Por que é que vai haver eleições antecipadas em Israel?

Será este o primeiro de um acontecimento sem precedentes na História do país?

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Avigdor Lieberman não cedeu nas suas reivindicações AMIR COHEN/Reuters

Benjamin Netanyahu preferiu novas eleições a deixar correr o processo normal de negociações de coligação, provocando um acontecimento inédito na História de Israel.

O que levou à realização de novas eleições em Israel?

A última eleição terminou com uma maioria para um bloco de direita que podia ser chefiado pelo primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu. Mas este não conseguiu chegar a acordo para uma coligação de Governo com esses partidos, que tinham interesses contraditórios, e propôs a dissolução do Knesset (Parlamento) e novas eleições.

Foi um procedimento normal?

Não. Na verdade, é a primeira vez que acontece na História do Estado de Israel, que acabou de cumprir 71 anos. O previsto é que o Presidente, depois de consultas, encarregue o político com mais hipóteses de de ter uma maioria de formar uma coligação de governo. Mas há um prazo, findo o qual, e se não conseguir, o segundo político com mais hipóteses tem a sua oportunidade. Já aconteceu o político chamado em primeiro lugar tentar e não conseguir - Tzipi Livni, do centrista Kadima, depois de “herdar” o Governo após a demissão do primeiro-ministro Ehud Olmert, suspeito de corrupção. Nessa altura, o segundo na lista teve sucesso: era Netanyahu, que não sai do poder desde essa altura (2009). Percebe-se que desta vez Netanyahu não queira arriscar que o Presidente, Reuven Rivlin, dê essa possibilidade ao seu rival, Benny Gantz. Embora não seja claro de que modo este conseguiria uma coligação; uma das hipóteses seria tentar “partir” o Likud, de Netanyahu.

Porque é que Netanyahu não conseguiu formar Governo?

O principal motivo foi um braço de ferro com o seu antigo aliado Avigdor Lieberman, líder de um partido de judeus russófonos. A razão concreta foi a exigência de Lieberman em que se acabe com a excepção concedida aos religiosos que podem não fazer o serviço militar obrigatório se estiverem a fazer estudos religiosos. O Judaísmo Unido da Torah, outro partido que faria parte da coligação de Netanyahu, tem como linha vermelha exigir a qualquer governo em que participe a continuação desta excepção. Netanyahu precisava de ambos para ter uma maioria.

Não havia possibilidade de compromisso?

Alguns analistas políticos dizem que podia haver, mas que Lieberman escolheu ser inflexível. O instinto político de Lieberman é elogiado por aliados e rivais, e há quem diga que o ex-aliado de Netanyahu decidiu enfrentá-lo agora porque pressente que a magia do chefe de Governo pode estar a acabar.

O que leva Lieberman a acreditar que Netanyahu está mesmo em risco de cair, se há anos que contraria previsões deste género?

Netanyahu tem uma acusação pendente por três crimes de corrupção, com o processo num estado avançado e já só falta mesmo a acusação formal, que está pendente apenas de o primeiro-ministro ser ouvido, como anunciou há meses o procurador. As provas apresentadas pela polícia em três dos casos parecem suficientemente convincentes para esta apreciação do procurador, o que deixa um cenário pouco favorável a Netanyahu. Aliás, este antecipou as eleições aproveitando uma crise política aberta por outro pretendente ao trono da direita caso este seja deixado livre pelo “rei Bibi”, no que foi visto como uma manobra para ultrapassar as acusações.

De que modo?

Primeiro, dificultando a acusação – o procurador anunciou a acusação quando Netanyahu era um primeiro-ministro em fim de mandato, agora teria de acusar um chefe de Governo recém-eleito. Segundo, os seus aliados já propuseram algumas alterações legislativas que impossibilitariam uma acusação ao primeiro-ministro e a políticos em exercício de funções.

O que vai acontecer a seguir?

São águas políticas nunca navegadas. Netanyahu passará, no Verão, a marca do primeiro-ministro há mais tempo no poder em Israel. E pode, entretanto, ser o primeiro chefe de Governo em funções a ser acusado de corrupção (o anterior, Ehud Olmert, saiu do cargo antes de ser acusado). Isso abriria um período de enorme incerteza, porque na lei não há nada que obrigue o chefe de Governo a demitir-se mesmo que seja acusado, e Netanyahu já disse que não o fará.

Mas há precedentes de demissões?

Sim, um Presidente e um primeiro-ministro já se demitiram antes de acusações quase certas (o ex-Presidente Moshe Katsav acabou por ser condenado por violação e Ehud Olmert por corrupção). Se houver acusação a Netanyahu, tudo dependerá da reacção dos aliados políticos: mais uma razão para Netanyahu não pôr a hipótese de se juntar a Gantz.

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