Jogos Olímpicos: um evento que dá (quase) sempre prejuízo

Faz sentido para um país, em termos económicos, organizar uma grande competição desportiva? Os especialistas dizem: nem pensar.

As obras para uns Jogos Olímpicos fazem a factura subir muito para quem os organiza
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As obras para uns Jogos Olímpicos fazem a factura subir muito para quem os organiza RICARDO MORAES/Reuters
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Ensaio para a cerimónia de abertura YASUYOSHI CHIBA/AFP

Em toda a história dos Jogos Olímpicos da era moderna, só por uma vez os Jogos deram lucro. Os Jogos de Los Angeles 1984, aqueles em que Carlos Lopes conquistou para Portugal o primeiro ouro olímpico, renderam à organização local cerca de 200 milhões de dólares. Há uma explicação para isto. A cidade californiana foi a única que se candidatou, apresentou uma proposta em que praticamente não tinha de construir nada de novo, e tinha já montada uma grande máquina comercial e vocacionada para o entretenimento. Se tivesse havido mais candidatos, o Comité Olímpico Internacional (COI) provavelmente teria escolhido os que prometessem gastar mais dinheiro.

Los Angeles é uma das quatro candidatas aos Jogos de 2024 e é bem provável que volte a ganhar (pela terceira vez, caso ganhe na votação final em Setembro de 2017), face à concorrência de três propostas europeias (Roma, Paris e Budapeste), tendo em conta a situação precária das economias do Velho Continente, e com os mesmos argumentos de 1984, infra-estruturas menos dispendiosas e máquina comercial no lugar. Mas o que os Jogos Olímpicos já não irão perder são o seu gigantismo, com tudo o que está associado: muita gente, muitas estruturas necessárias e muito dinheiro envolvido.

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Os primeiros Jogos da Era Moderna, Atenas 1896, tiveram 214 atletas de 14 nações a competir em 43 eventos de nove modalidades diferentes. Os Jogos da XXXI Olimpíada terão 11.000 atletas a representar 206 países a disputar 306 eventos de 28 modalidades. Em Atenas 1896, por exemplo, os nadadores eram lançados nas águas do Porto de Zea, no Rio de Janeiro construiu-se uma piscina de raiz, uma de várias obras que são feitas de propósito de quatro em quatro anos (no Verão e no Inverno) para receber o mundo desportivo durante pouco mais de duas semanas.

Os custos de organizar os Jogos Olímpicos começam logo no processo de submissão de uma candidatura. Tóquio, por exemplo, gastou 150 milhões para uma candidatura falhada aos Jogos de 2016, aproveitando muito desse investimento inicial para ser a sede do evento em 2020. Para quem queira ser considerado pelo Comité Olímpico Internacional (COI), terá de desembolsar algures entre os 50 e os 100 milhões de dólares. É o que cada uma das quatro candidaturas para 2024 já pagou.

Segundo escreve o economista Andrew Zimbalist no livro Circus Maximus: The Economic Gamble Behind Hosting the Olympics and the World Cup, todos os Jogos Olímpicos depois de 1960 ultrapassaram os custos previstos e houve uma edição, em particular, que teve uma derrapagem estrondosa em relação ao que estava orçamento. Os Jogos na cidade canadiana de Montreal em 1976 estavam orçamentados nuns irrisórios 124 milhões de dólares e acabaram por custar 2800 milhões – as dívidas resultantes levaram cerca de 30 anos a pagar.

Segundo os dados apresentados por Zimbalist, só os Jogos de Inverno de 2002 em Salt Lake City (de 2400 milhões de dólares para 2500 milhões). Todos os outros, especialmente três, ultrapassaram largamente o previsto. Atenas 2004 custou cinco vezes mais (três mil milhões previsto, 16 mil milhões gastos), Pequim 2008 (20/45) e os Jogos de Inverno de 2014 em Sochi (10,3/51), estes os mais caros de toda a história dos Jogos Olímpicos, basicamente porque a Rússia pagou para converter uma estância para férias de Verão num centro de desportos de Inverno. Os do Rio também não irão fugir à regra, estando previsto um desvio de seis mil milhões a um custo previsto de 16, o que não deixa de ser significativo numa país que está a atravessar a sua maior crise de sempre.

Se os custos imediatos são óbvios para uma cidade olímpica, mais difícil é de avaliar o legado que o evento deixa. Muitas vezes as infra-estruturas erguidas deixam de ser usadas e, com os anos, transformam-se em ruínas - Atenas e o seu parque olímpico decrépito é um bom exemplo e Sochi vai pelo mesmo caminho. Também se argumenta com o aumento de emprego e um choque positivo na economia, mas estes efeitos são temporários e o emprego criado na construção civil em cidades olímpicas vai, sobretudo, para pessoas que já têm emprego, não para os desempregados.

E, depois, há a questão das receitas. As grandes confederações desportivas internacionais arrecadam a maior parte das receitas provenientes de várias fontes (transmissões televisivas, patrocinadores nacionais e internacionais, venda de bilhetes e licenciamento de produtos). No caso dos Jogos, o COI fica com mais de 70% das receitas provenientes das transmissões televisivas.

Há quem apresente várias soluções criativas para diminuir a “pegada” nos Jogos nas cidades que os organizam. Há quem sugira que deixe de ser apenas uma cidade de um país a receber o evento, mas várias a partilhar os custos e os benefícios. Ou, como Andrew Zimbalist defende, de se organizar os Jogos sempre na mesma cidade de quatro em quatro anos. 

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