Algarve admite limitações no gozo de férias dos profissionais de saúde

Secretário de Estado responsável pela coordenação da covid no Algarve, Jorge Botelho, foi surpreendido pelo fecho de escolas e defende a necessidade de uma terceira dose das vacinas.

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"Esta pandemia afecta o turismo de uma forma brutal", diz Jorge Botelho Nuno Ferreira Santos

O secretário de Estado da Descentralização e da Administração Local e também coordenador do combate à covid-19 no Algarve, Jorge Botelho, critica a decisão da Administração Regional de Saúde de fechar escolas em cinco concelhos algarvios e defende o overbooking no agendamento de vacinação para compensar as faltas que têm aumentado. 

A variante Delta está a tornar-se predominante e temos assistido a aumentos diários de casos. Como está a situação no Algarve?
Está a crescer. Os números dizem-nos isso todos os dias. Não há como esconder. Tivemos altos, tivemos baixos, e agora têm vindo a aumentar. Temos hoje 254 casos no Algarve, ontem tivemos 180, é um aumento em relação a ontem e tudo o que seja aumentar é preocupante.

Quais são as causas?
Não há uma causa unívoca.

Mas são comportamentos de risco, é possível dizer que as pessoas não estão a ter cuidado?
Sim. Sabemos quais são as regras, usar máscara, distanciamento social, evitar espaços fechados, estar vacinado, mas também sabemos que as pessoas vacinadas podem ter a doença e passar a doença, não tendo aqueles sintomas mais graves. O que estamos a verificar é que se calhar há uma fadiga da pandemia e há comportamentos de risco das camadas mais jovens, não quer dizer que sejam os teenagers, ou as pessoas de 20 anos, são as pessoas que acham que o risco está mitigado ou controlado e depois um jantar, uma festa de família…

E tem havido muitas festas ilegais no Algarve, tem havido notícia disso.
Temos acompanhado as autoridades policiais. No Algarve, há a população que vem do sul de Espanha, de jovens que vêm em grupos passar o fim do ano lectivo e que de alguma forma assumem comportamentos de risco. Sabemos que nos nossos aldeamentos turísticos e na própria noite há uma determinada concentração de grupos na via pública e nos próprios apartamentos. Mas também sabemos que esta não é a causa única. Uma festa familiar, um casamento, um jantar de empresa, tudo isto [representa risco].

Há esta percepção de que estamos muito mais vacinados, mais protegidos, que os mais velhos já estão protegidos pela vacina e já não vão ter aquela mortalidade assustadora que estava a acontecer, de alguma forma achámos que isto estava mais calmo. Mas sabemos que mesmo vacinados temos de continuar a usar máscara, a manter a distância social, a mitigar os riscos. Esta é a questão essencial. Não quero pôr o enfoque nas autoridades nem nas pessoas. Há uma multiplicidade de questões.

Acha que é necessário para o Algarve uma medida como a que existe para Lisboa de limitar entradas e saídas na região?
Confesso que não sou partidário, não sou defensor desse tipo de medidas. Acho que isto é mais pela supervisão das autoridades, acho que não temos uma situação de descalabro na região, temos uma situação preocupante, mas não de descalabro.

Os focos principais são as cidades do centro. Amanhã [esta quinta-feira] o Conselho de Ministros vai avaliar, a incidência tem vindo a aumentar, mas este foco principal agora é na zona do centro, Albufeira, Loulé, Faro e um bocadinho Olhão. As pontas, digamos que a zona de Tavira, para o sotavento, e de Lagoa, para o barlavento, nesta fase estavam mais protegidas.

Então que medidas deverão ser tomadas no Conselho de Ministros?
A matriz de risco é conhecida e é um bom instrumento de monitorização. Não sou partidário de fechar, ou de cercos, principalmente numa região turística, mas a matriz deve ser aplicada enquanto existir e ela tem dado sinais aos senhores autarcas e a todas entidades públicas, e sabemos com funciona. A previsibilidade das regras é um bem em si para que ninguém seja surpreendido com as medidas que vão ser tomadas em relação aos pontos de liberdade para andar para a frente ou aos pontos de restrição para ficar ou recuar.

