Ministro diz que não é prioritário pôr mulheres que abortam a pagar taxas

Médicos do Conselho Regional do Sul da Ordem estão contra a cobrança de taxas e lamentam que o seu bastonário tenha ignorado o parecer que ele próprio pediu.

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O ministro Paulo Macedo "não deu nem dará por terminadas as iniciativas de chamar os sindicatos à razão" Foto: Enric Vives-Rubio

O ministro da Saúde garante que não é uma "prioridade" sua acabar com a isenção de taxas moderadoras nos casos de interrupção voluntária de gravidez (IVG) previstos na lei, apesar de respeitar a iniciativa em curso na Assembleia da República. "Esta não é a nossa prioridade, é uma iniciativa da Assembleia da República que respeitamos", enfatizou Paulo Macedo. Entretanto, o Conselho Regional do Sul da Ordem dos Médicos anunciou que está contra a introdução de taxas moderadoras nestes casos, posição contrária à já assumida pelo bastonário José Manuel Silva.

A  “prioridade” do Governo relativamente às taxas moderadoras foi “muito clara”, recordou Paulo Macedo, citado pela Lusa, sublinhando que a estratégia recente passou por isentar os jovens até aos 18 anos (antes apenas não pagavam taxas no Serviço Nacional de Saúde as crianças até aos 12 anos). O ministro aproveitou ainda para acentuar que o número de abortos ao abrigo da lei tem vindo a “diminuir” em Portugal, um decréscimo que foi de “quase 10%” no ano passado.

As declarações de Paulo Macedo surgem um dia depois de ter sido anunciado que no dia 3 de Julho o Parlamento vai discutir um projecto-de-lei  da maioria PSD/CDS-PP que prevê a equiparação da interrupção de gravidez a qualquer outro acto médico, pondo as mulheres que abortam a pedido, até às 10 semanas de gestação, a pagar taxas moderadoras. 

No mesmo dia será debatida uma iniciativa legislativa de cidadãos que vai mais longe, propondo, além do pagamento destas taxas,  que se passe a mostrar  às mulheres e a fazê-las assinar no final a ecografia efectuada antes do aborto. Querem ainda os promotores desta iniciativa (que conseguiu recolher quase 50 mil assinaturas) que se acabe com a equiparação da IVG à maternidade, o que implica o pagamento de uma licença após o aborto e ainda que não seja possível afastar os médicos e enfermeiros objectores de consciência de todo o processo. 

O bastonário da Ordem dos Médicos considerou quinta-feira que, sete anos após o referendo que aprovou a despenalização do aborto a pedido da mulher, esta é uma boa altura “para avaliar o resultado da sua aplicação e o Parlamento é o sítio para o fazer”. E defendeu que “não há razão para equiparar a IVG a uma doença ou à maternidade”, isentando as mulheres do pagamento de taxas moderadoras.

Esta sexta-feira, o Conselho Regional do Sul (CRS) da Ordem dos Médicos manifestou a sua surpresa por esta posição, lamentando que o bastonário tenha pedido a este órgão “um parecer” sobre as propostas de alteração à lei do aborto para depois o ignorar completamente.

O CRS da Ordem dos Médicos sublinha que fundamentou tecnicamente a sua posição de recusa à introdução destas novas taxas moderadoras num parecer com data de 16 de Junho, o qual, “surpreendentemente”, acabou por ser “ignorado”. Mais: o bastonário emitiu “opiniões que nunca foram discutidas ou sequer abordadas pelo Conselho Nacional Executivo da Ordem dos Médicos”. 

No parecer, que decidiram divulgar porque “se trata de matéria da maior delicadeza social, com repercussões na saúde pública e sufragada pelos portugueses em referendo", os médicos do Conselho Regional do Sul recordam que os casos de aborto estão a decrescer desde 2012 e que foi a nova lei que tornou possível  “acabar com o aborto clandestino e inseguro” em Portugal, incluindo dados sobre as complicações resultantes de abortos clandestinos, antes de 2007.

Desde que a lei entrou em vigor, "o número de atendimentos por complicações no serviço de urgências baixou significativamente, tendo-se registado apenas 241 entre 2008 e 2012, um número consideravelmente baixo quando comparados com o período entre 2002 e 2007 (1258 casos)", especificam.

A propósito da iniciativa legislativa Direito a Nascer, os autores do parecer sustentam que “a baixa natalidade não tem o seu nexo causal com a lei do aborto mas com outras causas que devem ser combatidas por forma a incentivar os nascimentos”. "A Natalidade deve ser defendida, assim como o Estado deve promover o apoio à maternidade e paternidade, contudo este apoio não é alcançado destruindo a Lei do Aborto que (...) veio resolver um grave problema de saúde publica".

O Conselho Regional do Sul sublinha também que deve ser respeitado o legítimo direito de objecção de consciência dos profissionais de saúde, designadamente dos médicos, “sem que isso impeça o devido encaminhamento para outros profissionais não objectores”.

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