Para os restaurantes, impacto do IVA de 0% é nulo, mas pacto sobre preços traz alívio

Antes da isenção, estabelecimentos deduziam o IVA. Agora, com a isenção, há uma neutralidade. Pacto do Governo prevê que agricultores desçam preços logo à partida.

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O pão vendido para consumo fora da padaria é abrangido pelo IVA de 0% Nelson Garrido

A Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (Ahresp) e a Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC) emitiram um comunicado conjunto a explicar que o impacto da redução do IVA numa série de bens alimentares – muitos deles usados pelos restaurantes para confeccionar as refeições – é nulo, porque a medida é uma isenção e, antes, as empresas já podiam deduzir o IVA destes bens.

“Na actividade normal da restauração e similares, como fornecimento de refeições prontas a comer e prestação de serviços de alimentação e bebidas, o diploma não se aplica”, referem as duas entidades, explicando que o impacto da passagem do IVA de 6% para 0% no cabaz dos 46 tipos de produtos “é nulo, porque se trata de um imposto do consumidor final, não tendo qualquer impacto nas actividades económicas” dos estabelecimentos.

Quando compravam os produtos alimentares com o IVA a 6%, os restaurantes podiam deduzir esse imposto ao Estado. Mas agora que adquirem os mesmos bens já isentos aos produtores de carne, legumes e fruta ou às cadeias de distribuição grossista​, os estabelecimentos não têm IVA a deduzir em relação a esses bens, havendo uma neutralidade fiscal, porque não se aplica imposto em toda a cadeia comercial, do produtor ao vendedor final.

Apesar disso, a lei salvaguarda que as operações de compra “conferem o direito à dedução do imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a sua realização”. E esta possibilidade é relevante para os produtores agrícolas, porque lhes permite continuar a deduzir o IVA suportado com outros bens usados para produzir a carne, a fruta ou os legumes que agora vão vender (mesmo que, nesta fase, de forma temporária, não tenham de cobrar IVA sobre esses mesmos bens por existir a isenção temporária).

Embora, regra geral, o impacto seja nulo, a Ordem dos Contabilistas e a Ahresp chamam a atenção para duas circunstâncias em que os restaurantes ou cafés podem ter de aplicar o IVA de 0% se venderem “bens alimentares não transformados para consumo fora do estabelecimento” (em take-away, entrega ao domicílio ou levantamento no carro) caso vendam determinados produtos abrangidos pela isenção, desde que “não sejam refeições prontas a comer”.

Os restaurantes e estabelecimentos semelhantes têm de aplicar a taxa de IVA de 0% em duas situações: se já tiverem comprado “esse produto com a taxa de ‘IVA zero’ e o vão vender sem qualquer transformação (não sendo refeições prontas a comer), e apenas e só no caso de venda para consumo fora do estabelecimento”; e ainda se produzirem “um bem incluído na lista ‘IVA zero’ (como é o caso do pão, sem adição de qualquer outro ingrediente), e apenas e só no caso de venda para consumo fora do estabelecimento”.

A lista do IVA de 0% inclui bens como leite, queijos, ovos, iogurtes, manteiga, pão, massa, arroz, batata, azeite, óleos alimentares, algumas carnes (de porco, vaca, frango e peru), certos peixes (bacalhau, sardinha, pescada, carapau, dourada, cavala), alguns produtos hortícolas (como a cebola, o tomate, o alho-francês, grelos, espinafres ou cenoura), algumas leguminosas em estado seco (feijão vermelho, feijão-frade e grão-de-bico), algumas frutas (maçã, laranja, banana, pêra e melão), atum em conserva, bebidas produzidas à base de frutos secos ou cereais, e produtos dietéticos destinados à nutrição entérica e produtos sem glúten para doentes celíacos.

Baixar preços na produção

Embora para os restaurantes e cafés a solução do IVA seja neutral fiscalmente, os empresários do sector podem vir a conseguir comprar produtos mais baratos do que até aqui, porque a isenção temporária não foi decidida de forma isolada – quando a aprovou, o Governo assinou um pacto com os representantes dos agricultores para que estes reduzam os preços de venda, ou seja, para que o preço baixe no ponto de partida da cadeia ou o mais cedo possível na cadeia comercial.

As compensações ao sector agrícola que se destinam a ajudar a cobrir os custos com a electricidade foram reforçadas em 140 milhões de euros, abrangendo os produtores de “suinicultura, aves, ovos, bovinos, pequenos ruminantes e culturas vegetais”. O apoio extraordinário ao gasóleo agrícola foi prolongado e o mesmo aconteceu com um apoio destinado a amortecer os custos com fertilizantes e adubos. Representados pela Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), os produtores comprometeram-se, em contrapartida, a “fazer reflectir” estes apoios “nos preços dos produtos” abrangidos pelo IVA de 0%, quer de forma directa, quer indirectamente, associando o valor das ajudas a “uma estabilização ou, sempre que possível, a uma redução dos preços à saída da exploração”.

A medida entrou em vigor na terça-feira e está em vigor durante cerca de seis meses, até 31 de Outubro.

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