Os autarcas mostraram-se muito zangados por causa da decisão no domingo de fechar escolas em cinco municípios. Isso foi articulado com o Governo?
Não…

Apanhou de surpresa os autarcas e também apanhou de surpresa o Governo?
Apanhou de surpresa o coordenador regional. E apanhou de surpresa os autarcas e sabemos que foi uma decisão da saúde pública regional, que articulou seguramente com a saúde pública nacional – porque sabemos o grau de autonomia e independência que a DGS tem, e ainda bem. Por isso, a decisão foi proposta pela senhora delegada regional de saúde à senhora directora-geral que seguramente validou em função dos números e do reporte da senhora delegada regional. A informação que tenho e comprovo, pela reunião que tive com eles ontem, é que os autarcas envolvidos não souberam antecipadamente da medida, souberam ao fim da tarde de domingo bem como eu soube ao fim da tarde de domingo, por isso, digamos foi uma certa surpresa. Percebo perfeitamente o mal-estar e acho até que é justificado.

O fecho foi um exagero?
Não acho que foi um exagero. Acho é que temos de concertar tudo. Isso é que é forma de trabalhar. Nós reunimos éne vezes…

Então o que é que falhou?
Foi uma percepção… às vezes, nós estamos tão pressionados pelo trabalho que estamos a ter e a envolvência dos números são tão fortes que às vezes nos esquecemos de coisas que considero básicas como dar uma palavra, pôr ao corrente, envolver, não na decisão técnica mas na decisão do que é preciso fazer. E isso não foi feito antecipadamente. Percebo perfeitamente o mal-estar dos autarcas, que foi também o meu, que foi manifestado, da mesma forma que percebo a surpresa e o desconforto das famílias.

E do ministro da Educação…
E, por dever de ofício, também do senhor ministro da Educação porque foi uma decisão da autoridade regional de saúde e é importante que se sublinhe isso. Percebo o desconforto das famílias porque é domingo, dia de bola, domingo à tarde, e as aulas às oito da manhã no dia seguinte não [vão acontecer].

António Costa tinha dito que as escolas seriam sempre as primeiras a abrir e as últimas a fechar. Esta decisão da ARS Algarve não contradiz o primeiro-ministro?
Por isso, a reacção dos autarcas e a muita surpresa que houve com esta matéria. É uma decisão totalmente imputada à autonomia e independência da autoridade regional de saúde. Não sei quem consultou. Não consultou seguramente os políticos.

Quando as escolas foram fechadas naqueles cinco concelhos, havia 78 casos positivos entre as crianças, 52 turmas em isolamento, 1300 crianças em isolamento nos dois ciclos. Em todos os momentos, tem havido problemas, tem havido isolamentos profilácticos durante 14 dias, isto é o normal. Acontece em Lisboa, em muitos sítios. Hoje [quarta-feira] foi encerrada uma escola em Lagos. O que importa era manter o ciclo escolar. A delegada regional entendeu que a incidência naqueles cinco concelhos justificava esta medida. Apanhou toda a gente de surpresa. Ninguém no Algarve defende o fecho do Algarve.

Acha que as pessoas têm que aprender a viver com o vírus porque ele não se vai embora tão cedo?
Não tenho dúvidas que vão ter que viver com o vírus da mesma forma como vivemos com a gripe e com as outras doenças todas. Devemos defender-nos e vacinarmo-nos para conseguir fazer uma vida mais ou menos tranquila.

Em relação à vacinação, o Algarve apresenta uma reduzida taxa de população com vacinação completa (29%). A task force anunciou há três semanas que ia reforçar a vacinação no Algarve. Nada avançou? 
Temos tido alguns problemas com a vacinação e o atraso do Algarve não é por acaso. Nos centros de vacinação, estamos a vacinar menos do que a capacidade. Isso depende da organização do trabalho e das vacinas existentes. A organização do trabalho está a ser primordialmente da parte da manhã e estamos a ter muitas faltas à vacinação. Falámos com a task force, reforçámos o agendamento central. Neste momento, embora não estejamos na capacidade máxima, estamos a vacinar mais.

