Porque é que existem tantas crianças com infeções respiratórias no inverno?

Winter is coming” é lema da casa Stark da Guerra dos Tronos, mas serve também como aviso para pais, professores, pediatras e entidades empregadoras.

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Por volta dos 6 meses, o bebé perde a imunidade que herdou da mãe, o que coincide muitas vezes com o ingresso na creche DR/Michal Bar Haim/Unsplash

As constipações são infeções virais habitualmente autolimitadas e de curta duração, mas entre medicamentos, recurso a cuidados de saúde, faltas ao trabalho para cuidar de filhos doentes e subsequente doença dos próprios pais, sabemos que têm um enorme impacto socioeconómico.

Além do desconforto e mal-estar provocados, numa minoria de casos uma constipação pode desencadear sinusites, otites ou outras infecções secundárias. Aliás, as infeções respiratórias são um dos motivos de internamento mais frequente em idade pediátrica.

À medida que as estações passam do verão para o outono e, finalmente, o inverno, o número e a frequência destas infecções aumenta de forma quase exponencial, levando muitos pais a perguntar: “É normal o meu filho estar constantemente doente?”

Há muitos fatores que contribuem para esta tempestade perfeita que cria condições óptimas para as crianças adoecerem.

O frio

Existem muitas crenças acerca do frio e das constipações. As mudanças de temperatura extremas, o andar descalço, ter o cabelo molhado… Tudo isto pode supostamente provocar constipações.

Na realidade, há evidência limitada de que o frio provavelmente diminui ligeiramente o nosso sistema imunitário e facilita a replicação viral, contudo, por si só, não parece ser o factor mais importante. Por exemplo, eu venho de uma cidade na Escócia que tem uma temperatura média diária que não ultrapassa os 16º C no verão, equivalente ao inverno de muitas áreas de Portugal — e não há mais infeções respiratórias na Escócia do que no nosso país.

As viroses

Em climas temperados, os vírus respiratórios tendem a seguir um padrão sazonal, agravando-se durante o inverno. As temperaturas baixas aumentam a capacidade de viroses sobreviverem no ar e em superfícies, aumentando a sua transmissão.

Também a radiação ultravioleta (UV) pode desativar viroses e, durante o inverno, este efeito protetor não está presente. Mas, nos trópicos, onde não há variabilidade de temperaturas, as viroses respiratórias estão presentes ao longo do ano, agravando na época de chuva — quando as pessoas passam mais tempo em espaços fechados.

As escolas e o ambiente físico

O fator mais importante é o nosso comportamento. A circulação das infeções respiratórias começa quando as escolas e infantários regressam à atividade depois das férias de verão.

As crianças começam a passar mais tempo umas com as outras, dando oportunidade de transmitir infeções entre elas. Quando vêm as chuvas e o tempo frio, as crianças ficam mais tempo nas salas e no interior do que no recreio e nos espaços exteriores, sendo que essa proximidade física aumenta a taxa de transmissão.

Para ter uma ideia do quanto isto contribui para as infeções virais no inverno, basta recordar os últimos anos: durante as medidas de distanciamento social houve uma redução marcada em infeções respiratórias. Houve taxas historicamente baixas de gripe. A alteração do nosso comportamento social mudou drasticamente a epidemiologia das infeções virais respiratórias.

Voltámos ao normal, mas o que é um inverno normal? Em tempos pré-pandemia os fatores acima referidos fazem com que as infeções respiratórias sejam muito mais frequentes em todas as idades durante o inverno. Mas, sem dúvida, as crianças mais jovens têm mais infeções.

Há mais de 200 vírus diferentes que podem provocar infeções respiratórias. Os bebés nascem com alguma imunidade a infeções víricas na forma de anticorpos maternos que são transferidos da mãe para o sangue do bebé durante a gravidez. Esses anticorpos protegem contra muitas infeções víricas, mas desaparecem durante os primeiros seis meses da vida. Nessa idade, o bebé perde a imunidade que herdou da mãe, o que também coincide muitas vezes com o ingresso na creche onde vão estar mais expostos a infeções.

Nesta fase da vida, o normal pode ser ter entre oit e 12 infeções virais por ano numa criança saudável. Cada infeção pode demorar de sete a dez dias na fase aguda e até mais duas ou três semanas de recuperação, sendo infelizmente possível que as crianças desta idade passem o inverno “constantemente doentes” e só melhorem na primavera.

Não há cura nem tratamento específico para a maioria das infeções respiratórias virais. Os antibióticos não têm efeito contra viroses e não alteram o percurso dessas infeções. Não há maneira de evitar o contacto com todos os vírus, mas há alguns comportamentos que podem ajudar: evitar o contacto com pessoas doentes, lavar as mãos frequentemente, evitar tocar nos olhos, nariz ou boca.

Nós podemos também ajudar os outros ficando em casa quando estamos doentes e tapar o nariz e a boca quando espirramos ou tossimos.

De forma geral, manter uma dieta saudável, fazer exercício físico regular e mantermo-nos hidratados ajuda a minimizar o risco dessas infeções.

A maioria das infeções respiratórias não tem complicações, mas se houver sinais de alarme, tais como febre persistente, dificuldade respiratória ou alteração da cor dos lábios, se a criança recusa comer ou beber, se há prostração ou irritabilidade extrema, se há sonolência ou confusão, a criança deverá procurar observação médica.


O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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