Hillary Clinton já está na estrada para "merecer" o voto dos americanos

Candidata democrata à presidência vai privilegiar o contacto directo com os eleitores e os encontros informais na fase de aquecimento da campanha.

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A candidatura de Hillary Clinton foi anunciada através do Twitter REUTERS/Twitter.com/hillaryclinton/Handout via Reuters

Minutos depois de anunciar no Twitter a sua candidatura à nomeação democrata para as eleições presidenciais de 2016 nos Estados Unidos, Hillary Clinton informava que estava a caminho do estado do Iowa, onde arranca o prolongado processo das primárias. “Vou entrar no trilho da campanha para ganhar o vosso voto”, escreveu a ex-secretária de Estado, que aparece em todas as sondagens como a favorita à vitória.

Clinton partiu com uma pequena equipa de conselheiros e guarda-costas da sua casa de Chappaqua, em Nova Iorque, numa carrinha que foi baptizada pelos seus apoiantes como “Scoobie Doo”. “A viagem já começou”, escreveu a própria Hillary na sua conta de Twitter, onde nesta segunda-feira já tinha publicado uma fotografia sua com “uma família maravilhosa” que encontrou numa estação de serviço, a caminho do Iowa.

A escolha de palavras nestas primeiras mensagens era reveladora: Clinton e os seus conselheiros sabem como é fundamental “ganhar” – neste caso pode também dizer-se merecer – o voto dos eleitores do pequeno estado rural que podem projectar ou desfazer uma candidatura. É um “poder” de que os habitantes do Iowa se orgulham, e que usam com parcimónia: são por isso, uma audiência rigorosa e exigente para qualquer candidato. Estão habituados a discutir cara a cara com os diferentes concorrentes; em troca do seu apoio, costumam reclamar tratamento personalizado.

É por isso que Hillary vai apostar no tom intimista. Na agenda da campanha no Iowa, está marcado um encontro com professores e universitários na cidade de Monticello, esta terça-feira, e uma mesa redonda com pequenos empresários em Norwalk, no dia seguinte (ambos vedados à imprensa). O que quer dizer que o haverá muito tempo livre de compromissos para contactos informais – a tal relação privilegiada – com o eleitorado local. “Vamos começar o que esperamos ser um diálogo longo e produtivo com as gentes do Iowa, sobre o que temos que fazer para que os americanos comuns e suas famílias consigam melhorar as suas vidas”, antecipou a porta-voz da campanha naquele estado, Lily Adams.

Só em meados de Maio, depois de Hillary completar uma ronda semelhante pelo New Hampshire, o segundo Estado a votar nas primárias, e de estarem abertas sedes de campanha em todos os 50 estados do país, é que está prevista a realização de um grande comício de campanha de âmbito nacional – local e data ainda não foram divulgados.

É óbvio, atendendo ao cuidado com que foi montada a operação de lançamento da candidatura, que a equipa de Hillary estudou os erros da campanha de 2008, e pensou na melhor forma de corrigi-los. Um manifesto interno, que acabou por chegar a várias redacções, define o modo de actuação e enumera os valores partilhados por todos os elementos da candidatura. “Somos humildes; não esperamos facilidades nem tomamos nada como certo; não temos medo de perder mas nunca desistimos de competir e de lutar por cada voto. Quando discordamos não é nada pessoal, e quando tomamos uma decisão sabemos que é para executá-la juntos”, diz o documento.

Como escrevia o Christian Science Monitor, além da humildade e da organização, as principais diferenças relativamente à estratégia anterior dizem respeito à forma como a campanha pretende explorar politicamente o lado “feminista” da candidatura de Clinton (coisa que Hillary só fez, com enorme repercussão, no discurso em que abandonou a corrida, em 2008) e ainda à forma como terá de contrapôr a sua experiência, que agora é legislativa e executiva, à de Barack Obama – o antigo rival que se tornou um aliado.

O desafio, consideram os analistas, será acertar a “narrativa” da campanha, que terá de acentuar as diferenças políticas entre Clinton e o actual Presidente sem esconjurar as suas políticas e agenda progressista ou alienar as bases liberais. A conjuntura política é adversa: depois de dois mandatos de Obama, os ventos da mudança sopram do lado dos republicanos.

Aliás, se a caravana de Clinton conseguiu passar desapercebida esta segunda-feira foi porque as atenções da imprensa política que acompanha a campanha presidencial estavam concentradas no discurso do senador republicano da Florida Marco Rubio, na Torre da Liberdade de Miami, para anunciar o seu propósito de candidatar-se à Casa Branca.

A corrida à nomeação republicana está, por enquanto, mais emocionante e competitiva, com três candidatos já declarados (Rubio, Ted Cruz e Rand Paul) e vários candidatos a candidato sonantes: Jeb Bush, o antigo governador da Florida, filho e irmão mais novo dos dois Presidentes Bush, é uma aposta certa, mas além dele podem voltar a lançar-se Mike Huckabee e Rick Santorum, e ainda os governadores Scott Walker e Chris Christie. Na votação, prevalecerá o concorrente que os conservadores acreditarem ter melhores hipóteses de vencer um duelo com Clinton.

Por enquanto, Hillary apenas tem de se defender dos ataques da oposição. Supõe-se que a imprensa americana passe a seguir com maior “agressividade” os seus prováveis adversários pela nomeação democrata, nomeadamente o ex-senador da Virginia, Jim Webb, o ex-governador do Maryland, Martin O’Malley, o antigo senador e governador de Rhode Island, Lincoln Chafee. Nenhum deles oficializou ainda a candidatura, mas já lançaram comités de acção política para explorar essa possibilidade.

Enquanto permanecer sozinha na corrida, Hillary concentrará em si todos os ataques e também todo o escrutínio. Clinton está habituada à pressão, depois de mais de duas décadas de vida pública debaixo dos holofotes. Muitos comentadores encaram essa exposição contínua como um trunfo – e como um dilema para os seus opositores, que dificilmente conseguirão surpreender os eleitores com algum facto ou história da vida da candidata que já não tenha sido divulgado, analisado e requentado anteriormente.

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