Bruxelas propõe redução temporária da produção de leite

Agricultores manifestaram-se em Matosinhos contra a quebra dos preços pagos à produção de leite e carne de porco. Capoulas Santos lamenta adiamento sobre ajudas ao controlo da produção.

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Os produtores de leite manifestaram-se em Matosinhos nesta segunda-feira Nelson Garrido

Capoulas Santos lamenta adiamento sobre ajudas ao controlo da produção de leite

Agricultores manifestaram-se em Matosinhos contra a crise no leite e carne de porco. Bruxelas propõe pacote de medidas de apoio

A resposta da Comissão Europeia à crise do sector leiteiro e da carne de porco passa por uma redução temporária da produção, através de acordos voluntários, e por um reforço dos apoios ao armazenamento, indo ao encontro da posição francesa.

Foi com o compromisso de accionar um “pacote adicional” para apoiar os agricultores, dentro das regras previstas na política agrícola comum, que o comissário europeu Phil Hogan se apresentou nesta segunda-feira em Bruxelas perante os ministros da Agricultura dos 28 países europeus. Mas se houve consenso em relação a este objectivo, ficou para mais tarde uma decisão sobre a fonte do financiamento das ajudas, que dividiu os Governos.

No final do encontro, o ministro da Agricultura português, Luís Capoulas Santos, lamentou que a decisão sobre o financiamento tenha sido remetida “para um momento posterior”. O que ficou acordado foi a possibilidade de os Estrados-membros “poderem adoptar medidas nacionais para alcançarem este objectivo” de reduzir temporariamente a produção, afirmou o ministro, citado pela Lusa.

Uma das medidas propostas pela Comissão Europeia passa por duplicar o tecto da ajuda ao armazenamento de leite em pó magro (para 218 mil toneladas) e da manteiga (para 100 mil toneladas).

Os agricultores portugueses, que na manhã desta segunda-feira se manifestaram em Matosinhos, defendem uma solução duradoura que responda à quebra dos preços do leite. Com o aumento da oferta no mercado europeu, o sector assistiu a uma descida dos preços pagos à produção num momento em que, dizem, estão a ser esmagados com o fim das quotas na União Europeia e o embargo russo aos produtos comunitários. Isto ao mesmo tempo em que mercados como a China e países produtores de petróleo diminuíram as encomendas.

A crise afecta também os produtores de carne de porco, em relação aos quais Bruxelas quer igualmente criar um regime de ajuda ao armazenamento de carne.

Já antecipando a resposta da Comissão Europeia, João Diniz, membro da direcção da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) dizia ao PÚBLICO ser evidente que “os produtores, estando numa posição de ruína e de desespero, se receberem alguma coisa para deixarem de produzir, aceitam”. Mas sublinhava que do ponto de vista estratégico esse não deve ser o caminho.

Para o responsável da CNA, Portugal deve defender a “reposição de um sistema público de controlo da produção e do mercado – as antigas quotas leiteiras faziam isso e eram um instrumento público que garantia o direito a produzir a cada país”.

O responsável aponta o dedo à ex-ministra da Agricultura Assunção Cristas, recém-eleita presidente do CDS-PP, que diz ter “responsabilidade principal” na crise do sector, mas vinca que agora cabe a Capoulas Santos “defender o interesse nacional estratégico”, propondo quotas leiteiras (que deixaram de existir a 1 de Abril de 2015) e medidas para “dificultar as importações de leite e carne”.

Um “cadeado de tractores”

Enquanto os ministros discutiam em Bruxelas uma solução no Conselho Europeu de Agricultura, nos pontos nevrálgicos do quarteirão “europeu” da cidade os tractores saíram às ruas. Os agricultores manifestaram-se, trazendo consigo vacas e porcos, e erguendo cercas de madeira para os animais nas imediações próximas da Comissão e do Conselho.

Em Portugal, a manhã desta segunda-feira também ficou marcada por protestos em Matosinhos, em frente à Direcção-Regional de Agricultura e Pescas do Norte. Chegaram tractores da Trofa, de Barcelos, da Maia, de Vila do Conde, da Póvoa de Varzim. E dali partiram em marcha lenta até duas grandes superfícies comerciais da zona – passaram em frente a um Pingo Doce (grupo Jerónimo Martins) e terminaram a concentração junto a um Continente (Sonae, grupo que detém o PÚBLICO).

Uns foram a pé, outros de tractor. Pelo caminho, fizeram do protesto uma metáfora da crise no sector, “fechando com um cadeado humano e de tractores o trajecto entre o Pingo Doce e o Continente”, como antecipava ao PÚBLICO João Diniz, uma das quatro organizações que convocou o protesto.

Para a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), que reagiu no dia da reunião em Bruxelas e perante a vaga de protestos dos agricultores, as dificuldades “só podem ser resolvidas com a intervenção das autoridades nacionais e europeias”. A associação diz que a crise “tem origem em questões relacionadas com o funcionamento do mercado nacional e europeu” e diz-se disponível “para dialogar com os produtores e apoiar a produção”.

O sector da distribuição, defende-se a APED em comunicado, “não é o único player relevante a formação dos preços, que aliás tem em conta vários vectores, desde a relação entre a oferta e a procura, à conjuntura europeia desfavorável que se tem acentuado ao longo dos últimos anos, o fortíssimo impacto do embargo russo na produção nacional – para o qual a APED desde há muito tem vindo a chamar a atenção – e o fim das quotas leiteiras”.

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