E nem sequer são espanhóis!

A qualidade geral está muito acima da média, e mesmo da média que encontramos, por vezes, em feiras semelhantes noutros países.

Quinta-feira ao cair da noite, na Cordoaria, o tom das conversas de artistas e galeristas era de optimismo generalizado. Salas cheias e uma feira que todos consideravam ser a melhor das três edições que a ARCOlisboa já leva faziam prever bons resultados, que contudo terão ainda que esperar pela segunda-feira, já depois das portas fechadas, para se concretizarem. Um exemplo entre muitos será o de Miguel Leal Rios, que mostra na secção Opening uma selecção de obras da recentíssima galeria Uma Lulik, que abriu há pouco tempo, e que nos dizia que já tinha vendido tudo. No dia seguinte, teria que renovar completamente a montagem.

Miguel Rios acrescentava ainda que os compradores nem sequer teriam sido portugueses. Sem dizer nomes, como é habitual, falou de um crítico de arte norte-americano e de um coleccionador canadiano. Estava surpreendido com o cosmopolitismo dos convidados da feira, os únicos que a puderam visitar no dia 16. Um pouco depois, um artista também confessava a sua surpresa, não tanto pelo número de presenças estrangeiras, mas por haver tanta gente de fora da península. Nem sequer são espanhóis, acrescentava.

A ARCOlisboa parece estar assim a internacionalizar-se. Os critérios apertados e exigentes de admissão das galerias têm como consequência uma aposta forte na qualidade dos programas de exposições e nos esforços de internacionalização dos participantes. A qualidade geral está muito acima da média, e mesmo da média que encontramos, por vezes, em feiras semelhantes noutros países. Percebe-se que, num meio exíguo como o português o é, a solução para a visibilidade dos artistas reside na internacionalização. E que os grandes coleccionadores estrangeiros só virão se houver qualidade. Ou os portugueses: a Câmara Municipal de Lisboa dá o exemplo, apresentando no Torreão Nascente o conjunto de obras que adquiriu na feira de 2017. Excelente seria que os museus portugueses lhe seguissem o exemplo.

Olhemos por isso para o que a feira tem para mostrar. É difícil escolher entre tantas obras e projectos interessantes. Mas podemos começar pelas galerias mais jovens, justamente na secção Opening, e além da já mencionada Uma Lulik destacar a presença das lisboetas Madragoa (que é também italiana), com uma excelente escultura de Belén Uriel, da Francisco Fino, com um vídeo de Mariana Silva também muito interessante. Nas estrangeiras, refira-se a BWA Warszawa, que acaba de ganhar o prémio Opening da ARCOlisboa (o júri referiu uma apresentação “generosa, única e subtil”), bem como a alemã House of Egorn, que trouxe uma instalação originalíssima de Vanessa da Silva. Ainda, nos projectos individuais, de salientar a peça de Mónica de Miranda feita com a galeria Carlos Carvalho.

Regressemos ao grande corredor central. Algumas peças destacam-se imediatamente na visita, tal como o cubo em metal espelhado de José Pedro Croft, na Vera Cortês, uma reintrepretação da obra quase idêntica feita por Richard Serra, One ton prop, em 1969. Há peças de Croft noutras galerias, já que a maior parte dos artistas com carreiras bem implantadas trabalha com várias instituições deste tipo. Com Julião Sarmento passa-se o mesmo: tem peças na Cristina Guerra, a sua galeria em Portugal, mas também um soberbo painel, The colour of stars, na italiana Giorgio Persano. Cabrita Reis, João Louro, Angela de la Cruz, com esculturas de alumínio pintadas a óleo, e mesmo Biberstein, que esta sexta-feira inaugura uma importante retrospectiva na Culturgest, seguem também este modelo.

Outras obras que se salientam são as de Fernanda Fragateiro, na Baginski, Adriano Costa, na Nuno Centeno, e uma grande pintura-colagem de Yonamine, na Cristina Guerra. Esta galerista traz também pela primeira vez obras de João Maria Gusmão e Pedro Paiva, que passam a integrar o grupo dos seus artistas. A Monitor, uma das galerias internacionais que recentemente abriram um espaço em Lisboa, volta a expor Sérgio Carronha, um jovem português que se apropria de técnicas ancestrais na sua escultura. Há também muita fotografia: Rui Calçada Bastos (obras excelentes na Bruno Múrias), Veronika Kellendorfer, na norte-americana Christopher Grimes, Per Barclay também na Giorgio Persano, Nozolino e o seu romantismo sombrio na Quadrado Azul.

Há um magnífico Pedro Calapez na Fernando Santos, e também uma excelente selecção de peças de Francisco Tropa na Quadrado Azul. Ana Santos e Claire de Santa Coloma, esta vencedora do último prémio EDP Novos Artistas, são duas jovens que estão representadas, respectivamente, nas galerias 3 + 1 e Quadrado Azul. Os franceses Pietro Sparta têm um poderoso desenho de Gilberto Zorio. E não falta também uma selecção de galerias focadas no modernismo, com preços a condizer, como também é habitual no ARCOmadrid.

Duas últimas menções: uma instalação surpreendente e forte do franco-malgache Joël Andrianomearisoa, feita de livros de papel de seda negro que ondulam à menor brisa no stand da galeria Sabrina Amrani. A peça, que ganhou em Madrid o prémio Audemar Piguet, possui uma outra declinação numa individual na Fundação Leal Rios inaugurada esta quinta-feira à noite. E finalmente a secção de livros, revistas e múltiplos, com uma excelente escolha de editoras  agrupadas sob o título genérico de As tables are shelves.

 

Texto corrigido no dia 22 de Maio: Francisco Tropa estava na Quadrado Azul e não na galeria Fernando Santos

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