Governo já tem lei para tirar atribuição de slots nos aeroportos à ANA

Bruxelas quer que Tribunal de Justiça da UE multe Portugal por falta de “independência funcional e financeira” do coordenador das faixas horárias.

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Até que a nova entidade tenha verbas suficientes para estar operacional a ANA continuará com a atribuição das slots Rui Gaudêncio

No mesmo dia em que Bruxelas anunciou ter requerido ao Tribunal de Justiça da UE para aplicar uma multa a Portugal por incumprimento ligado à atribuição das faixas horárias nos aeroportos (conhecidas como slots) após vários alertas, o Governo aprovou uma lei que deverá resolver o problema. Isto porque vem garantir a criação de uma nova entidade com essa função, dando-lhe a necessária independência funcional e financeira.

O primeiro alerta surgiu em 2013, quando a Comissão Europeia alertou que o coordenador que gere a atribuição de slots não era "financeiramente independente da ANA”, algo que podia “prejudicar a concorrência leal”. Ou seja, a entidade que decide a atribuição de espaços para aterragens e descolagens (e sem os quais as transportadoras não conseguem operar) não podia estar na órbita da concessionária dos aeroportos, detida pelos franceses da Vinci desde o final de 2012. Depois, houve uma decisão do tribunal, em 2016, que impunha mudanças.

Agora, passados dois anos, e porque “as autoridades portuguesas não adoptaram as medidas necessárias para garantir o estatuto de independência do coordenador”, a Comissão Europeia pediu esta quinta-feira ao tribunal que aplique uma sanção pecuniária de 1,85 milhões de euros pelo incumprimento.

A este valor poderá acrescer uma multa diária de 7452 euros “se o Estado-Membro não executar o acórdão na sua integralidade até à data em que o tribunal emitir o seu segundo acórdão”, sendo que é o tribunal quem decide o valor final das multas a aplicar.

No que sugere ser uma coincidência de datas, até porque o diploma já estava pronto no início do Verão, o Conselho de Ministros (CM) desta quinta-feira aprovou a revisão do modelo de gestão “da prestação dos serviços de atribuição de faixas horárias e de horários facilitados nos aeroportos nacionais”.

Segundo o CM, a legislação aprovada “vem assegurar a independência das actividades de facilitadora e de coordenação da atribuição de faixas horárias, nos termos impostos pela legislação europeia, através de uma nova entidade sem fins lucrativos”.

De acordo com a versão do diploma a que o PÚBLICO teve acesso, as partes interessadas podem associar-se para dar corpo a este novo organismo, que vai exercer as suas funções “em regime de concessão de serviço público”, sendo que a maior representatividade do sector em causa, no caso de mais do que uma proposta, funcionará como critério para a escolha. A missão é gerir a coordenação das slots nos aeroportos mais congestionados, como é o caso de Lisboa, Porto, Faro e Funchal, e facilitando a gestão nos restantes (como Beja ou Ponta Delgada).

A nova entidade coordenadora terá um “financiamento autónomo, com receitas próprias decorrentes da taxa cobrada pelos serviços de atribuição de faixas horárias aos operadores aéreos que utilizam os aeroportos e às respectivas entidades gestoras aeroportuárias”.

Depois, além da questão financeira, fica sublinhado que deve “actuar de forma independente” e que não pode “solicitar nem receber instruções do Governo ou de quaisquer entidades públicas ou privadas”.

Já a supervisão permanece nas mãos do regulador do sector, a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC), ao qual o gestor do novo organismo responderá directamente. É também a ANAC quem define o valor das taxas, após proposta da referida entidade coordenadora.

Nos estatutos da futura entidade coordenadora, diz a lei, deve prever-se que a composição dos seus órgãos sociais “assegure a representação efectiva de todas as suas associadas” de modo a que nenhuma delas possa ter o controlo. Esta deve integrar “os operadores aéreos responsáveis por, pelo menos, 25% do volume de tráfego total dos aeroportos coordenados” e “as entidades gestoras aeroportuárias dos aeroportos que represente, pelo menos, 30% do volume de tráfego total”.

De acordo com a versão do diploma em questão, até que esta nova entidade tenha verbas suficientes para estar operacional (o montante será cobrado mensalmente) a ANA continuará com a atribuição das slots. Depois, e para “evitar a interrupção nos serviços”, a ANA “deve prestar a cooperação necessária com vista à implementação e à prossecução daquele serviço pela entidade coordenadora, incluindo a possibilidade de transmissão de meios técnicos, humanos e financeiros, nos termos a acordar”.

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