Urgência em relação à vida e ao amor

Basta olharmos em redor para perceber como tantos dos nossos amigos já perderam a mulher/marido que tanto amavam, amigos que adoeceram ou viram adoecer o outro, para perceber que é agora ou nunca.

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"É muito difícil largar o sentimento de que os nossos pais nos devem ajuda" @designer.sandraf

Querida Ana,

Há filhos que se queixam de que os pais estão tão envolvidos um com o outro, tão cheios de “programas” que lhes sobra pouco tempo para ajudar com os netos.

Agora, que passei para o lado dos avós, parece-me uma óptima notícia. À medida que envelhecemos há, de facto, uma sensação de urgência em relação à vida e ao amor. Mesmo que os outros achem que já passaram a idade dessas aventuras e deviam estar em casa em volta do fogão, em lugar de ir celebrar o Dia dos Namorados.

Finalmente temos filhos felizes e independentes, os anos em que cuidamos dos nossos próprios pais (infelizmente) acabaram, libertámo-nos da ditadura do relógio de ponto, e torna-se claro como água que temos de aproveitar esta janela de oportunidade em que estamos os dois bem.

Basta olharmos em redor para perceber como tantos dos nossos amigos já perderam a mulher/marido que tanto amavam, amigos que adoeceram ou viram adoecer o outro, para perceber que é agora ou nunca.

Ana, os estudos sobre o segredo dos casamentos felizes sublinham que são os projectos em comum que alimentam e fazem reviver a relação. Quando um casal consegue inventá-los e realizá-los, aproxima-se, encontra novos pontos em comum, diverte-se e, por isso, quer replicar a experiência as vezes que for possível. Se calhar, tornam-se de novo um bocadinho adolescentes, centrados sobre si mesmos e, suspeito, que podem provocar alguns ciúmes nos próprios filhos que, surpreendidos, se sentem relegados para segundo plano.

Mas, na verdade, em lugar de fazerem birras, deviam era dar graças por ainda terem pais autónomos e independentes, com vida própria, resistindo a culpabilizá-los — porque se o fizerem estragam tudo.

Sendo assim, aqui fica o apelo aos pais que precisam de baby-sitter para a noite de S. Valentim: vão bater a outra porta!


Querida Mãe!

Hahaha sim, oiço frequentemente filhos a queixarem-se de que os pais não os ajudam, e sei que, provavelmente, eu própria caí nesse discurso de vitimização uma ou outra vez, mas pensando nisso sorrio por dentro porque reconheço a voz das crianças e adolescentes a que regressamos quando estamos perto dos nossos pais. É muito difícil largar o sentimento de que os nossos pais nos devem ajuda — seja de que tipo for.

A sua carta também me ajudou a perceber por que é que sinto um pequeno choque quando um dos meus pais diz que vai viajar com o meu padrasto/madrasta ou com os amigos — é uma reacção infantil do estilo “Como assim, e não me levam!?”. Escavando mais fundo, talvez seja mesmo um “Como assim? Já não vivem para mim?”. Decididamente vai muito para lá das questões práticas, dos avós “darem jeito” para ajudarem com os netos.

Dito isso, o meu lado adulto fica super, super entusiasmado ao ver casais de avós a viver a sua vida. Dá-me esperança!!! Dá-me energia pensar que tantos dos projectos que tenho, e que se enrolam nesta confusão do dia-a-dia dos miúdos, ainda podem ser concretizáveis. Sempre adorei ver aqueles casais de ingleses ou alemães mais velhos a sair de uma caravana na qual conhecem Portugal, ou me cruzo com um bando de amigas velhinhas que andam a conhecer uma cidade.

Sim! Vivemos para os filhos tantos e tantos anos (e que bom que isso é), mas que maravilha poder reclamar o direito ao próprio prazer, à vida!

Força avós deste país! Divirtam-se que nós que cá nos desenrascamos!


No Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. Mas, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam. Facebook e Instagram.

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