Cameron, Merkel e Hollande prometem dar mais asilo, outros viram costas

Ao todo, a Comissão Europeia quer distribuir 160 mil pessoas pela UE. Alemanha, França e Espanha devem receber quase dois terços destas pessoas.

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Refugiados e migrantes chegados esta segunda-feira à Grécia Alkis Konstantinidis/Reuters

O primeiro-ministro britânico David Cameron prometeu receber 20 mil refugiados sírios ao longo dos próximos cinco anos, indo ao encontro do novo plano da Comissão Europeia para acolher 160 mil pessoas que fogem da guerra.

Cameron, que resistia a participar no esquema de distribuição de refugiados que a Comissão Europeia tinha conseguido arrancar a ferros dos Vinte e Oito em Julho, cedeu à intensa indignação popular despertada pelo naufrágio na Turquia em que morreram crianças pequenas, e pelo tratamento a que milhares de pessoas estão a ser sujeitas na Hungria – e mesmo na Grécia, incapaz de lidar com a maré humana que dá as suas costas.

Apesar de o Reino Unido, a Irlanda e a Dinamarca não fazerem parte da distribuição pensada pela Comissão, porque os tratados lhes permitem excluir-se das políticas de Interior e Justiça, Cameron juntou a sua oferta aos valores que são estipulados no novo plano da Comissão de Jean-Claude Juncker, para tentar que mais 120 mil pessoas se juntem aos cerca de 40 mil que os países da União Europeia se comprometeram a receber, cautelosamente.

Alemanha e França, os Estados mais populosos, dão o exemplo: deste lote, Berlim receberá 40.200 pessoas, embora esteja à espera de 800 mil pedidos de asilo este ano. Paris, onde tem havido muito mais resistências a receber refugiados, compromete-se com 24 mil – o que, somado ao compromisso assumido em Julho, resulta em 30.700 pessoas.

Quantos recebe Portugal?
Esta é uma das questões que Juncker terá de esclarecer, quando apresentar oficialmente o plano no Parlamento Europeu: os números avançados pela Reuters produzem um efeito cumulativo, entre os números prometidos pelos Estados em Julho e aqueles que foram avançados nos últimos tempos, depois de a crise dos refugiados se ter agravado, e em resultado dos apelos da Comissão e da chanceler alemã Angela Merkel. Assim sendo, Portugal receberá cerca de 4700 refugiados, e não 3000, como disse o Governo português.

No novo plano Juncker, Alemanha, França e Espanha acolhem 59% dos 120 mil refugiados. Mas 120 mil pessoas representa apenas 36% das entradas irregulares registadas este ano na Grécia, Itália e Hungria, segundo cálculos da Comissão Europeia. Só no último fim-de-semana chegaram 20 mil requerentes de asilo, provenientes da Hungria. E esta segunda-feira, só na ilha grega de Lesbos, acumulam-se 15 mil a 17 mil refugiados, onde a situação “está à beira da explosão”, afirmou o ministro grego da Polícia Migratória, Iannis Mouzalas, citado pela AFP. Na fronteira da Grécia com a Macedónia, pelo menos 8000 pessoas estão à espera de passar, embora 2000 a tenham atravessado, e o clima é de grande tensão, com alguns confrontos com a polícia.

Em algumas capitais europeias, o clima é esperança. “Estes imigrantes vão mudar a Alemanha, e queremos que esta mudança seja positiva. Achamos que é possível”, comentou a chanceler alemã Angela Merkel, num tom positivo. A Alemanha pretende destinar seis mil milhões de euros para lidar com a crise dos refugiados – a verba deve ser inscrita no Orçamento de Estado para 2016, que o ministro das Finanças, Wolfgang Schaüble, apresenta terça-feira no Parlamento.

O Reino Unido abrirá as portas sobretudo a refugiados que se encontram nos campos da Turquia, Jordânia e Líbano (cerca de cinco milhões de pessoas, no total). Cameron afirmou no Parlamento que o seu país interessar-se-á especialmente pelos órfãos de guerra, e abrirá mecanismos especiais para trazer os refugiados dos campos, para não incentivar as viagens desesperadas para a Europa – e o tráfico de seres humanos.

Mas não se julgue que a União Europeia está pacificada – os países que recusavam as quotas obrigatórias para receber refugiados continuam a recusá-las. A República Checa e a Eslováquia reiteraram a sua oposição, escavando mais a trincheira Oeste-Leste que está a marcar a Europa.

“Os migrantes que estão a chegar à Europa não querem ficar na Eslováquia. Não têm uma base para a religião deles aqui, acabariam por fugir. Por isso acho que as quotas são irracionais”, comentou Robert Fico, o primeiro-ministro de Bratislava.

O jornal Financial Times noticiou que está a ser discutida uma proposta que permitiria a alguns países ficarem de fora do sistema de quotas obrigatórias de acolhimento, que permitisse ultrapassar as reservas de alguns países de Leste, designadamente Polónia e Hungria.

Uma “isenção” do sistema de quotas teria de ser justificada por “razões objectivas” – um exemplo seria a Polónia, que invoca planos a possibilidade de ter de acolher refugiados da Ucrânia, se a guerra naquele país se agravar. Mas seria uma exclusão temporária, compensada por contribuições para um fundo de apoio a refugiados.

No plano da Comissão, a Hungria ficaria isenta de receber refugiados, tal como a Itália e a Grécia – porque é um dos países de entrada. Mas a forma como tem tratado os refugiados suscita muitas críticas. Esta semana, o Parlamento de Budapeste deverá aprovar leis para permitir usar o exército nas fronteiras – e o ministro da Defesa, Csaba Hende, demitiu-se nesta segunda-feira, após uma reunião do Conselho de Segurança Nacional, em que se discutia o afluxo de refugiados à Hungria.

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