Mais de metade dos dentistas emigrados experimentaram primeiro exercer em Portugal

Entre os que emigraram, 58,9 % dizem que não conseguiam ter um rendimento satisfatório, 49,3 % não conseguiam ter um salário estável e 32,4 % não conseguiam ter contrato de trabalho.

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Apenas 3,7% dos dentistas em Portugal exerciam a sua actividade num hospital ou num centro de saúde do sector público ou social Paulo Pimenta (arquivo)

Mais de um terço dos médicos dentistas que decidiram emigrar fizeram-no ao fim de seis meses a exercer em Portugal, revela um estudo divulgado esta segunda-feira.

Promovido pela Ordem dos Médicos Dentistas, o estudo Diagnóstico à Profissão de Médico Dentista 2022 traça “um retrato preocupante da precariedade na medicina dentária”. Em 2022, 6,6% dos 3438 dentistas que responderam ao inquérito indicaram que exerciam a profissão no estrangeiro. Destes, 56,2% emigraram já depois de trabalharem em Portugal.

Os principais motivos apontados para exercer no estrangeiro são o rendimento insatisfatório em território nacional (58,9%), a desvalorização da profissão (58,9%), a procura de melhor qualidade de vida (53%), não ter um salário estável (49,3%) e não ter contrato de trabalho (32,4%).

A maior parte optou por exercer a profissão em França (36,5%), seguindo-se o Reino Unido (12,8%) e a Suíça (8,2%), onde há melhores salários e horários mais reduzidos. Segundo o estudo, 51% têm um rendimento mensal bruto acima dos 3000 euros, enquanto em Portugal apenas 11,9% auferem um rendimento semelhante.

Também no estrangeiro, apenas 0,6% auferem menos de mil euros, quando em Portugal esta percentagem aumenta para 7,3%.

Em termos de horário de trabalho, em Portugal quase metade dos dentistas trabalha mais do que cinco dias por semana, ao contrário do que se verifica nos países para onde muitos foram. “É, por isso, sintomático o valor (53,4%) de quem não quer voltar a exercer em Portugal”, refere a Ordem dos Dentistas.

Para o bastonário Miguel Pavão, “Portugal necessita de parar, pensar e decidir” se quer continuar a desperdiçar talento. “Todos nós, que temos responsabilidade na formação das próximas gerações, temos de responder: ‘Investimos na formação de profissionais de excelência para quê e para quem? Para os exportar?’ Estas perguntas aplicam-se tanto no ensino da Medina Dentária como em outras áreas”, defende o representante dos dentistas, em comunicado.

A maioria destes profissionais (60,9%) trabalha em clínicas ou consultórios de outrem. Dos que exercem no sector privado, 61,1% apresentam rendimentos mensais variáveis (que em 91,6% dos casos varia em função dos tratamentos realizados, dos quais recebem uma percentagem).

Apenas 3,7% exerciam a sua actividade num hospital ou num centro de saúde do sector público ou social. Destes, 49,5% disseram estar “a recibos verdes”, contratados directamente pelas administrações regionais de Saúde (27,4%) ou através de empresas intermediárias (22,1%), e 29,2% estavam integrados como técnico superior do regime geral.

O bastonário considera que “há sinais positivos de se querer melhorar alguma coisa no que diz respeito à saúde oral no Serviço Nacional de Saúde”. Mas “sem a carreira no SNS e sem uma revisão profunda ao actual regime de contratação destes profissionais, não vamos ter condições para fixar os médicos dentistas que, assim, vão continuar à procura de reconhecimento e estabilidade no estrangeiro”, avisa.

O estudo conclui que, dos profissionais formados há mais de dez anos, 94,1% começaram a trabalhar num espaço de menos de seis meses, valor que cai 11,9 pontos percentuais quando comparado com quem terminou o curso há menos de uma década.

“Ainda somos uma profissão de entrada rápida no mercado de trabalho, mas isto só acontece à custa do subemprego, do aumento da precariedade profissional, da dificuldade de ter um contrato de trabalho e de não haver uma carreira no SNS. Tudo condições que levam os jovens a emigrar”, alerta Miguel Pavão.

Numa escala de um a dez, a satisfação com a situação profissional é avaliada em 5,87 e apenas 14% aparentam estar muito satisfeitos. Mais de um quarto (26,9%) afirma que, se fosse hoje, não escolheriam a mesma formação.

As preocupações dos dentistas prendem-se com a medicina dentária não ser reconhecida como uma profissão de desgaste rápido (63,4%), com o crescimento dos seguros e planos de saúde (58%) e os custos tributários e de licenciamento associados à manutenção das clínicas (55,5%).

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