Portugal coloca dívida a dez anos com juros historicamente baixos

O Tesouro português conseguiu colocar a totalidade dos 750 milhões de euros previstos, a um juro de 3,575%. Procura excedeu 3,5 vezes a oferta.

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Naquele que era considerado o grande teste à capacidade do país em obter financiamento nos mercados sem apoio de um sindicato bancário, o leilão de dívida de longo prazo realizado esta quarta-feira pelo IGCP apurou uma taxa de juro de 3,575%.

Segundo dados da agência que gere a dívida pública portuguesa, foram colocados os 750 milhões de euros que correspondiam ao máximo do intervalo indicativo (entre 500 e 750 milhões). Os dados do IGCP mostram ainda que a procura foi de 2603 milhões de euros, ou seja, quase 3,5 vezes mais do que o montante colocado no mercado. Esta foi a primeira operação juntos dos mercados sem o apoio de um sindicato bancário desde que Portugal assinou o programa de assistência económica e financeira com a troika de credores (BCE, Comissão Europeia e FMI) em Maio de 2011.

Filipe Silva, director da Gestão de Activos do Banco Carregosa, numa análise enviada às redacções, destaca que “Portugal conseguiu emitir dívida a taxas historicamente baixas". "Pelo menos, desde 2006 que não encontramos nenhum leilão com uma taxa tão baixa, o que não deixa de ser surpreendente. Em 2006, emitíamos dívida a 10 anos a pagar 3,94%", assinala. Pouco antes do pedido de ajuda externa à troika, quando a crise da dívida soberana estava num momento agudo, um leilão de Obrigações do Tesouro a 10 anos, em Janeiro de 2011, só conseguiu colocar dívida a uma taxa de 6,72%.

"Mesmo se formos comparar este leilão com as operações sindicadas, a taxa de hoje conseguiu ser melhor: em Maio de 2013, emitimos dívida a 10 anos a 5,65% e em Fevereiro deste ano, também numa operação sindicada, a taxa foi de 4,65%", diz Filipe Silva, para quem "o mais surpreendente" é que a taxa do leilão desta quarta-feira "conseguiu ser ainda mais baixa do que a emissão que está no mercado secundário e que está com uma taxa nos 3,65%".

No entanto, o montante que o IGCP anunciou querer colocar hoje no mercado é bastante inferior ao valor ligado às emissões sindicadas (operação em que os bancos sondam primeiro o interesse dos investidores), que chegaram aos 3000 milhões. Assim, como refere Filpe Silva, o montante colocado esta quarta-feira "é muito pequeno". "Basta o interesse de um ou dois grandes investidores para absorver esta oferta. Há fundos que têm em carteira perto de 200 milhões de euros em dívida portuguesa. A dimensão do leilão é pequena, terá havido alguma cautela”, sublinha este analista.

Um outro analista, Tiago da Costa Cardoso, da XTB Portugal, considera: "Embora ainda não exista, para já, uma estratégia definida em relação à saída do programa de ajuda, com este resultado poderemos estar cada vez mais perto de uma saída limpa, semelhante à da Irlanda". No leilão mais recente realizado pela Irlanda, no mês passado, uma emissão a dez anos e que foi a primeira operação após o fim do programa da troika, este país colocou dívida no mercado a um juro de 2,967%.

Os países da periferia da Europa, como Portugal, têm beneficiado fortemente de um ambiente propício de baixa de taxas de juro, devido, em grande parte, ao Banco Central Europeu (BCE). Conforme já noticiou o PÚBLICO, os investidores estão mais confiantes em arriscar neste tipo de títulos desde a garantia de Mario Draghi de que o BCE faria tudo para salvar o euro e, mais recentemente, com o aparecimento de indicadores económicos menos negativos nos países e a perspectiva de compra de activos por parte do banco central. Perante este cenário, e tendo em conta que as taxas de juro são ainda bastante mais atractivas do que as dos países do Centro da Europa, os investidores optam por assumir o risco de voltar a aumentar a sua exposição aos países periféricos.

O Governo já veio festejar o resultado da operação. Num encontro com jornalistas esta manhã sobre fundos europeus, o ministro adjunto e do Desenvolvimento Regional, Miguel Poiares Maduro, acabou por se pronunciar sobre o leilão quando foi conhecido o valor da taxa de juro suportada pelo Estado. E procurando separar a situação portuguesa da grega, que há duas semanas foi aos mercados pela primeira vez em quatro anos – quando Portugal tentou uma primeira operação sindicada, fê-lo ainda em 2013 –, Poiares Maduro insistiu que o Estado tem condições para pagar a sua dívida.

“Numa altura em que estamos a regressar aos mercados, a conseguir taxas de juro tão boas, vamos colocar a hipótese de não querer pagar financiamento, de não querer pagar a dívida? Isso é que me parece completamente absurdo. Parece-me que só seria masoquista [para o país]”, afirmou. Com Pedro Crisóstomo

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