Os centros de vacinação têm os profissionais de saúde que são necessários. Temos é de ter um agendamento central superior, um overbooking para colmatar uma ou outra falha na vacinação porque há pessoas que estão a faltar à vacinação. A abertura para os maiores de 18 anos é uma boa notícia porque temos que aumentar as pessoas notificadas para serem vacinadas. Também temos muitos casos de pessoas que vão à primeira vacina e faltam à segunda ou porque acham que já estão bem ou porque pedem para reprogramar.

Os hospitais do Algarve têm capacidade para uma eventual subida no número de internamentos?
Nós temos sempre o plano de contingência do Verão no Algarve como é conhecido. Mas há uma realidade que é verdade, neste período crítico da covid o Algarve conseguiu sempre desmultiplicar-se e até apoiou Lisboa e o Alentejo. Porquê? Porque criaram soluções, sacrificaram férias, em nome da saúde pública e da comunidade. Foi um cenário de excepção e presto o devido tributo às pessoas, aos médicos, às administrações e a toda a gente que trabalhou para que isto fosse uma realidade.

Vai ser preciso sacrificar férias neste Verão também?
Hoje mesmo, a presidente do conselho de administração do centro hospitalar do Algarve disse-me que estavam a programar as coisas e a fazer tudo para tentar evitar prejudicar a actividade normal e já falava que se calhar os profissionais de saúde vão ter que sacrificar férias a que têm plenamente direito em função de uma resposta atempada para controlar a pandemia.

Isso pode ser feito sem ser em estado de emergência?
Neste momento, isso está na fase de gestão dos administradores hospitalares. Sim, desde que seja combinado com os profissionais e os profissionais entendam. Quero prestar aqui um tributo a esses profissionais que têm dado tudo para responder à comunidade. 

O plano de contingência deste Verão será maior ou diferente do de anos anteriores?
Não consigo responder. Isso é um assunto do Ministério da Saúde.

O hospital de campanha de Portimão é facilmente reactivável?
Sim, tanto mais que ainda lá tem umas botijas grandes de oxigénio que ainda não foram desactivadas. Mas obviamente não queremos chegar a esse ponto.

Houve idosos vacinados no Algarve que morreram recentemente com covid-19. Já se sabe qual foi a variante?
Não tenho essa informação.

E relativamente a uma terceira dose, a ministra da Saúde admitiu esta semana que os mais vulneráveis tivessem uma terceira toma. Isso vai acontecer?
Não há ainda uma decisão política, mas eu concordo. Seguramente, vai ser necessária.

Outra decisão de domingo passado foi a obrigação de quarentena para quem chegue do Reino Unido sem vacinação completa. Esta decisão do Governo veio piorar ainda mais a situação do Algarve?
Não tenho dúvida nenhuma que teve muitos efeitos. Estávamos a receber larguíssimos milhares de turistas ingleses e a partir de uma certa altura foi a debandada. 

Esta quinta-feira entra em vigor o certificado digital. Tem esperança neste instrumento para a recuperação do turismo algarvio?
Tenho esperança que seja uma ferramenta muito útil para a nossa vida em sociedade. Pode ter um efeito benéfico para as pessoas se vacinarem e se testarem. Precisamos de aumentar o nível de certeza sobre as pessoas com quem estamos. Não podemos coarctar as liberdades de uma forma drástica. Temos que ter ponderação entre aquilo que é a tranquilidade de saúde pública e a tranquilidade do uso das liberdades.

Conhece bem o Algarve. Como é que a região vai recuperar? Teremos um novo Algarve depois desta pandemia?
Esta pandemia afecta o turismo de uma forma brutal e a pressão dos políticos e da região como um todo é agir sobre a base económica da região, tentando encontrar outras soluções para dar emprego às pessoas. A sustentabilidade de uma sociedade só se consegue com emprego.

O desemprego no Algarve está a subir muito.
Sim e por isso é essencial que a base económica da região possa ser diversificada mas também não podemos deitar fora o que fizemos em termos de turismo.

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