Mais de cem passarinhos apreendidos no Algarve

Numa das três apreensões, 38 pássaros encontravam-se mortos e alguns depenados, possivelmente para fins gastronómicos. A SPEA lançou uma campanha este ano para sensibilizar para a captura ilegal de aves de pequeno porte.

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Pintassilgos capturados ilegalmente devolvidos à natureza. RIAS/ALDEIA
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Chapim-rabilongo, uma das espécies capturadas ilegalmente. RIAS/ALDEIA

Num período de duas semanas foram realizadas três apreensões resultantes da captura de aves ilegais no Algarve, tendo sido recuperada de situações de ilegalidade mais de uma centena de passarinhos. Julieta Costa, assistente do departamento de conservação terrestre da SPEA (Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves), afirma que “os pássaros são capturados por duas razões: para servirem de petisco ou para comércio ilegal de aves em cativeiro”. A associação aproveita estas apreensões para relembrar que estas situações de captura e cativeiro são ilegais.

Julieta Costa explica que, depois das apreensões, “os pássaros são entregues a um centro de recuperação e, se estiverem em boas condições físicas e de saúde, são libertados para a natureza; caso se encontrem doentes, com lesões, ou mal alimentados, são mantidos em recuperação e depois libertam-nos”.  

As apreensões, feitas no final de Novembro, estiveram a cargo do Serviço de Protecção da Natureza e Ambiente (SEPNA) da GNR e os animais foram encaminhados para o RIAS – Centro de Recuperação e Investigação de Animais Selvagens, gerido pela associação Aldeia – para que pudessem ser devolvidos à natureza.

A acção desenvolvida pelo SEPNA de Portimão resultou na libertação de 84 passarinhos, de 24 espécies diferentes, que se encontravam em situação de cativeiro ilegal. Noutra, feita pelo SEPNA de Tavira encontraram oito pintassilgos e, numa terceira intervenção, o SEPNA de Faro detectou 38 passarinhos de quatro espécies: piscos-de-peito-ruivo, toutinegras-de-cabeça-preta, ferreirinha-comum e toutinegras-de-barrete-preto. Presume-se que estes últimos fossem utilizados para utilização gastronómica já que alguns se encontravam depenados e eram visíveis os danos causados pelas armadilhas.

No total, foram apreendidos 130 passeriformes, sendo que, com óbvia excepção dos 38 que estavam mortos, os restantes foram devolvidos à natureza. Os passeriformes são uma ordem da classe das aves que caracteriza as aves de porte pequeno ou médio.

Julieta Costa explica ao PÚBLICO que as apreensões resultam de acções espontâneas da GNR (como acções de fiscalização em feiras) mas, na sua grande maioria, são feitas depois de alertas às autoridades, pelo que considera que “os cidadãos têm um papel muito importante na denúncia destes casos”.

Captura e cativeiro ilegais
Em Portugal, a legislação proíbe o abate e a captura de todas as espécies de aves selvagens, de qualquer espécie autóctone. É aberta uma excepção para as espécies cinegéticas, que podem ser abatidas durante o período de caça mas cuja venda é proibida. A venda de aves, feita em feiras ou mesmo na Internet, é ilegal, a não ser que se trate de um criador autorizado pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

A utilização destas espécies na gastronomia poderá não incorrer em nenhuma ilegalidade desde que sejam tordos ou codornizes caçados durante o período legal ou caso se tratem de pássaros congelados, importados da China, por exemplo.

Já a utilização de quaisquer métodos de captura (armadilhas ou redes) é ilegal, excepto para pesquisa científica ou anilhadores credenciados. No entanto, a venda destes dispositivos é legal. “Geralmente são usadas ilegalmente pequenas armadilhas de arame, colocadas no chão ou em arbustos com um isco, que atrai o pássaro”, explica Julieta Costa, acrescentando que também são utilizadas redes, loisas, gaiolas ou esparrelas. Existem ainda outros métodos como a utilização de milho moído misturado com veneno para rato que mata indiscriminadamente todas as aves granívoras.

A SPEA lançou uma campanha intitulada "Diga não aos passarinhos na gaiola e no prato" que tem como objectivo sensibilizar para a captura e venda de aves ilegais. “Temos feito um trabalho conjunto com a GNR e com outros parceiros mas ainda há muito para fazer”, refere Joana Domingues, responsável de comunicação do SPEA. “Estamos à procura de financiamento para agir localmente, no terreno, principalmente nas zonas mais complicadas”, afirma, considerando que os resultados têm sido bons e que “houve mais apreensões este ano do que em anos anteriores”.

As três zonas do país em que há mais casos de captura e de venda são Lisboa, Porto e Algarve. Em Lisboa e no Porto nota-se mais a vertente comercial, enquanto no Algarve se nota um maior número de captura sazonal, nas épocas de migração. As espécies mais procuradas para fins gastronómicos são o pisco-preto-ruivo e a toutinegra-de-barrete e para a captura em cativeiro são os pintassilgos, assim como outras aves canoras como os verdilhões ou os chapins.

A SPEA foi criada em 1993 e dedica-se ao estudo e conservação das aves em Portugal. Em 2014, a instituição realizou um estudo em que se previa que, anualmente, eram capturadas entre 30 mil a 130 mil aves. A assistente da instituição reconhece que há uma grande margem de variação mas explica que se trata de uma estimativa e que são casos difíceis de detectar.

A captura de aves resulta numa perda da biodiversidade nacional e também pode levar ao aumento de pragas de insectos, já que os pássaros mais capturados são controladores naturais de pragas. A associação apela à participação dos cidadãos que detectem situações ilegais através da Linha SOS Ambiente e Território (808 200 520) ou junto do SPNA (GNR) mais próximo.

Texto editado por Ana Fernandes

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