Qual a história do Koh-i-Noor, diamante que a Índia não quer que Camila use na coroa?

Com o anúncio da coroação de Carlos e Camila, a Índia manifestou repulsa por o diamante Koh-i-Noor poder vir a integrar a coroa da futura rainha consorte.

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Ao contrário do que dita a tradição, o casal ainda não se mudou para Buckingham e não deverá fazê-lo antes de 2027 Reuters/POOL

Koh-i-Noor voltou à ordem do dia, na semana passada, após o Palácio de Buckingham ter anunciado que o rei Carlos III e a rainha consorte, Camila, serão coroados a 6 de Maio. Imediatamente, começaram as especulações sobre as coroas que ambos usarão, o que, no caso de Camila, acendeu uma velha polémica: entre as possibilidades está a coroa da falecida rainha-mãe, Isabel Bowes-Lyon, a última rainha consorte. A peça exibe um diamante de origem indiana.

O facto de Camila poder vir a usar o diamante em causa levou o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, a declarar, através de um porta-voz, que só a mera possibilidade “transportou alguns indianos aos dias do Império Britânico”. E, avaliou, em declarações ao The Telegraph: “A coroação de Camila e a utilização da jóia da coroa Koh-i-Noor traz de volta memórias dolorosas do passado colonial.”

Rakesh Sinha, um legislador do partido no Governo, contextualizou, em declarações ao The Washington Post, que o Koh-i-Noor simboliza a ligação “indesculpável” da monarquia britânica a um passado “bárbaro e explorador”, acrescentando que a jóia deve ser devolvida à Índia a título de recompensa — uma exigência que não é recente.

O responsável indiano conclui, por isso, que se Camila usar o Koh-i-Noor na sua coroa vai estar a “mostrar que o povo e o governo britânicos estão a carregar o legado do seu colonialismo”, pondo à vista “o saque e a exploração da Índia”.

Diamante de sangue

O Koh-i-Noor foi extraído de uma aluvião na Índia, sendo o primeiro registo escrito da sua existência datado de 1628, quando integrou o opulento trono do xá Jeã do Império Mogol, conta a revista Smithsonian, do instituto homónimo de Washington, D.C.. Era uma das maiores pedras preciosas usadas para a obra; a outra era o rubi Khiraj-i-Alam.

Até que, cem anos depois, o persa Nader Xá​ invadiu o reino mogol, roubando toda a riqueza (os metais e pedras preciosos eram tantos que é descrito que teve de usar milhares de animais para carregar a fortuna) e deixando um rasto de morte. O trono também foi levado, mas as duas grandes pedras foram retiradas para serem usadas numa braçadeira.

O diamante voltou para a Índia em 1813, permanecendo no poder do marajá Ranjit Singh que via na pedra um forte simbolismo de prestígio e poder (no livro Koh-i-Noor: The History of the World's Most Infamous Diamond, de 2017, William Dalrymple e Anita Anand traçam um paralelo com o anel de O Senhor dos Anéis, regista a Smithsonian), passando assim a ser cobiçada pelos britânicos. E, com a morte de Ranjit Singh, foram feitas diligências (mais uma vez, sangrentas) para capturar o Koh-i-Noor.

Acabariam por consegui-lo, poucos anos depois, tendo a gema integrado a Grande Exposição de Londres de 1851. No entanto, a sua lapidação de fraca qualidade escondia a beleza da pedra, o que desiludiu os visitantes do evento, levando o príncipe consorte Alberto a enviar a pedra para novo tratamento: o diamante passou a metade, mas brilhava mais do que nunca. E Vitória escolheu usá-lo num vibrante alfinete de peito.

Pedra das rainhas consortes

O seu papel fundamental viria, porém, a ser conquistado com a rainha consorte Alexandra, mulher de Eduardo VII, que o integrou na sua coroa. A mesma peça viria a ser usada pela rainha consorte Maria, avó de Isabel II, que abdicou da sua posse para a oferecer à mulher do segundo filho, quando o casal se viu forçado a assumir o trono após a abdicação de Eduardo VIII.

A coroa com o Koh-i-Noor não é usada desde 2002, mas o facto de ter sido associada a rainhas consortes fez com que tenha sido tratada como uma possibilidade para Camila. Mais ainda porque, ao contrário de Isabel II, que ao longo de sete décadas soube navegar à vista, correspondendo às exigências dos seus súbditos e não só, Carlos e Camila não se têm revelado tão sensíveis a determinados assuntos protocolares.

Por exemplo, ao contrário do que dita a tradição, o casal ainda não se mudou para Buckingham e não deverá fazê-lo antes de 2027 — ano em que se espera estarem concluídos os trabalhos de restauração orçados em 369 milhões de libras (mais de 428 milhões de euros). Uma notícia que, numa altura em que o mundo enfrenta uma crise, não favorece a popularidade do par.

Resta saber se o casal irá compreender que usar o diamante será reabrir uma velha ferida ou insistir que Camila, que passou anos à espera de ter um lugar na família real, exerça o direito em usar a coroa das rainhas consortes.

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