Estudo revela novos dados sobre a história genética das ilhas do Mediterrâneo

A investigação envolve cientistas de universidades da Áustria, dos EUA e Itália e é liderada por um investigador português.

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Molécula de ADN Pixabay

Um estudo internacional, que envolve mais de 50 investigadores, apresenta “novas descobertas sobre a história genética das ilhas do Mediterrâneo”, anunciou esta segunda-feira em comunicado a Universidade de Coimbra.

Publicada esta segunda-feira na revista Nature Ecology & Evolution, a investigação mostra que as migrações marítimas a norte de África “começaram muito antes da era das civilizações marítimas do Mediterrâneo oriental” e, além disso, “ocorriam em várias partes do Mediterrâneo”, refere o comunicado.

“O mar Mediterrâneo tem sido uma rota importante para migrações marítimas, além de palco de frequentes trocas comerciais e invasões durante a pré-história”. Ainda assim, “a história genética das ilhas do Mediterrâneo não está bem documentada, apesar dos recentes desenvolvimentos no estudo de ADN antigo”.

A investigação envolve cientistas das universidades de Viena (Áustria), de Harvard (EUA) e de Florença (Itália) e “preenche as lacunas existentes com o maior estudo até hoje da história genética de populações antigas da Sicília, Sardenha e ilhas Baleares, aumentando a análise do número de indivíduos de cinco para 66”, destaca-se.

Daniel Fernandes, do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra e membro do Departamento de Antropologia Evolutiva da Universidade de Viena (Áustria), é o principal autor deste estudo internacional.

Os resultados revelam um padrão complexo de imigração da África, Ásia e Europa, variando em trajecto e época. “Por exemplo, vimos que a expansão comercial da civilização micénica em direcção ao oeste durante o Bronze Médio incluiu também eventos de imigração para a Sicília”, refere Daniel Fernandes.

O cientista relata ainda que foram identificados “movimentos de indivíduos provavelmente originários da Península Ibérica para a Sicília”, acrescentando que estes movimentos “podem ter influenciado a colonização das ilhas Baleares, visto que o indivíduo mais antigo identificado na ilha de Maiorca possuía grandes quantidades desta ancestralidade”.

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Daniel Fernandes DR

No caso da Sardenha a história é diferente: “Apesar dos intensos contactos comerciais com outros povos durante o Calcolítico (ou idade do Cobre) e a idade do Bronze, não detectámos nenhuma influência genética externa significativa”, nota Daniel Fernandes. A excepção foi “um indivíduo do Calcolítico com ancestralidades ligadas ao Norte de África, demonstrando claramente que existiram migrações marítimas pré-históricas através do mar Mediterrâneo do Norte de África para locais no Sul da Europa, afectando mais de 1% dos indivíduos descritos na literatura ancestral de ADN dessa região até hoje”.

Outra conclusão relevante do estudo é o facto de, apesar da presença de diferentes grupos a partir da idade do Ferro, “os habitantes modernos da Sardenha mantiveram entre 56% a 62% de ascendência dos primeiros agricultores neolíticos que chegaram à Europa há cerca de oito mil anos”, sendo esta “a percentagem mais elevada de ancestralidade neolítica identificada em qualquer população europeia”.

Para David Reich, co-autor sénior da Universidade de Harvard e investigador no Instituto Broad do MIT, “uma das descobertas mais impressionantes foi sobre a chegada de ascendentes das estepes do Norte dos mares Negro e Cáspio a algumas ilhas do Mediterrâneo”.

Embora a origem definitiva dessa ascendência tenha sido a Europa oriental, “nas ilhas do Mediterrâneo a mesma chegou pelo menos a parte do oeste, principalmente da Península Ibérica”, realça David Reich. 

Segundo o investigador português, as conclusões deste estudo ajudam “a entender e enquadrar os movimentos de indivíduos no Mediterrâneo ocidental durante períodos de alta intensidade comercial, como foram as idades do Bronze e Ferro”.

Daniel Fernandes destaca que o artigo agora publicado “abre caminho para futuros estudos se debruçarem em ainda maior detalhe nos movimentos dos períodos como as expansões gregas, fenícias e mesmo romanas”.

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