O direito ao repouso do trabalhador

Muitos empregadores exigem a disponibilidade permanente dos trabalhadores fora do seu horário de trabalho. Este comportamento infraccional provoca sérios danos na saúde física e psíquica dos trabalhadores e dos seus familiares.

Há normas nacionais e internacionais que protegem o direito ao repouso dos trabalhadores. Segundo a Constituição, compete ao Estado assegurar a todos os trabalhadores as condições de trabalho “de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar”, bem como o direito ao repouso.

Por sua vez, o Código do Trabalho impõe os limites máximos de oito horas por dia e 40 por semana, garantindo o descanso mínimo de 11 horas seguidas entre dois períodos de trabalho consecutivos, excepto em situações especiais, nomeadamente, nas empresas de segurança, vigilância e comunicações, nos hospitais, portos e aeroportos, bombeiros e protecção civil.

De resto, o chamado teletrabalho (trabalho prestado através de recursos a tecnologias de informação e comunicação) só é legítimo se for celebrado um contrato, designadamente, com a determinação do período de trabalho, da correspondente retribuição e da propriedade dos instrumentos de trabalho e salvaguarda da privacidade e repouso do trabalho e da sua família.

A nível internacional, convenções da Organização Internacional do Trabalho (já a n.º 1, de 1919, fixava o limite de oito horas de trabalho diário), a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 e a Carta Social Europeia de 1961 prescrevem a duração razoável do trabalho e o direito ao repouso.

Assim sendo, é evidente que os trabalhadores não podem ser obrigados a manter ligado o telemóvel ou o e-mail fora do período do trabalho, salvo os referidos casos excepcionais ou de força maior. Porém, ao arrepio dos sobreditos normativos, muitos empregadores exigem a disponibilidade permanente dos trabalhadores fora do seu horário de trabalho. Estes abusos afectam, particularmente, os trabalhadores precários que se encontram numa situação de insegurança e têm medo de perder o emprego. São os casos dos contratos a termo, de trabalho temporário, de (falsos) contratos de prestação de serviço ou de estágio que ultrapassam um milhão, sem contar com o trabalho informal. Este comportamento infraccional provoca sérios danos na saúde física e psíquica dos trabalhadores e dos seus familiares.

Por isso, o Governo não pode relegar esta questão para a Concertação Social ou para a contratação colectiva, que, no sector privado, abrange um número reduzido de trabalhadores. Antes de mais, deve ser combatida a precariedade laboral que é uma das causas de degradação das relações laborais, limitando as condições e os prazos dos contratos precários. Simultaneamente, deve ser reforçada a intervenção da Autoridade para as Condições do Trabalho e facilitado o acesso ao tribunal, designadamente, através de um processo urgente que tutele a privacidade do trabalhador. Por outro lado, devem ser criminalizadas as violações reiteradas do direito ao repouso, puníveis com coimas miserabilistas.

Efectivamente, estão em causa a saúde e a dignidade dos trabalhadores, garantidas pelo direito nacional e internacional do trabalho. Advogado especialista em Direito do Trabalho 

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