O que está em causa na reunião do BCE

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Política expansionista do BCE ajudou os bancos pela valorização de activos. REUTERS/Alex Grimm/File

Os membros do conselho de governadores do Banco Central Europeu (BCE) encontram-se em Frankfurt numa reunião que pode ficar para a história dos 15 anos da instituição.

O que se espera que o BCE faça esta quinta-feira?
Os comentários feitos pelos analistas e o comportamento dos mercados nas últimas semanas mostram que a expectativa geral é a de que o BCE avance para um programa de compra de títulos de dívida pública dos 19 países da zona euro.

Qual o objectivo do BCE com essa medida?
Cumprindo o seu mandato, o que o banco central quer é aproximar mais a taxa de inflação da zona euro a médio prazo do objectivo estabelecido de a manter “abaixo mas próximo de 2%”. Neste momento, a taxa de inflação está muito longe dessa meta, tendo ficado em -0,2% em Dezembro, com a ajuda da descida dos preços dos combustíveis. O BCE tem receio de que a economia entre numa espiral deflacionista e por isso vai tentar fazer subir a inflação.

Como é que a compra de dívida pública faz aumentar a inflação?
Ao comprar títulos de dívida pública aos bancos com novo dinheiro criado por si, o BCE acaba por aumentar a massa monetária em circulação. Os bancos podem, com o dinheiro que recebem, comprar outros activos financeiros, como acções ou outros títulos de dívida, o que faz as bolsas subirem e as taxas de juro da dívida descerem, o que melhora a situação financeira de investidores e Estados. Num cenário ainda mais positivo, os bancos podem emprestar mais dinheiro às empresas e às famílias, para que estes invistam e consumam. Em todos estes casos, a procura pode reanimar, fazendo subir os preços.

E o euro, também ajuda?
Outra via através da qual os preços sobem é a da desvalorização do euro. Ao imprimir mais dinheiro, o BCE faz com que a sua divisa possa perder valor face às outras moedas. As consequências dessa depreciação são um aumento da competitividade das empresas exportadoras e a subida dos preços dos produtos importados, que é uma das vias mais rápidas através da qual a inflação europeia pode reanimar.

Quais os efeitos imediatos para os portugueses?
Um efeito possível é a descida das taxas Euribor. No entanto, estas já têm vindo a cair bastante nos últimos meses em antecipação desta decisão. A Euribor a um mês até já caiu em terreno negativo. Os bancos podem sentir-se mais à vontade para conceder empréstimos a taxas mais baixas, mas tal dependerá também da situação em que se encontram as suas contas e das exigências que lhes são feitas em termos de rácios pelas entidades reguladoras.

Quanto dinheiro é que o BCE deverá imprimir?
Neste momento, a expectativa nos mercados, com base em notícias publicadas por diversos jornais europeus, é a de que seja anunciado um programa situado entre os 500 mil milhões e os 750 mil milhões de euros. No entanto, tendo em conta as muito recentes mudanças de circunstâncias trazidas pela queda do euro face ao franco suíço (que ajuda o BCE nos seus objectivos), pode surgir uma surpresa. Há também a possibilidade de o banco central optar por não avançar com um montante específico para o programa, anunciando apenas que continuará a realizar compras enquanto a meta para a inflação não estiver assegurada.

Que títulos de dívida é que irão ser comprados?
O cenário considerado mais provável é que o BCE venha a realizar compras de dívida de todos os países da zona euro excepto a Grécia, usando a quota de cada país no eurosistema para definir as quantidades. Assim, o país que será mais beneficiado em termos brutos é a Alemanha. A Grécia pode ficar de fora pelo facto de todas as agências de rating consideradas pelo BCE lhe atribuírem classificação “lixo”. No caso de Portugal, uma agência – a canadiana DBRS – atribui um rating acima de “lixo”. Foi noticiado que chegou a ser colocada a hipótese dentro do BCE de se fazerem compras de títulos com rating AAA, o que deixaria de fora todos os países da Europa periférica.

O BCE corre riscos ao comprar dívida?
Ao comprar títulos de dívida pública, o banco central fica sujeito a perdas na eventualidade de um dos países da zona euro entrar em incumprimento. O BCE tem defendido que esse é um cenário altamente improvável e que, a acontecer, teria sempre direito a ser reembolsado primeiro. Ainda assim, há sinais de que esta seja uma dúvida que existe entre os membros do BCE. Só assim se explica que, de acordo com vários meios de comunicação social, possam vir a ser os bancos centrais nacionais de cada país a efectuar a maior parte das compras dos títulos dos respectivos países. Esta opção, que terá sido uma exigência dos representantes alemães para proteger o Bundesbank do risco de default de países como Portugal, retira, de acordo com diversos economistas, eficácia à medida do BCE.

O que aconteceria se Portugal entrasse em default?
Confirmando-se que será o Banco de Portugal a comprar a maior parte dos títulos portugueses, um cenário em que o Estado decidisse reestruturar a dívida ou não conseguisse fazer face aos seus compromissos, conduziria à possibilidade de o Banco de Portugal registar perdas significativas. A solução seria ou utilizar activos como o ouro para recolocar os capitais em posição positiva ou o Estado em crise recapitalizar o banco central.

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