Os meus pais gostam mais do meu irmão do que de mim?
Desde muito cedo que as crianças começam a construir uma “percepção de preferência”, por parte dos pais. Que até pode ser falsa mas deixa marcas.
Os filhos têm, por vezes, percepção de que os pais preferem um dos irmãos, o que pode ser falso, mas é decisivo que os adultos conversem com os mais novos para evitar comportamentos problemáticos no futuro, afirmou a autora do livro O Filho Preferido, lançado na semana passada. “Se não houver uma comunicação directa, aberta, honesta entre pais e filhos, se os pais tiverem a percepção de que podem transmitir essa ideia e não conversarem com os filhos sobre isso, se não desmistificarem a questão da preferência, é provável que haja alguns comportamentos e atitudes de ambas as partes que vão reflectir-se na relação familiar.”
Uma “falsa percepção de preferência, pode iniciar-se muito cedo, no primeiro ou segundo ano de vida da criança”, diz a psicóloga Fátima Almeida. Pelo que é essencial falar sobre o assunto independentemente da idade da criança. “O diálogo é a base de tudo, se a comunicação com as crianças for simples, franca e honesta elas percebem, muitas vezes mais cedo do que nós achamos.”
A psicóloga é autora, juntamente com Laura Alho, do livro O Filho Preferido (Edição Pactor), que tentou responder à questão da existência, ou não, de uma preferência por um dos filhos da parte dos pais, um assunto “tabu” de que não se gosta de falar.
A obra foi construída a partir da análise de vários estudos científicos e trabalhos publicados, dividindo-se em 12 capítulos, com outros tantos temas, desde a gravidez, à relação entre os pais, a forma como geriram o nascimento do filho e o seu crescimento. “Não podemos concluir se existe ou não um filho preferido, porque não foi feito um estudo científico sobre isso, o que podemos concluir efectivamente é que tanto pais como filhos têm percepções diferentes e tipos de personalidades diferentes que levam a que tenham alguma tendência para se identificar mais com um filho do que com outro”, explicou Fátima Almeida.
Tendo em conta as personalidades e características de pais e filhos, pode acontecer uma maior empatia entre uns e outros. Um pai identificar-se mais com uma criança do que com outra “não é considerado ter uma preferência”, necessariamnete, ainda que os filhos possam “percepcioná-la como uma preferência”. E “é ai que reside o foco da questão”.
Esta percepção por parte das crianças, de que os pais gostam mais do irmão, pode ter consequências na sua ligação com os pais, com os irmãos e ter mesmo implicações no seu desenvolvimento. A própria relação entre os irmãos vai ser influenciada, “de forma profunda”, com mais conflitos e rivalidade, diz a psicóloga.
“Se uma criança alimentar a ideia de que há um filho preferido que não seja ele próprio, o que acontece muitas vezes é afastar-se da família, vai procurar outros adultos, alguém com quem se identificar.” No fundo, diz, “é como se se sentisse a mais na família e acaba por procurar apoio fora da família”.
Questionada acerca da frequência da existência desta questão da preferência dos pais, Fátima Almeida disse: “É mais comum do que pensávamos, praticamente todas as famílias com mais do que um filho já pensaram ou já falaram sobre o assunto ou, pelo menos, já experimentaram alguma situação constrangedora, porque nem sempre as famílias e os próprios filhos gostam ou sentem-se confortáveis a abordar” o tema.