Medina pede demissão de Alexandra Reis depois de pressão de Costa e Marcelo

A demissão partiu de Fernando Medina, horas depois de António Costa afirmar que iria avaliar os “passos seguintes” em conjunto com os dois ministros responsáveis pela tutela da TAP.

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Fernando Medina, ministro das Finanças Nuno Ferreira Santos

Era já quase meia-noite quando o comunicado do Ministério das Finanças caiu nas redacções para confirmar o que foi sendo antecipado durante esta terça-feira: Fernando Medina pediu à secretária de Estado do Tesouro, Alexandra Reis, que apresentasse a sua demissão. Alexandra Reis esteve no Governo menos de um mês.

A decisão chegou horas depois de terem sido conhecidas as respostas da TAP às perguntas do Governo e de se terem ido avolumando ao longo do dia as críticas em relação à indemnização atribuída pela TAP à secretária de Estado Alexandra Reis. Depois de quer o primeiro-ministro, quer o Presidente da República, terem aberto a porta a uma eventual saída da governante, que assumiu funções no início deste mês, o dia terminou com a demissão de Alexandra Reis, a pedido de Medina. Horas antes, o primeiro-ministro tinha avisado que seriam tomadas decisões depois de conversar com os dois ministros que tutelam a TAP, o ministro das Finanças e o ministro das Infra-estruturas e sinalizou que o processo deveria ser rápido. Assim foi.

"Solicitei hoje mesmo à eng.ª Alexandra Reis que apresentasse o seu pedido de demissão como secretária de Estado do Tesouro, o que foi por esta prontamente aceite", lê-se no comunicado assinado por Fernando Medina. "Tomei esta decisão no sentido de preservar a autoridade política do Ministério das Finanças num momento particularmente sensível na vida de milhões de portugueses", continua o ministro.

Segundo o tutelar da pasta das Finanças, na base da decisão está a prioridade de manter o Ministério como "um referencial de estabilidade, de autoridade e de confiança dos cidadãos". "São valores fundamentais à boa condução da política económica e financeira e à direcção do sector empresarial do Estado", escreve.

Na mesma nota, o ministro não deixa de agradecer e elogiar a secretária de Estado por ser "detentora de um curriculum profissional de enorme mérito e qualidade" e por "todo o trabalho desenvolvido", reconhecendo a Alexandra Reis "a integridade e correcção com que neste período pessoalmente difícil assegurou a defesa do interesse público".

A pressão de Marcelo e Costa

No domingo, Marcelo Rebelo de Sousa já tinha sugerido que seria "bonito" a governante prescindir da indemnização, mas esta terça-feira agravou o tom e falou em implicações. "Vamos esperar pelo esclarecimento para depois retirar as consequências”, afirmou o Presidente da República em declarações aos jornalistas. "Os senhores ministros estão à espera, o senhor primeiro-ministro está à espera, eu estou à espera e, sobretudo, os portugueses estão à espera porque em democracia é muito importante que os portugueses sejam esclarecidos", disse Marcelo Rebelo de Sousa.

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Em causa está uma indemnização de 500 mil euros que a secretária de Estado recebeu depois da sua saída da TAP em Fevereiro deste ano Mário Cruz

O chefe de Estado fez questão de dizer que também já tinha falado com o primeiro-ministro e que os dois estavam de acordo que era preciso aguardar por mais informações antes de ser tomada qualquer decisão. "Ambos dissemos um ao outro que estávamos todos à espera dos esclarecimentos", disse. A reacção do Governo ao esclarecimento enviado pela TAP chegou às redacções às 19h47, mas as decisões políticas não foram imediatas.

Em declarações aos jornalistas, o primeiro-ministro, António Costa, reiterou que continuava a aguardar um "cabal esclarecimento destes factos". E quando foi questionado sobre se mantinha a confiança política na governante, deixou os jornalistas sem resposta.

Durante a tarde, Costa já tinha garantido à Lusa que "desconhecia em absoluto os antecedentes” da recém-nomeada secretária de Estado do Tesouro, afirmando que tinha pedido esclarecimentos ao ministro das Finanças e ao ministro das Infra-estruturas, ambos responsáveis pela tutela da companhia aérea.

Ao final do dia, o primeiro-ministro sublinhou a rapidez com que os dois governantes reagiram ao esclarecimento da TAP, ao remeter a informação para a Inspecção-Geral de Finanças e a para Comissão de Mercado e Valores Mobiliários "para que haja um cabal apuramento, não só da legalidade, mas também do cumprimento pela TAP de todos os seus deveres de transparência e de correcção de informação ao mercado", sinalizou. "Falarei agora com os ministros e seguramente o Governo anunciará quais os passos seguintes", repetiu o primeiro-ministro, à saída do velório do gestor cultural António Mega Ferreira.

A resposta de Costa ao caso da indemnização de Alexandra Reis afastou-se daquela que é, normalmente, a sua reacção a polémicas no Governo. Durante os últimos anos, o primeiro-ministro procurou sempre "agarrar" os seus governantes aos cargos desempenhados, mas desta vez foi mais cauteloso na defesa da secretária de Estado em causa (e menos protector). Quando questionado sobre se mantinha a confiança política na governante, o primeiro-ministro disse apenas que, "quanto ao mais", aguardava "o esclarecimento cabal dos factos e da sua qualificação jurídica", abrindo a porta para uma eventual saída de Alexandra Reis deste Governo, como se viria a confirmar horas depois.

Críticas até no PS

A posição do primeiro-ministro reflectiu aquela que era também alguma pressão já dentro do PS e os sinais que foram dados por Belém em relação a este caso. Ao início da tarde, João Cravinho, antigo ministro do Equipamento entre 1996 e 1999 e antigo responsável pela tutela da TAP, afirmou que "mais do que a lei, que se aplique o bom senso político". Para o antigo governante socialista, casos como este aumentam a desconfiança nas instituições e na gestão feita pelos governos. "Tudo quanto suscite um certo alvoroço quando não há informação completa e decisão correspondente não representa um bom funcionamento do Estado", declarou João Cravinho, em resposta à TSF.

Antes disso, ainda na noite de segunda-feira, a deputada socialista e ex-ministra Alexandra Leitão já tinha defendido que era preciso avaliar as condições para a nomeação e continuidade em cargos públicos. Embora tenha ressalvado que falava "em geral" e não no caso concreto em discussão, a ex-governante insistiu que, "quando se está no cargo político, aquilo que o próprio e quem o nomeia tem de ponderar é se se mantêm condições objectivas para exercer o cargo com legitimidade, eficiência e eficácia". Para Alexandra Leitão, esse é "uma espécie de teste de algodão pelo qual todos os membros do Governo têm de passar".

Do lado da oposição, as críticas não foram mais leves. Para Luís Montenegro, líder do PSD, tanto o primeiro-ministro, como os ministros das Finanças e das Infra-estruturas e Habitação "são responsáveis e cúmplices em mais uma trapalhada". Por sua vez, o Livre aproveitou para criticar as diferenças salariais dentro do próprio Estado e na economia em geral "em que os cargos de topo das empresas são remunerados de forma totalmente desproporcional face aos restantes trabalhadores, concentrando riqueza e poder económico".

No Parlamento, o Bloco e o Chega pediram a audição não só da secretária de Estado, mas também do ministro das Finanças, Fernando Medina, do ministro das Infra-estruturas, Pedro Nuno Santos, e da CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener. Os requerimentos deverão ser votados na próxima semana.

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