Grandes marcas destroem roupa que tinham prometido reciclar, revela investigação

ONG usou air tags para rastrear peças de roupa em perfeitas condições, que foi destruída, deixada em armazéns ou enviada para África. Artigos foram doados à H&M, Zara, Primark, Nike, entre outras.

Foto
Trabalhador dorme a sesta depois de vasculhar aterro de lixo de Dandora, em Nairóbi, Quénia EPA/Daniel Irungu

A maior parte das roupas doadas às grandes marcas que prometem reutilizá-las ou reciclá-las é, na verdade, destruída, deixada em armazéns ou enviada para África, segundo uma investigação divulgada esta segunda-feira.

A investigação, da responsabilidade da organização Changing Markets Foundation, com sede nos Países Baixos, indica que várias cadeias internacionais “deitam fora roupas que prometeram salvar”. E trata-se de roupa, diz a organização, em perfeitas condições.

A organização não-governamental (ONG) explica num comunicado que usou air tags da Apple (dispositivos que enviam a localização) e assim conseguiu rastrear 21 peças de roupa usada, em perfeitas condições. Os artigos foram doados às lojas H&M, Zara, C&A, Primark, Nike, The North Face, Uniqlo e M&S na Bélgica, França, Alemanha e Reino Unido, e outros doados a uma grande cadeia de vendas online.

As marcas comprometem-se a reciclar, produzir menos resíduos, acabar com produtos químicos perigosos, e fazem ofertas para quem entregar roupa em segunda mão, que dizem será para reciclar ou reutilizar.

Segundo a organização, apesar das promessas, três quartos dos artigos (16 em 21) foram destruídos, deixados em armazéns ou exportados para África, onde cerca de metade da roupa usada é retalhada para outras utilizações ou abandonada.

A Changing Markets Foundation dá exemplos: um par de calças doado à M&S foi destruído numa semana, outro par doado à C&A foi queimado num forno de cimento, uma saia doada à H&M viajou 24.800 quilómetros, de Londres até um terreno baldio no Mali, onde parece ter sido despejada. Três artigos acabaram na Ucrânia, onde as regras de importação foram flexibilizadas devido à guerra. Apenas cinco artigos dos 21 foram reutilizados na Europa ou acabaram numa loja de revenda.

“A maior parte dos programas promete explicitamente não deitar fora a roupa utilizável. Mas nenhuma das marcas mencionadas mantém registos públicos sobre o destino das roupas que lhes são doadas. Em vez disso, entregam-nas a empresas especializadas em reutilização, reciclagem e eliminação final” diz a ONG no comunicado.

Urska Trunk, da ONG, diz que as promessas das lojas são mais um truque de “lavagem ecológica” (greenwashing), porque os artigos doados em perfeitas condições são, na sua maioria destruídos, deixados em armazéns ou enviados para o outro lado do mundo. O greenwashing é uma estratégia de publicidade através da qual uma empresa poluidora pretende fazer passar uma imagem de responsabilidade ambiental, que na verdade não tem.

A Changing Markets lembra que a União Europeia está a reforçar as regras em matéria de resíduos e pede uma lei forte, que contemple objectivos obrigatórios de reutilização e de reciclagem.

Sugerir correcção
Ler 4 comentários