Marcar o ponto

Joaquin Phoenix traz algo de novo ao cinema de Woody Allen – pena que o realizador não pareça interessado.

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Há um momento durante o qual pensamos que, afinal, a marcação 2015 do “relógio de ponto” anual de Woody Allen não é apenas mais do mesmo: Joaquin Phoenix injecta uma energia diferente em Homem Irracional, no papel de um professor de Filosofia deprimido que, por uma vez, não é uma versão disfarçada do realizador/argumentista.

É como se Allen estivesse disposto a engajar em discussão o melhor cinema americano contemporâneo, ao convocar o actor-fétiche de Paul Thomas Anderson e ao deixá-lo à solta a perturbar a estrutura certinha do seu cinema que se tornou confortável e reconfortante, previsível à distância. E, durante parte significativa de Homem Irracional, até o consegue, mesmo que o dispositivo seja uma variação sobre um dos seus últimos verdadeiramente grandes filmes, Crimes e Escapadelas (1989): o filósofo insatisfeito redescobre a vontade de viver ao decidir agir contra a corrente e cometer um crime moralmente defensável. Mas é falso alarme: de lufada de ar fresco, Homem Irracional tomba no descalabro, tornando-se talvez no mais preguiçoso e desnecessário Allen recente, desperdiçando a premissa elegantemente desenhada num inacreditável chorrilho de passos em falso que destroem completamente o que ficou para trás — para já não falar de um final que quase faz pouco do investimento que o espectador fez no filme. É como se, uma vez intrigado pela presença de Phoenix, o cineasta tivesse decidido que afinal queria era marcar o ponto e fazer mais do mesmo e “sabotasse” o seu próprio filme. De Woody Allen já não esperamos muito, mas não esperávamos certamente este desastre. 

 

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