Bernie Sanders recandidata-se à presidência dos EUA, mas será que a sua oportunidade já passou?

Sanders abriu as portas à política progressista. Volta a candidatar-se à presidência dos EUA, mas ainda será relevante? Há uma multidão de candidatos com a sua agenda. "2020 não é 2016", diz-se. Mas o senador do Vermont já angariou 5,9 milhões de dólares nas primeiras 24 horas de campanha.

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Bernie Sanders TANNEN MAURY/EPA

Bernie Sanders está de volta para mais uma corrida à Casa Branca, mas esta campanha promete ser muito diferente da de 2016, que tornou o senador do Vermont numa força política nacional dos Estados Unidos. 

Nesta campanha, Sanders, que anunciou a candidatura na terça-feira, vai ter que lutar muito para se evidenciar numa multidão de candidatos progressistas que cavalgam os temas que o senador introduziu no debate político do Partido Democrático há quatro anos.

Aos 77 anos, Sanders também vai ser confrontado com a sua idade e relevância num partido onde as novas vozes e a diversidade ganham cada vez mais terreno.

Muitos dos seus apoiantes continuam do seu lado — nas 24 horas que se seguiram ao anúncio, o candidato angariou 5,9 milhões de dólares para a campanha, doados por mais de 220 mil pessoas —, mas outros estão à espera para ver como se compõe o campo democrático que nas eleições de Novembro de 2020 quer desafiar o Presidente eleito pelo Partido Republicano, Donald Trump.

“2020 não é 2016. Ele já teve a sua oportunidade e em 2020 pode não voltar a tê-la”, disse Ron Abramson, um advogado do New Hampshire (o estado onde se inauguram as primárias dos partidos em que são escolhidos os candidatos às presidenciais). Em 2016, Abramson foi delegado à Convenção do Partido Democrata pelo campo de Sanders, mas agora está relutante em voltar a apoiá-lo.

Sanders entra na corrida pela nomeação democrata numa posição vantajosa: o seu nome é conhecido em todo o país, consegue mobilizar uma multidão de pequenos doadores e os seus apoiantes são muito motivados (em 2016 acorreram em massa ao seu chamamento para fazer campanha contra a sua rival de partido, uma das políticas mais famosas do país, Hillary Clinton).

Há quatro anos, Sanders, um socialista independente que alinha com os democratas no Senado, puxou Clinton e o partido para a esquerda, galvanizando os eleitores mais jovens e liberais com uma agenda a favor do serviço de saúde universal, do aumento do salário mínimo para 15 dólares por hora e do fim das propinas nas universidades públicas.

Uns abrem portas...

Mas essas são agora linhas orientadoras do partido e vários outros candidatos democratas à presidência, entre eles os senadoras Elizabeth Warren, Kamala Harris, Kirsten Gillibrand e Cory Booker, ​​promovem-nas.

“O papel de alguns é abrir portas, o papel de outros é transpô-las”, disse Deborah Arnie Arnesen, uma radialista de esquerda e antiga deputada estadual do New Hampshire que diz ser admiradora de Sanders. “Bernie abriu as portas à política progressista, mas penso que tem que reconhecer que há novos jogadores a postos”.

Sanders vai também enfrentar o ressentimento de sectores democratas devido à campanha de 2016. Ao ter desafiado a candidatura de Clinton, que era dada como certa, dividiu o partido e criou uma tensão que ainda persiste entre o chamado aparelho e a ala progressista.

Sanders já corrigiu alguns dos erros de 2016. Em Janeiro, pediu desculpa às mulheres que trabalharam na campanha e que disseram ter sido assediadas ou maltratadas por homens, e reconheceu que “o modelo e a segurança” da campanha “foram inadequados”.

Está a tentar aproximar-se dos líderes negros e hispânicos, depois de há quatro anos ter tido dificuldade em conseguir votos junto das minorias. Mas este é um campo em que pode enfrentar dificuldades, uma vez que é um homem branco a competir com candidatos mulheres, negros e hispânicos.

“Quero ter a certeza de que a pessoa que vou apoiar vai mesmo estar atento à diversidade e trabalhar de facto para todas as comunidades, em especial para as pessoas de cor e as mulheres”, disse Lucy Flores, antiga deputada estadual do Nevada e ex-candidata ao congresso que apoiou Sanders em 2016 e ainda não sabe quem apoiará em 2020.

Fracturar o voto

Ray Buckley, presidente do Partido Democrata no New Hampshire, um estado muito influente no arranque do processo de escolha dos candidatos onde há quatro anos Sanders conseguiu 60% dos votos, diz que ali os mais importantes apoiantes do veterano senador continuam com ele. Mas explica que há “angariadores” de outros candidatos a apalpar terreno

Alguns apoiantes de Sanders esperam que uma multidão se voluntarie para ajudar o senador, fracturando o voto de forma a dar-lhe vantagem nas primárias.

“Vai ser muito difícil para alguns dos outros candidatos, porque o senador Sanders já tem prestígio e apoiantes”, disse Tim Smith, membro da legislatura do New Hampshire que integra o comité preparatório da campanha de Bernie Sanders neste estado.

Sanders também vai beneficiar do trabalho de grupos no terreno como o Organização por Bernie e O Povo por Bernie Sanders, que começaram a funcionar muito antes do anúncio oficial da candidatura

Os seus apoiantes dizem que o seu compromisso de décadas com os temas progressistas vai ecoar nos eleitores quando tiverem que escolher entre candidatos com programas idênticos.

“Para ele estes temas não são trivialidades”, disse Katherine Brezler, co-fundadora de O Povo por Bernie Sanders. Explicou a diferença entre Sanders e outros candidatos: “Não quero estar ao lado de alguém que tenha que ser convencido sobre a importância destes temas. Bernie acredita mesmo neles e domina-os.”

Desta vez, porém, as convicções de Bernie Sanders podem não bastar. Como explicou Abramson, o delegado de Sanders em 2016, para enfrentar Donald Trump em 2020 é preciso "alguém que cative um segmento mais amplo do eleitorado”

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