As visitas, quando benéficas para as crianças, devem ser gratuitas

Apenas no caso da adopção plena, os vínculos com a família de origem se quebram.

A decisão de retirada de uma criança à sua família de origem é sempre uma decisão difícil e complexa para todos os intervenientes, mas ela deve ser tomada e não temida pelos profissionais, sempre que a criança se encontra em situação de perigo. É uma situação difícil, em primeiro lugar para a criança que, embora esteja a ser vítima de negligência grave e/ou maus tratos e/ou abusos de diversa ordem, que colocam em perigo o seu desenvolvimento saudável e harmonioso, ela está vinculada a esses pais.

Sim, as crianças vinculam-se mesmo a pais maltratantes e negligentes, pois é o único modelo relacional que conhecem e o único que lhes proporcionou um mínimo de condições, para a sua sobrevivência. A qualidade da vinculação é que é distinta da das crianças que possuem pais, suficientemente bons, protectores e sensíveis às necessidades dos filhos.

É também uma decisão difícil para os pais, que consideram os filhos como propriedade sua e, algumas vezes, não têm sequer a noção da situação de perigo em que colocam as crianças e dos efeitos adversos que os seus comportamentos e estilos de vida têm no desenvolvimento dos filhos, porque eles próprios foram, na grande maioria das vezes, negligenciados /ou maltratados na infância.

E, por último, é uma decisão complexa para os profissionais (psicólogos, assistentes sociais, magistrados) que avaliam a situação e tomam a decisão final, tendo em conta o superior interesse da criança, a protecção dos seus direitos e o seu bem-estar físico e psicológico. É uma decisão tomada em situações graves, que comprometem o desenvolvimento físico, social e emocional da criança e, após ter sido dada a oportunidade à família de se recuperar.

Embora os interesses das crianças e dos pais estejam intimamente ligados, são os interesses da criança que devem prevalecer e são estes que devem nortear as decisões dos profissionais, baseadas numa avaliação criteriosa, ouvindo a criança, o que ela diz, mas também o que não diz e se manifesta de diversas formas no seu comportamento, avaliando o seu desenvolvimento e a qualidade da vinculação.

Sempre que os pais não são capazes ou não desejam mudar o seu estilo de vida e o seu comportamento em função das necessidades dos filhos, então à criança deve ser dada a oportunidade de ter outros pais, de ter uma nova família. Havendo laços afectivos já estabelecidos com outros familiares que estejam motivados e desejem assumir a parentalidade da criança, essa deve ser a opção, ou então, de ter uma nova família através da adopção.

Apenas no caso da adopção plena os vínculos com a família de origem se quebram, quer do ponto de vista social, quer jurídico; quando ficam aos cuidados de outros familiares, a questão da continuidade ou não, da relação com os pais, coloca-se. Esta é mais uma questão complexa, em que os interesses da criança e o interesse dos pais entram muitas vezes em conflito, e que deve ser resolvida tendo em conta o bem-estar da criança, a curto, e sobretudo, a longo prazo.

A manutenção dos contactos só deve ser decidida se for benéfico para a criança, não deve ser a vontade dos pais a prevalecer. Nalgumas situações, em que a criança é confiada a familiares, estes também preferem o distanciamento dos pais biológicos e dos problemas destes (dependência de álcool ou estupefacientes, comportamentos violentos, entre outros), para evitar a destabilização do seu seio familiar.

Caso seja do entendimento dos profissionais que as visitas dos pais trazem benefícios para a criança, então estas devem ser mediadas e avaliadas por técnicos, com formação específica, em locais próprios, proporcionadas pela segurança social, ou outras IPSSs que dispõem deste tipo de resposta (CAFAP – ponto de encontro) de forma gratuita, dado que é no Interesse da Criança.

Fernanda Salvaterra

Psicóloga e investigadora do Instituto de Apoio à Criança, doutorada em Psicologia do Desenvolvimento

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