Conservadores pressionam Cameron por causa do referendo à União Europeia

Primeiro-ministro britânico defendeu a sua estratégia, perante a ameaça de um motim entre as fileiras conservadoras.

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“O Reino Unido deve continuar a ser membro da União Europeia?” será a pergunta do referendo Toby Melville/REUTERS

Sob pressão da bancada conservadora, o primeiro-ministro britânico, David Cameron, foi forçado a defender no Parlamento a estratégia definida pelo seu Governo para a realização de um referendo à permanência do Reino Unido na União Europeia, cuja data poderá ser antecipada para coincidir com a das eleições locais marcadas para Maio do próximo ano, se o processo legislativo se completar a tempo.

Sem oposição a ameaçar a iniciativa – trabalhistas, liberais-democratas e até a nova bancada nacionalista escocesa concordam com o referendo –, a sessão parlamentar oferecia uma oportunidade para Cameron emendar a mão e esvaziar a polémica que cresceu com a sua alegada ameaça de expulsão dos ministros que decidissem fazer campanha pública a favor do abandono do bloco europeu. Um “equívoco”, clarificou o primeiro-ministro, que acusou a imprensa de ter interpretado mal as suas palavras – e de tentar promover um "motim" nas fileiras conservadoras.

Boris Johnson, o mayor de Londres e putativo candidato à sucessão de Cameron na liderança dos tories, defendeu a liberdade de voto dos membros do Executivo – mesmo que a posição oficial do Governo seja de apoio à manutenção do Reino Unido na UE. “Obviamente, haverá posições dos dois lados do debate, e as pessoas deviam encarar esse facto com toda a normalidade”, declarou.

Mas além da disciplina de voto, um outro ponto de fricção prolongou a insatisfação da bancada conservadora com a estratégia do Governo, que no seu projecto de lei para o estabelecimento das regras para a realização do referendo, prescindiu do tradicional período de “nojo” de 28 dias antes das eleições, durante os quais o Executivo fica proibido de intervir na campanha. Segundo a facção eurocéptica, abdicar dessa restrição abre caminho ao uso dos recursos do Governo e do dinheiro dos contribuintes para “propaganda eleitoral”.

A proposta foi pela primeira vez a discussão no plenário da Câmara dos Comuns. Os pontos principais são pacíficos: todos os legisladores aceitam a formulação da pergunta a colocar aos eleitores, para uma resposta de sim ou não: “O Reino Unido deve continuar a ser membro da União Europeia?”. E também concordam com o prazo estabelecido para a votação, que terá de ocorrer até ao fim de 2017. Os Verdes e os nacionalistas escoceses defenderam a abertura da votação aos cidadãos de 16 e 17 anos (uma ideia condenada ao fracasso), e vários deputados envolveram-se num animado debate sobre o envolvimento do Governo na campanha.

“Penso que a legislação deve assegurar o tratamento equilibrado entre os dois lados em disputa, e tal como está formulada, a proposta deixa a impressão de que o Governo está a tentar viciar os dados”, criticou o antigo procurador-geral Dominic Grieve, um dos deputados conservadores. Mais incisivo foi o seu correligionário Owen Peterson, um dos defensores da saída do Reino Unido da UE. “Não podemos correr o risco de que este momento absolutamente extraordinário na nossa História venha a ser considerado ilegítimo pelo público britânico. Que é o risco que corremos se um dos lados da campanha beneficiar de uma chuva de dinheiro do Governo e do Governo europeu para a sua propaganda”, alertou.

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Philip Hammond, a quem coube a missão de explicar ao plenário o projecto de lei, esclareceu que as restrições à campanha foram excluídas da proposta para que todos os membros do Governo – incluindo os que defendem o corte com a UE – possam participar na campanha livres de constrangimentos. E acrescentou que o Governo tem a responsabilidade de informar e esclarecer a população sobre o que está em causa.

Hammond repetiu os argumentos que sustentam o desejo dos conservadores de “alterar” o seu relacionamento com os parceiros europeus, e defendeu uma “mudança radical na forma como funciona a União Europeia”. “Consideramos que Bruxelas tem demasiado poder e acreditamos que algumas das suas competências devem regressar às capitais europeias. A UE tem de se tornar francamente menos burocrática e mais competitiva”, considerou.
 

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