Alterações climáticas põem em risco bactérias em grutas da Noruega, alerta cientista portuguesa

As bactérias das grutas subárcticas da Noruega podem ser importantes para combater a resistência a antibióticos. Uma expedição liderada por Ana Sofia Reboleira aponta para o risco de estas bactérias desaparecerem.

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Investigadora à entrada de uma das seis caves estudadas no Norte da Noruega DR

As bactérias de grutas subárcticas podem ser capazes de originar bioprodutos para a indústria ou produtos que combatam a resistência a antibióticos. Mas, uma investigação liderada pela investigadora Ana Sofia Reboleira concluiu que estas bactérias correm o risco de desaparecer antes de serem estudadas devido às alterações climáticas.

“As grutas são um manancial de descobertas de bactérias novas para a ciência, com um papel preponderante na descoberta de novos bioprodutos para a indústria e de resistência a antibióticos”, diz a bióloga portuguesa, que liderou o estudo biológico numa expedição científica a grutas subárcticas no Norte da Noruega.

A investigação pretendia aumentar o conhecimento sobre a biodiversidade e dinâmica dos ecossistemas das grutas subárcticas, sobre as quais “até agora pouco se sabia” e, simultaneamente, avaliar “o impacto das alterações climáticas nestes ecossistemas”, explicou Ana Sofia Reboleira.

Durante dez dias, a equipa multidisciplinar de cientistas noruegueses, liderados pela portuguesa, recolheram amostras nas grutas das montanhas geladas dos Alpes escandinavos, que permitiram caracterizar as variáveis ambientais e as comunidades bacterianas e de invertebrados destas grutas.

Os resultados, agora publicados na revista científica Environmental Microbiome, mostram que as comunidades bacterianas das grutas subárcticas são mais diversificadas e complexas do que as comunidades bacterianas à superfície.

“Os microbiomas das grutas são menos variáveis entre grutas na mesma área, do que entre a superfície e as grutas”, explica a investigadora, considerando que isso demonstra que “o forte filtro ambiental nos ambientes cavernícolas molda de forma similar as comunidades de bactérias únicas que se desenvolvem nestes habitats extremos.”

O aumento da diversidade bacteriana dentro das grutas, comparado com a da superfície, “pode resultar de uma maior especialização de nicho ecológico e de níveis de interdependência relacionados com o ciclo dos nutrientes, vitais para o funcionamento da biodiversidade no nosso planeta”, acrescenta.

Clima pode trazer perda biológica

As regiões subárcticas localizam-se na região geográfica imediatamente a sul do Círculo Polar Árctico. São “ecossistemas particularmente vulneráveis às mudanças climáticas”, sublinha a bióloga aludindo ao clima caracterizado por Invernos muito frios e longos e Verões curtos que tornam estas zonas “muito sensíveis às alterações globais.”

As grutas onde se desenvolveu a expedição “são habitats extremos, com total ausência de luz, e com uma disponibilidade de alimento muito reduzida, constituindo factores limitantes para a vida que pode sobreviver exclusivamente nestes locais”, cujas comunidades que os habitam “são consideradas extremófilas.”

A natureza estável dos complexos microbiomas das grutas sugere que mudanças ambientais como o “acelerado degelo nestas zonas, resultante do aquecimento global, podem ter um impacto negativo nessas comunidades”, avisou a investigadora.

Segundo a investigadora, o papel preponderante que estas bactérias podem ter na descoberta de novos bioprodutos, particularmente no que respeita à resistência a antibióticos, “é relevante no contexto da vigilância epidemiológica das resistências aos agentes antimicrobianos.”

Face aos impactos das alterações climáticas, a investigadora alerta para o perigo de se poder “perder esta biodiversidade desconhecida antes de sabermos que serviços prestam.”

A investigação, financiada pela Villum Foundation da Dinamarca, está incluída no projecto “HiddenRisk” liderado por Ana Sofia Reboleira, do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais da Universidade de Lisboa, em colaboração com investigadores da Universidade de Bergen (na Noruega) e da Universidade de Copenhaga (na Dinamarca).

Ana Sofia Reboleira já liderou expedições científicas em todos os continentes, excepto na Antárctida. A investigadora descobriu e catalogou 70 novas espécies nos últimos anos de trabalho.

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