Famílias Numerosas preocupadas com lei da autodeterminação de género nas escolas

A associação decidiu juntar-se “às muitas vozes que já pediram ao Presidente da República que vete uma medida que remete as famílias para o lugar de espectadores na educação dos seus próprios filhos”.

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Medidas de promoção do direito à identidade de género nas escolas continuam a suscitar polémica Rui Soares (arquivo)
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A Associação Portuguesa das Famílias Numerosas (APFN) mostrou este sábado "grande preocupação" com a lei do direito de crianças e jovens à autodeterminação da identidade de género nas escolas, defendendo que a família deve ter primazia nesse campo.

"A família é a primeira escola de qualquer criança e que os pais são os principais responsáveis pela educação, devendo a escola ser entendida como colaboradora nesse campo", sustenta aquela associação em comunicado.

"A educação para os valores é uma questão muito sensível e na qual a família deve ter sempre primazia. O Estado, por via do Ministério de Educação e das Escolas, não tem legitimidade para impor às famílias modelos de valores que, por serem fundamentalmente ideológicos, carecem de qualquer consenso social ou de suporte científico", reforça.

O Parlamento aprovou na sexta-feira, em votação final global, medidas a adoptar pelas escolas para garantir o direito de crianças e jovens à autodeterminação da identidade de género e a protecção das suas características sexuais.

O texto final, relativo a projectos de lei apresentados por PS, BE e PAN, foi aprovado por estas forças políticas juntamente com o Livre, e contou com votos contra do PSD, Chega e IL, e a abstenção do PCP.

Esta lei ficou conhecida como "a lei das casas de banho" porque prevê a obrigatoriedade de as escolas garantirem aos seus alunos o acesso às casas de banho e balneários de acordo com o género com que se identificam. Mas a verdade é que vai muito mais longe do que isso. Entre as medidas administrativas que visam garantir o direito à autodeterminação da identidade e expressão de género, o texto define, por exemplo, que cada escola identifique um profissional responsável pelas situações de disforia de género, "a quem pode ser comunicada a situação de crianças e jovens que manifestem uma identidade ou expressão de género que não corresponde ao sexo atribuído à nascença".

A criação de mecanismos de intervenção em situações de risco é outra das mudanças impostas pela nova lei, a par da formação dos professores, bem como de pais e crianças, em articulação com organizações de promoção dos direitos das pessoas LGBTQI+. Do mesmo modo, a nova lei prevê que os alunos trans possam mudar o nome e o género nos documentos das escolas, designadamente no registo biográfico e nas fichas de registo da avaliação, "sem prejuízo de nas bases de dados se poderem manter, sob confidencialidade, os dados de identidade registados".

Salvaguardando que "não lhe cabe tomar uma posição a favor ou contra questões ideológicas", a associação diz que lhe cabe "denunciar vigorosamente qualquer tentativa do Estado de usurpar aos pais o seu direito natural de serem os primeiros educadores dos seus filhos, sobretudo no campo dos valores".

"A preocupação sentida pela APFN quanto a esta matéria é agravada de sobremaneira pela denúncia feita por entidades insuspeitas, como a Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, de que as partes interessadas - aquelas que conhecem o ambiente escolar e que estão diariamente em contacto com alunos, professores e pessoal não docente - não foram ouvidas neste processo, reforçando a ideia de que um Governo em final de mandato está a tentar aprovar medidas ideológicas sob pressão", acrescenta a APFN.

A associação diz, por fim, que decidiu juntar-se "às muitas vozes que já pediram ao Presidente da República que vete uma medida que remete as famílias para o lugar de espectadores na educação dos seus próprios filhos".

O percurso da lei esteve longe de ser linear (em 2021, o Tribunal Constitucional chumbou a regulamentação pelo Governo deste tema, sustentando tratar-se de matéria competência exclusiva da Assembleia da República) e acompanha mudanças legislativas noutras frentes, como seja a possibilidade, inaugurada em 2018, de a mudança de género no registo civil poder ser requerida logo a partir dos 16 anos de idade e sem necessidade de qualquer relatório médico a atestar a disforia de género, desde que com consentimento paterno.

Em 2022, houve um recordo no número de pedidos de mudança de género e de nome no registo civil, com um total de 519 pedidos. Foi um aumento de 30% comparativamente com os 399 pedidos do ano anterior, os quais já tinham traduzido uma subida de 70% face aos 234 pedidos de 2020.

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