“As mulheres são o alvo mais vulnerável em qualquer guerra”

Há duas semanas, Oksana Zabuzhko deixou a Ucrânia levando consigo apenas uma mala. Esta terça-feira, a escritora discursou no Parlamento Europeu para falar dos que na Ucrânia combatem o projecto imperialista de Putin, que compara a Hitler, e do que pode fazer um ocidente unido para defender a liberdade.

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Oksana Zabuzhko discursando no Parlamento Europeu esta terça-feira, Dia Internacional da Mulher Cortesia: Parlamento Europeu

Em Dia Internacional da Mulher o Parlamento Europeu, presidido por uma, Roberta Metsola, optou por não falar em “celebração”, como seria habitual. A invasão russa da Ucrânia travou, naturalmente, qualquer intenção festiva e tornou urgente uma homenagem a todas as “mulheres corajosas e resistentes” que, no país, continuam a defender os valores europeus, disse a eurodeputada do Partido Nacionalista de Malta na sessão plenária em que a ucraniana Oksana Zabuzhko foi convidada a discursar.

Zabuzhko, escritora de ficção e ensaísta com uma obra por vezes provocadora, profundamente marcada pela defesa dos direitos da mulher e por questões de ordem nacionalista, tomou o convite como uma oportunidade para falar da guerra e denunciar aquele que classifica como o projecto imperialista do Presidente russo, traduzido numa ameaça à liberdade, à democracia, ao mundo.

Num discurso emocionado que não durou mais de dez minutos, esta autora ucraniana que deixou o seu país há duas semanas levando apenas uma mala na mão lembrou que está habituada a escrever sobre mulheres que são vítimas da violência ou do esquecimento, mas que nunca antes se sentira na obrigação de defender, em seu nome, o mais básico dos direitos – o da vida.

“As mulheres são o alvo mais vulnerável em qualquer guerra porque são elas que ficam para trás para tomar conta das crianças e dos mais velhos”, lembrou, depois de elogiar todas as que, na Ucrânia, continuam a lutar: “Não posso deixar de admirar as minhas companheiras, lutando ao lado dos nossos homens, gerindo a distribuição de mantimentos nas nossas cidades sitiadas e dando à luz em abrigos para se protegerem das bombas, supervisionadas por médicos online. Somos fortes e estamos gratas pelo vosso apoio, o problema é que as bombas de Putin não serão travadas pela força do nosso espírito.”

A força da Ucrânia, que surpreendeu muitos no ocidente, facto que Oksana Zabuzhko diz ter dificuldade em compreender já que o país sobreviveu ao genocídio decretado por Estaline em 1933, um genocídio que muitos países europeus teimam em não reconhecer, insistiu, poderá não chegar sem que haja uma posição firme da Europa e dos Estados Unidos: “Cada minuto de hesitação dos decisores políticos do ocidente (…), cada coffee break (…) custa a vida a alguém, muito provavelmente a um civil, muito provavelmente a uma mulher ou a uma criança.”

Depois de defender perante os eurodeputados e todos os outros que a ouviram que “o primeiro acto da actual tragédia” se deu em 2014, no Donbass, região do país desde então ocupada por milícias pró-russas, Zabuzhko lembrou que já nessa altura, durante um discurso, o Presidente da Federação Russa dissera abertamente que o exército de Moscovo iria disparar sobre o ucraniano, mesmo que a separá-los estivessem mulheres e crianças.

“Se os Estados Unidos e a União Europeia nos tivessem ouvido há oito anos saberiam que um novo Hitler estava pronto para começar onde o anterior tinha parado”, garantiu a autora de livros como Field Work in Ukrainian Sex e The Museum of Abandoned Secrets, comparando o Presidente Vladimir Putin ao líder da Alemanha nazi e defendendo que o chefe de Estado russo “só será travado por uma frente internacional que ainda acredite que a liberdade e a solidariedade valem mais do que o gás e o petróleo”. Um recado claro aos líderes europeus que, tendo de imediato unido esforços nas sanções económicas à Rússia, parecem agora menos convictos no sector da energia, dada a dependência de países como a Alemanha do gás russo.

“Não temos medo da Rússia”, concluiu Oksana Zabuzhko, evocando uma vez mais as mulheres que foram obrigadas a deixar para trás as suas casas bombardeadas e os homens que ficaram a combater para “libertar a Europa do espectro do totalitarismo": “Por favor”, pediu aos eurodeputados, “não tenham medo de proteger os céus por cima deles”.

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