente em Cannes, onde estreou filmes, recebeu prémios e presidiu ao júri da Semana da Crítica em 2015.

O Le Monde diz que, nos últimos meses de vida, Ronit Elkabetz estava a trabalhar no projecto de levar ao grande ecrã o último ano de vida de Maria Callas, que a própria queria interpretar. “O filme deverá ser uma reflexão sobre a vida, sobre esta mulher que não queria morrer. 'La Callas' tinha perdido a voz, o desejo de cantar, Onassis… E ela reconciliava-se para renascer. Mas morreu antes, aos 53 anos”, disse ao diário francês Marie Masmonteil, produtora de Gett: O Processo de Viviane Amsalem.

Ronit Elkabetz morreu também antes, aos 51 anos.

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