Ministra não respondeu aos deputados sobre lista de abusadores de menores

Paula Teixeira da Cruz deixou esgotar o seu tempo de intervenção e não pediu tempo emprestado à bancada da maioria. Sobre a constitucionalidade das suas medidas remeteu-se ao silêncio.

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Foi morno e durou menos de uma hora o debate parlamentar em torno de uma das propostas mais polémicas do mandato da ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz: a criação de uma base de dados de pessoas condenadas por abuso sexual de menores, que permite aos pais saber, em determinadas circunstâncias, a identidade de alguém que já cumpriu uma pena e mora agora na sua área de residência.

A governante do PSD esgotou o tempo que tinha para falar na Assembleia da República com outros assuntos e quando chegou a hora de defender a medida já só teve escassos dez minutos para fazer a sua apresentação. Por esse motivo, as perguntas que lhe fizeram os deputados ficaram sem resposta – apesar de poder ter pedido à bancada da maioria para lhe emprestar alguns minutos que lhe permitissem reagir às interpelações da oposição, o que não fez.

A defendê-la saíram em primeiro lugar não os deputados laranja mas os centristas. Asseguraram que Paula Teixeira da Cruz não se encontra sozinha nesta batalha: “Tem o CDS e o PSD ao seu lado, e, sem dúvida, a maioria dos portugueses”, assegurou o vice-presidente da bancada centrista, Telmo Correia. Mas a verdade é que os deputados laranja vão estar sujeitos à disciplina partidária quando votarem a proposta esta quinta-feira. Um facto não passou despercebido à bloquista Cecília Honório durante o debate em que a ministra se manteve muda por já não lhe restar tempo para falar. “Entre os seus já há quem levante a voz para dizer que a lista não faz sentido nestes termos. Por isso foi necessária a disciplina de voto”, observou a deputada, virada para a bancada do PSD. Ninguém lhe respondeu.

Minutos antes, Paula Teixeira da Cruz tinha defendido a conformidade das bases de dados de condenados por abuso de menores com as normas da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.

“O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos concluiu que este registo assenta num justo equilíbrio entre os interesses públicos e privados, uma vez que os crimes em causa são particularmente censuráveis e as suas vítimas são pessoas vulneráveis - a que acresce o facto de a inscrição no registo ter um prazo máximo de duração e o seu acesso ser subordinado a regras de confidencialidade”, alegou, tendo acrescentado que são já seis os acórdãos daquele tribunal no mesmo sentido. Alguns deles debruçaram-se sobre os regimes deste género em vigor em França e no Reino Unido, especificou. “Foi considerada uma medida puramente preventiva e dissuasora – e não punitiva”.

Sobre as objecções de inconstitucionalidade deste tipo de medidas levantadas quer pela Associação Sindical de Juízes Portugueses, quer pelo Conselho Superior do Ministério Público e também pela Comissão Nacional de Protecção de Dados nem uma palavra disse a governante.

Nem voltou, como tinha feito nos últimos meses, a pronunciar-se sobre as “elevadíssimas taxas de reincidência” dos abusadores de menores, uma afirmação que não conseguiu confirmar com nenhum estudo científico. “Não vale a pena esgrimir estatísticas sobre reincidência. Nunca ninguém terá a certeza absoluta de nada. As cifras negras e o facto de muitos destes abusadores terem sido detidos por outro tipo de crimes também não permitirá compreender todo o fenómeno”, observou, acrescentando que a Polícia Judiciária recebe uma média diária de três queixas por este tipo de crime. “Vê-se de tudo, até crianças pré-púberes presas, sodomizadas, violadas”, lamentou, recordando que  a violação de uma criança do sexo feminino até aos cinco anos resulta habitualmente na sua morte.

O argumento de que a permanência de um abusador que já cumpriu cadeia numa lista de condenados por este crime durante até 20 anos impede a sua ressocialização e o estigmatiza não comove a maioria.

Para ilustrar o ténue equilíbrio entre o direito à privacidade de quem já pagou pelo seu crime e o direito das crianças a serem protegidas Telmo Correia recorreu a uma metáfora do reino animal: “Às vezes é tanta a preocupação em proteger o lobo que nos esquecemos do rebanho”. E mesmo não usando a palavra reincidência, o centrista deu-lhe as mesmas voltas. “Se o abuso sexual de menores é um comportamento compulsivo há um risco”, referiu, sem escamotear que é igualmente real o perigo de a proposta de Paula Teixeira da Cruz poder desencadear fenómenos de justiça popular. Algo que a governante não admite:

Socialistas e comunistas apresentaram propostas alternativas à do PSD. Os primeiros querem aumentar as molduras penais de alguns dos crimes deste género, enquanto os segundos apostam na criação de uma estratégia nacional para a protecção das crianças contra a exploração sexual e também os abusos sexuais.

 

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