Ryanair não pode pôr em causa “direitos imperativos” da lei portuguesa

Ministro antecipa processo "complexo", porque está em causa o direito europeu. Parlamento vai ouvir administração da Ryanair, sindicatos e Autoridade para as Condições do Trabalho.

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Vieira da Silva, ministro do Trabalho, está ser ouvido no Parlamento LUSA/MÁRIO CRUZ

O ministro do Trabalho, Vieira da Silva, defendeu nesta quarta-feira que a Ryanair não pode pôr em causa os “direitos imperativos da legislação do país” e que o Governo fará “todo o possível para o cumprimento da lei da República”, mas avisou que se trata de um processo "complexo".

O responsável governamental foi questionado no Parlamento pelo PSD, pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP sobre a acção que hoje está a ser levada a cabo pela Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) na Ryanair e sobre a aplicação da lei nacional aos tripulantes portugueses da companhia aérea irlandesa.

Os contratos assinados pela maioria dos trabalhadores portugueses da Ryanair, adiantou o ministro, foram assinados “ao abrigo de outro quadro legal”, como permite um regulamento europeu decorrente da Convenção de Roma. Mas o mesmo regulamento, acrescentou Vieira da Silva, “refere explicitamente que isso não pode pôr em causa os direitos imperativos da legislação do país onde o contrato poderia ser celebrado [neste caso Portugal]”. “Se, como poderá estar a acontecer, alguns desses direitos estiverem a ser postos em causa é um trabalho de investigação caso a caso. É isso que a ACT vai fazer cumprir, com todos os meios ao seu dispor”, garantiu.

Mas o ministro antecipa que será um processo "exigente" e "complexo". "Estamos perante uma batalha que extravasa as fronteiras nacionais, porque está em causa o direito europeu", afirmou.

Vieira da Silva reconheceu que, no momento em que falava, não tinha ainda confirmação de que a Ryanair estaria a impedir os inspectores do trabalho de entrarem nas instalações da empresa, mas se isso aconteceu, alerta, “é ilegítimo e uma coisa grave”. Os sindicatos denunciaram que, na manhã desta quarta-feira, uma inspectora foi impedida de entrar na sala de apresentação de trabalhadores da Ryanair no aeroporto do Porto, no último de três dias de greve dos tripulantes portugueses da companhia aérea irlandesa. 

No decorrer da audição, o ministro acabou por negar obstáculos à actuação da ACT. "O reporte que a equipa da ACT me fez agora mesmo é que não identificou nenhuma restrição a qualquer instalação dos aeroportos nacionais", garantiu.

Já em relação à violação do direito à greve, também denunciada pelos sindicatos, Vieira da Silva precisou que isso também será avaliado pela ACT na acção que está a levar a cabo nos três aeroportos do continente.

A substituição de trabalhadores em greve por outros trabalhadores da empresa, precisou Vieira da Silva, tem de ser avaliada com base na grelha de distribuição de voos. “Só quando os trabalhadores estão escalados para um determinado voo e são substituídos por outros é que estamos a falar de uma violação à greve”, disse, acrescentando que é um processo exigente.

“Temos que ver em que condições terá acontecido essa substituição ilegítima”, afirmou ainda.

Ryanair ouvida no Parlamento

Também nesta quarta-feira, a Comissão de Economia, Inovação e Obras Públicas aprovou por unanimidade o requerimento do Bloco de Esquerda para a audição, com carácter de urgência, dos representantes do conselho de administração da Ryanair em Portugal, do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) e dos responsáveis da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT).

“Esperamos que esta audição nos possa trazer esclarecimentos sobre o que se passa na Ryanair”, afirmou o deputado do Bloco de Esquerda José Soeiro.

Também o PCP anunciou, através da deputada Rita Rato, que vai apresentar uma proposta semelhante, estendendo o pedido de audição ao ministro do Trabalho. 

A deputada classificou como “inaceitável” a atitude da companhia aérea e deixou um alerta: "Mais do que pagar multas é necessário garantir que ela cumpre a lei”.

No balanço da greve desta quarta-feira, a dirigente do SNPVAC, Luciana Passo, referiu que das 17 saídas previstas houve 11 cancelamentos e "pelo menos dois voos saíram, numa contabilidade mais difícil de ser feita, mas sabe-se que saíram sem passageiros para irem, justamente, buscar tripulantes a outras bases".

Este número superior de cancelamentos em relação aos outros dois dias de protesto reflecte "maior descontentamento".

A greve de três dias não consecutivos visa exigir que a transportadora de baixo custo irlandesa aplique a legislação nacional, nomeadamente em termos de gozo da licença de parentalidade, garantia de ordenado mínimo e a retirada de processos disciplinares por motivo de baixas médicas ou vendas a bordo abaixo das metas da empresa.

Na terça-feira, em comunicado, a Ryanair afirmou que pretende "operar o horário completo, se necessário com recurso a aeronaves e tripulação de cabine de outras bases fora de Portugal", uma posição que o sindicado classificou como um "anúncio despudorado".

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