Direita que já governou com o PS espera “deriva progressiva” para o centro

O PÚBLICO foi falar com alguns social-democratas e centristas que estiveram em governos com o PS. O prognóstico é de que Costa acabará por necociar à direita.

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Basílio Horta: "Acho que António Costa vai fazer o que eu fiz em Sintra" Bruno Castanheira

Não acreditam na porta fechada à direita ou então não passa de uma manobra “provisória”. O PS de António Costa acabará por negociar com o PSD ou CDS caso venha ser possível ou necessário. Essa parece ser a percepção que um conjunto de personalidades políticas da direita que já viveram coligações com o PS no passado.

O discurso de encerramento de António Costa no último Congresso do PS ficou marcado, há uma semana, pelas fortes reticências do novo secretário-geral do PS em relação à possibilidade de uma coligação governamental que incluísse a direita, especificamente o PSD. No passado dia 30 de Novembro, com o propósito de mostrar que “não há tabus” no PS, Costa afirmou que "o pior que pode acontecer em democracia é quando se gera um enorme empastelamento".

Costa seguiu depois a mesma linha ao sustentar que não era “ possível ser alternativa às actuais políticas com querer prosseguir as actuais políticas". Uma posição que deixou no ar a ideia de que o novo líder socialista fechava a porta ao PSD e CDS.

Essa leitura é, no entanto, contestada por antigos ministros e deputados da direita que conseguiram trabalhar politicamente em conjunto com o PS. A maior parte acredita que Costa acabará por aproveitar a oportunidade de colaborar com a direita.

“Se isso fosse a sério, era um risco não só para o país, como para o próprio PS”, assegura António Capucho, o ex-ministro da Qualidade de Vida do Governo de Bloco Central, que o socialista Mário Soares liderou entre 1983 e 1985.

Basílio Horta, que foi líder parlamentar do CDS e ministro do Comércio do Governo que juntou em 1978 o PSD ao CDS, não acredita sequer que essa seja a intenção de António Costa. “Eu não tenho essa interpretação. O doutor António Costa vai fazer o que eu fiz em Sintra”, assegura o agora presidente da Câmara daquele município, recordando a cooperação estabelecida com o PSD e o PCP. “O que António Costa disse foi que se deve olhar para todos os lados”, remata.

Ângelo Correia acredita, por seu turno, que o discurso do líder socialista fazem parte de uma estratégia “de arranque” da sua liderança e que está “temporalmente datado”. Ex-ministro da Administração Interna do  governo de coligação que juntou PSD e CDS em 1981, o social-democrata interpreta no discurso do XX Congresso o “objectivo” de Costa se apresentar o “adversário fundamental deste Governo”. “Não podia, por isso, reconhecer que daqui a oito ou 10 meses iria fazer uma coligação com esses partidos”, remata.

É por isso que Ângelo Correia antecipa que a “marcação à esquerda é provisória”: “O PS sabe que as grandes vitórias se geram no centro político”, conclui, o social-democrata. Uma posição semelhante a António Capucho. A manutenção de um discurso mais virado à esquerda “alienava uma grande fatia do eleitorado do centro”, alerta.

E é essa mesma leitura que Rui Pena faz: “É no centro que as eleições se ganham.” O advogado passou pelo Governo socialista de António Guterres, na pasta da Defesa, muitos anos depois de ter sido líder parlamentar do CDS. “Não fui para o Governo defender um projecto de esquerda e nunca me senti mal junto do PS”, assegura.

Depois de afirmar ao PÚBLICO estar “cada vez mais convencido de que hoje é absolutamente necessário uma certa união de esforços” no país, Pena considerou o discurso de Costa “anquilosante”. “Nesta fase é efectivamente arriscado” para o PS fechar a porta a uma coligação com os partidos da direita, adverte. “Não sabemos qual vai ser a composição do Parlamento depois das eleições [legislativas]”, considera o advogado.

A conclusão, portanto, é que os próximos meses serão reveladores. “Vai haver uma deriva progressiva do PS” para o centro, admite Ângelo Correia. O fundador do PSD, António Capucho, está convencido que António Costa “não pode enjeitar a hipótese de aparecer um Rui [Rio] mais social-democrata que o Pedro [Passos Coelho], tão confiável como o PSD de Mota Pinto”.

Ângelo Correia considera igualmente relevante o papel de Rui Rio. “Assinalem o surgimento de Rui Rio [lançamento de um livro] no mesmo momento do Congresso do PS.”

Basílio Horta acrescenta que a capacidade agregadora de Costa se revelará: “O que António Costa tem dito é que todos são necessários.” Até porque essa visão encaixa na sua a convicção de que “um governo de unidade nacional é perfeitamente possível” e até necessário “para mudar a política” portuguesa.

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